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O documento discute o abate humanitário, processo técnico e científico que garante o bem-estar de animais desde a propriedade rural até a operação de sangria no matadouro-frigorífico. O abate deve ser realizado sem sofrimentos desnecessários, evitando instalações e equipamentos inadequados, distrações, falta de treinamento de pessoal, falta de manutenção de equipamentos e manejo inadequado. O transporte rodoviário é o meio mais comum de condução de animais de corte para o abate, porém pode causar estresse e contusões. O documento também aborda a inspeção ante-mortem, insensibilização, métodos de abate e regulamentos legais.
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Tipologia: Notas de aula
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Rev. educo comino CRMY·SP I Continuous Education Journa/ CRMY-SP, São Pau/o, volume 4, fascfcu/o 2, p. 73 - 85. 2001.
Professor Adjunto da Disciplina de Tecnologia dos Produtos de Origem Animal UNESPlBotucatulSP.
ISSN 1516-
Abate humanitário pode ser definido como o conjunto de procedimentos técnicos e científicos que garantem o bem-estar dos animais desde o embarque na propriedade rural até a operação de sangria no matadouro-frigorífico. O abate de animais deve ser realizado sem sofrimentos desnecessários. As condições humanitárias devem prevalecer em todos os momentos precedentes ao abate. A insensibi- lização de animais é considerada a operação mais crítica durante o abate de bovinos. Tem por obje- tivo colocar o animal em estado de inconsciência, que perdure até o fim da sangria, não causando sofrimento desnecessário e promovendo uma sangria tão completa quanto possível. Neste artigo são abordados os temas referentes às operações ante-mortem, como transporte, manejo nos currais e operações de insensibilização e sangria e seus efeitos no bem-estar animal e na qualidade da carne.
Palavras-cbave: abate de bovinos, bem-estar animal, manejo ante-mortem, transporte, insensibiliza- ção, sangria.
á algumas décadas, o abate de animais era consi- derado uma operação tecnológica de baixo nível científico e não se constituía em um tema pesqui- _ sado seriamente por universidades, institutos de pesquisa e indústrias. A tecnologia do abate de animais destinado ao consumo somente assumiu importância ci- entífica quando se observou que os eventos que se suce- dem desde a propriedade rural até o abate do animal ti- nham grande influência na qualidade da carne (SWA- TLAND, 2000). Nos países desenvolvidos há uma demanda cres- cente por processos denominados abates humanitários com o objetivo de reduzir sofrimentos inúteis ao animal a ser abatido (pICCm e AJZENTAL, 1993; CORTESI, 1994). Abate humanitário pode ser definido como o conjunto de procedimentos técnicos e científicos que garantem o bem- estar dos animais desde o embarque na propriedade rural até a operação de sangria no matadouro-frigorífico. O essencial é que o abate de animais seja realiza- do sem sofrimentos desnecessários e que a sangria seja
eficiente. As condições humanitárias não devem preva- lecer somente no ato de abater e, sim, nos momentos precedentes ao abate (GRACEY e COLLINS, 1992). Há vários critérios que definem um bom método de abate (SWATLAND, 2000): a) os animais não devem ser tratados com crueldade; b) os animais "não podem ser estressados desnecessari- amente; c) a sangria deve ser a mais rápida e completa possível; d) as contusões na carcaça devem ser mínimas; e) o método de abate deve ser higiênico, econômico e seguro para os operadores. Os métodos convencionais de abate de bovinos envolvem a operação de insensibilização antes da san- gria, com exceção dos abates realizados conforme os ri- tuaisjudaicos ou islâmicos (CORTESI, 1994). É dever moral do homem, o respeito a todos os animais e evitar os sofrimentos inúteis àqueles destina- dos ao abate. Cada país deve estabelecer regulamentos em frigoríficos, com o objetivo de garantir condições para a proteção humanitária a diferentes espécies (CORTE- SI, 1994; LAVRENT, 1997).
ROÇA. R. O. Abate humanitário de bovinos! Humane slaughter of canle.! Rev. educo contin. CRMV-SP! Continuous Education Journal CRMV-SP, São Paulo. volume
o manejo do gado no frigorífico é extremamente importante para a segurança dos operadores, a qualidade da carne e o bem-estar animal. As instalações dos mata- douros-frigoríficos bem delineadas também minimizam os efeitos do estresse e melhoram as condições do abate (G~UN, 1996, 2000a, 2000b,2000d,2000e, 2000fj. As etapas de transporte, descarga, descanso, mo- vimentação, insensibilização e sangria dos animais são importantes para o processo de abate dos animais, de- vendo-se evitar todo o sofrimento desnecessário. Assim, o treinamento, a capacitação e a sensibilidade dos maga- refes são fundamentais (CORTESI, 1994). Os problemas de bem-estar animal estão sempre relacionados com instalações e equipamentos inadequa- dos, "distrações" que impedem o movimento do animal, falta de treinamento de pessoal, falta de manutenção dos equipamentos e manejo inadequado (GRANDUN, 1996).
O transporte rodoviário é o meio mais comum de condução de animais de corte para o abate (TARRANT et aI., 1988). No Brasil, o transporte também é realizado principalmente por via rodoviária, nos chamados "cami- nhões boiadeiros", tipo truque, com carroçaria medindo 10,60 x 2,40 metros, com três divisões: anterior com 2, x 2,40 metros, intermediária com 5,30 x 2,40 metros e posterior com 2,65 x 2,40 metros. A capacidade de carga média é de 5 animais na parte anterior e posterior e de 10 animais na parte intermediária, totalizando 20 bovinos. O transporte rodoviário, em condições desfavorá- veis, pode provocar a morte dos animais ou conduzir a contusões, perda de peso e estresse dos animais (KNO- WLES, 1999). A mortalidade de bovinos durante o transporte é extremamente baixa. Novilhos são mais susceptíveis que animais adultos (KNOWLES, 1995). Na África do Sul foi relatado 0,0 I% de mortalidade de bovinos em 1980, e 0%, de um total de 22 mil animais transportados em 1990. Não há registro de mortalidade no transporte de bovinos no Reino Unido. Publicações mais antigas relatam que o transporte ferroviário é mais problemático que o trans- porte rodoviário (KNOWLES, 1999). Os animais gordos são mais susceptíveis que os animais magros. As altas temperaturas, as maiores dis- tâncias de transporte e a diminuição do espaço ocupado por animal também contribuem para que ocorram pro- blemas de transporte (THORNTON, 1969). A privação de alimento e água conduz à perda de peso do animal. A razão da perda de peso relatada na literatura científica é extremamente variável, de 0,75% a
II % do peso vi vo nas primeiras 24 horas de pri vação de água e alimento (WARRlSS, 1990; KNOWLES, 1999). A perda de peso dos animais tem razão direta com o tempo de transporte, variando de 4,6% para 5 horas a 7% para 15 horas, recuperada somente após 5 dias (WAR- RlSS et aI., 1995). A perda de peso é motivada inicial- mente pela perda do conteúdo gastrointestinal, e o aces- so à água durante a privação de alimento reduz as per- das. A perda de peso da carcaça também é variável, de valores inferiores a I% a valores de 8% após 48 horas de privação de alimento e água (WARRlSS, 1990). O peso do fígado tende a diminuir rapidamente da mesma forma que o volume do rúmen, cujo conteúdo toma-se mais fluido (WARRlSS, 1990). Algumas propostas são recomendadas para a re- dução da perda de peso do animal e da carcaça que ocor- re durante o transporte, como a utilização de soluções eletrolíticas via oral (SCHAEFER et ai., 1997); no en- tanto, a administração de soluções injetáveis de vitami- nas A, D e E não apresentam efeito na redução da perda de peso (JUBB et ai., 1993b). O principal aspecto a ser considerado durante o transporte de bovinos, é o espaço ocupado por animal, ou seja, a densidade de carga, que pode ser classificada em alta (600Kg/m2), média (400Kg/m2) e baixa (200Kgim 2 ) (TARRANT et ai., 1988). A Farm Animal Welfare Con- cil - FAWC (KNOWLES, 1999) dá uma fórmula para cálculo da área mínima a ser ocupada por animal, basea-
metros quadrados e P o peso vivo do animal em quilos, recomendando a média de 360kg/m 2. Randall, citado por
P= 0,78, e a "The Animal Welfare Advisory Commit- tee", da Nova Zelândia, adota a equação de Randall como o mínimo espaço e a equação da FAWC como o máximo espaço (KNOWLES, 1999). Teoricamente, do ponto de vista econômico, pro- cura-se transportar os animais empregando alta densi- dade de carga, no entanto esse procedimento tem sido responsável pelo aumento das contusões e do estresse dos animais, sendo inadmissível densidade superior a 550Kg/m 2 (TARRANT et ai., 1988, 1992). No Brasil, a densidade de carga utilizada é em média de 390 a 410Kg/m 2. O aumento do estresse durante o transporte é pro- porcionado pelas condições desfavoráveis como priva- ção de alimento e água, alta umidade, alta velocidade do ar e densidade de carga. (SCHARAMA et ai., 1996). As respostas fisiológicas ao estresse, são traduzidas por hipertermia e aumento da freqüência respiratória e car- díaca. Com o estímulo da hipófise e adrenal, estão asso-
ROÇA, R. O. Abate humanitário de bovinos! Humane slaughter or caule.! Rev. educo contin. CRMV·SP! Continuous Education Journal CRMV-SP, São Paulo, volume 4, fascfeulo 2, p. 73 • 85, 200 1.
mentos e métodos impróprios que proporcionam excita- ção, estresse e contusões; b) transtornos que impedem o movimento natural do animal, como reflexo da água no piso, brilho de metais e ruídos de alta freqüência; c) falta de treinamento de pessoal; d) falta de manutenção de equipamentos, como conservação de pisos e corredores; e) condições precárias pelas quais os animais chegam no estabelecimento, principalmente devido ao transporte. O bem-estar também é afetado pela espécie, raça, linha- gem genética (GRANDIN, 1996) e pelo manejo inade- quado como reagrupamento ou mistura de lotes de ani- mais de origem diferente, promovendo brigas entre eles (ABATE, 1997; KNOWLES, 1999). A retenção dos animais, o manejo adotado e as inovações que o animal recebe são causas de estresse psicológico, enquanto que os extremos de temperatura, fome, sede, fadiga e injúrias, são as principais causas do estresse físico (GRANDIN, 1997). Os estudos para a determinação do nível de es- tresse em que o animal é submetido durante as opera- ções ante-mortem apresentam resultados variáveis e de difícil interpretação para definição do bem-estar animal (G RANDIN, 1997, 1998, 2000g). As avaliações do es- tresse provocado no período ante-mortem devem ser re- alizadas na rampa de acesso ao boxe de insensibilização, ou no espaço reservado para o banho de aspersão.
Banho de aspersão
No Brasil, os animais após o descanso regulamen- tar seguem comumente por uma rampa de acesso ao boxe de atordoamento dotado de comportas tipo guilhotina. Nessa rampa é realizado o banho de aspersão. O local deve dispor, segundo o Ministério da Agricultura (BRA- SIL, 1968, 1971), de um sistema tubular de chuveiros dis- postos transversal, longitudinal e lateralmente, orientan- do os jatos para o centro da rampa. A água deve ter a pressão não inferior a 3 atmosferas (3,03 Kgf/cm2) e recomenda-se hipercloração a 15ppm de cloro disponi- vel. A Argentina adota método análogo (pIBOUL, 1973). No Brasil, o afunilamento final da rampa de aces- so é denominado "seringa", onde também há canos per- furados ou borrifadores, conforme artigo 146 do RIIS- POA (BRASIL, 1968). A seringa simples ou dupla, até o boxe de atordoamento, deve ter, transversalmente, a for- ma "V", com a finalidade de permitir a passagem de ape- nas um animal por vez. O banho de aspersão foi adotado em substituição ao banho de imersão, o qual, levando em conta a grande quantidade de sujeira que se depositava no tanque e a impossibilidade material de troca freqüente da água, cons-
tituía-se em fator de disseminação e extensão de conta- minações (MUCCIOLO, 1985). O objetivo do banho do animal antes do abate é limpar a pele para assegurar uma esfola higiênica, redu- zir a poeira, tendo em vista que a pele fica úmida e, por- tanto, diminuiria a sujeira na sala de abate (STEINER, 1983). O banho de aspersão antes do abate não afeta a eficiência da sangria nem o teor de hemoglobina retido nos músculos (ROÇA e SERRANO, 1995). Para STEINER (1983), a limpeza de bovinos, particularmente suas extremidades, cascos e região anal, deve ser realizada nos currais, nas rampas ou nas seringas, utilizando mangueiras ou aspersão de água sob pressão. É recomendável que os animais perma- neçam um pequeno espaço de tempo na rampa de aces- so para secar a pele, tendo em vista que é impossível realizar uma esfola higiênica se o couro estiver úmido. O autor recomenda que dos bovinos que ainda apre- sentarem sujeiras aderidas, nessa fase do abate, so- mente as^ patas e os cascos devem ser aspergidos após o atordoamento. Na rampa de acesso ao boxe de atordoamento, devem ser realizadas as^ avaliações do estresse provoca- do no período ante-mortem. GRANDIN (2000g) propõe avaliação dos deslizamentos e das quedas dos animais bem como das vocalizações ou mugidos dos animais na rampa de acesso ao boxe de insensibilização. A avalia- ção dos deslizamentos e das quedas (quando o animal toca com o corpo no^ piso) deve ser realizada,^ no^ mínimo, em 50 animais com a seguinte pontuação:
~ excelente: sem deslizamento ou quedas; ~ aceitável: deslizamentos em menos de 3% dos animais; ~ não aceitável: I% de quedas;
Com um manejo tranqüilo que proporcione bem- estar dos animais toma-se quase impossível que eles es- correguem ou sofram quedas. Todas as áreas por onde os animais caminham devem, obrigatoriamente, possuir pisos não derrapantes (GRANDIN, 2000g). As vocalizações ou mugidos são indicativos de dor nos bovinos. O número de vezes que o bovino vocaliza durante o manejo estressante tem relação com o nivel de cortisol plasmático. A utilização do bastão elétrico para conduzir os animais é um dos motivos do alto índice de mugidos. A avaliação deve ser realizada, no mínimo, em 100 animais, também na rampa de acesso ao boxe de
ROÇA. R. O. Abate humanitário de bovinos / Humane slaughter of catlle./ Rev. educo contin. CRMV·SP / ContiDuous Education Journal CRMV-SP. São Paulo. volume
insensibilização. O critério para avaliação, segundo GRANDIN (2000g) é:
~ excelente: até 0,5% dos bovinos vocalizam; ~ aceitável: 3% dos bovinos vocalizam; ~ inaceitável: 4 a 10% vocalizam; ~ problema sério: mais de 10% vocalizam.
A necessidade da utilização do bastão elétrico para conduzir os animais também constitui um sinal de que o manejo está inadequado. O bastão elétrico não deve ser utilizado nas partes sensitivas dos animais como olhos, orelhas e mucosas. Os bastões não devem ter mais que 50 volts. Ao reduzir o uso do bastão elétrico, melhorará o bem-estar animal. Os critérios para avaliar a utilização do bastão elétrico em bovinos, segundo GRANDIN (2000g) são (em % de bovinos conduzidos com a utiliza- ção do bastão):
< 5%
50%
< 25%
ser realizado mediante a degola cruenta (método "ka- sher" ou "kosher") sem atordoamento prévio. A marreta de insensibilização é largamente utiliza- da no Brasil, principalmente em estabelecimentos clan- destinos. Há escassez de publicações sobre trabalhos ex- perimentais com o uso da marreta em bovinos (LEACH, 1985). A utilização de marreta como método de abate promove grave lesão do tecido ósseo, com afundamento da região atingida. No encéfalo produz um processo de contusão cranioencefálica e não concussão, como rela- tado por vários pesquisadores. Apresentam também uma grande incidência de hemorragias macroscópicas e mi- croscópicas na ponte e bulbo, podendo ser considerada lesão indireta, ou seja, uma hemorragia no ponto opositor do golpe no cérebro, promovida pelo contragolpe da por- ção basilar do osso occipital (ROÇA, 1999). O martelo pneumático não penetrante leva a uma lesão encefálica ou injúria cerebral difusa provocada pela pancada súbita e pelas alterações da pressão intracraru- ana, resultando na deformação rotacional do cérebro, promovendo incoordenação motora, porém mantém atividade cardíaca e respiratória (LEACH, 1985; BAGER el al., 1990). O martelo pneumático, segundo LAMBOOY et al. (1981), não deve ser aceito como mé- todo de insensibilização em razão de sua bai- xa eficiência, que pode ser avaliada pela fre- qüência cardíaca, pela pressão sangüínea, pela respiração, pela presença de reflexos, pela eletroencefalografia e pela eletrocorti- cografia (FRlCKER e RIEK, 1981; LAMBOOY el^ al., 1981; LEACH, 1985; BAGER elal., 1990,1992). A efi- ciência do atordoamento com martelo pneumático só foi observada por LAMBOOY el alo (1981) em 50% dos aillmais abatidos, ou seja, quando o atordoamento provo- cava uma hemorragia cerebral difusa. As publicações sobre a utilização de armas de fogo ou pistolas pneumáticas também são escassas. A utilização de armas de fogo deve ser considerada uma operação de alto risco em matadouros-frigoríficos (LE- ACH,1985). As pistolas pneumáticas de penetração fabrica- das no Brasil possuem terminal em bastão de 1 lmm de diâmetro com extremidade convexa e força de impacto de 8 a 12 Kg/cm 2. Não possuem injeção direta de ar com o objetivo de laceração do tecido cerebral. A saída de ar no terminal do bastão tem como objetivo apenas auxiliar o retorno do dardo. O uso da pistola pneumática produz uma grave laceração encefálica, promovendo in- consciência rápida do animal e pode ser considerado um método eficiente de abate de bovinos (ROÇA, 1999).
< 5% <20%
0" < 5%
Aceitável
Excelente
problema sério
O atordoamento ou a insensibilização pode ser considerado a primeira operação do abate propriamen- te dito. Determinado pelo processo adequado, o atordo- amento consiste em colocar o animal em um estado de inconsciência, que perdure até o fim da sangria, não causando sofrimento desnecessário e promovendo uma sangria tão completa quanto possível (GIL e DURÃO, 1985). Os instrumentos ou métodos de insensibilização que podem ser utilizados são: marreta, martelo pneu- mático não penetrante (cash knocker), ármas de fogo (firearm-gunshot), pistola pneumática de penetração ("pneumatic-powered stunners"), pistola pneumática de penetração com injeção de ar ("pneumatic-powered air injections stunners"), pistola de dardo cativo acionada por cartucho de explosão ("cartridge-fired captive bolt stunners"), corte da medula ou choupeamento, eletro- narcose e processos químicos. O abate também pode
ROÇA, R. O. Abale humanitário de bovinos / Humane slaughter or caule./ Rev. educo contin. CRMV-SP / Continuous Education Journal CRMV-SP. São Paulo, volume 4, rascfculo 2. p. 73 - 85. 200 I.
do O Regulamento, sendo publicado em janeiro de 2000 (BRASIL, 2(00).
A religião judaica é a mais exigente quanto às nor- mas de alimentação, que envolve seleção da matéria pri- ma, abate de animais, preparo e consumo de alimentos, uso de determinados utensílios e também regras de ali- mentação em certos dias como "sabbath" ou dias de fes- tas (LÜCK, 1994, 1995). Em contraste com a exigência religiosa, estes métodos têm sido criticados, tanto pela crueldade (REVISTA NACIONAL DA CARNE, 1995), como também pela falta de cuidados quanto aos aspectos higiênico-sanitários (LÜCK, 1994). O abate "kasher" ou "schechita" envolve a con- tenção do animal, estiramento da cabeça por um gan- cho e uma incisão, sem movimentos bruscos, entre a cartilagem cricóide e a laringe (PICCHI e AJZEN- TAL, 1993), cortando a pele, músculos, traquéia, esô- fago, veias jugulares e artérias carótidas (REGENS- TEIN e REGENSTEIN, 1988) e às vezes chegando próximo às vértebras cervicais (SANZ EGANA, 1967). Essa operação tem como objetivo, segundo RE- GENSTEIN e REGENSTEIN (1988), permitir a má- xima remoção de sangue. O termo "kosher" ou "kasher" é utilizado para de- fmir os alimentos preparados de acordo com as leis judai- cas de alimentação (REGENSTEIN e REGENSTEIN, 1979, 1988; BARKMEIER, 1998; CHANIN e HOF- MAN, 1998; KOF-K KOSHER SUPERVISION, 1998). As leis da aljmentação judaica, denominada de "kashrut", são seguidas pelos membros da religião judaica (RE- GENSTEINeREGENSTEIN, 1979, 1991; LÜCK, 1994, 1995), que atinge mais de seis milhões de pessoas nos Estados Urudos da América. Somente no Estado de Nova Iorque, EUA, com mais de dois milhões de judeus, o Departamento de Agricultura possui uma seção especial ("New York Agricultural and Market Law", parágrafo 20 l-a) responsável pela segurança e legitimidade dos ali- mentos comercializados como "kasher" ou "kosher". Os alimentos "kasher" representam nos Estados Unidos um mercado de US$ 35 bilhões/ano, incluindo mais de 38 mil alimentos certificados como "kasher", produzidos por 9600 empresas do ramo de alimentos (STERN, 1990; SOJKA, 1995; KOSHER, 1997; AMERICAN MEAT INSTITUTE, 2000). Os alimentos "kasher" não são somente adqui- ridos por judeus, mas também por muçulmanos, ad- ventistas, vegetarianos, pessoas com alergias a certos alimentos e ingredientes e outros consumidores que
simplesmente consideram subjetivamente o alimento "kasher" como de alta qualidade. São alimentos "ka- sher" a carne, o frango, o peixe com escamas, os lati- cínios, as frutas, os legumes e os produtos de confei- taria. Não são considerados "kasher" a carne suína, as misturas de carne e laticíruos, o camarão, a lagosta e os frutos do mar (KHOLMEINI, 1979; LÜCK, 1994, 1995; IBEN, 1995; KOSHER, 1997; BARKMEIER, 1998). Problemas com Trichinella spiralis e Taenia solium provavelmente tenham sido responsáveis pela proibição judaica do consumo da carne suína (THORN- TON, 1969), porém REGENSTEIN e REGENSTEIN (1979) afirmam que as leis que regem o ritual "ka- sher" não são "leis de saúde". As restrições alimenta- res, como a designação de aillmais puros e impuros; a proibição do consumo de misturas com carne e leite e consumo de sangue, são citadas na Bíblia (LEVÍTI- CO, 11: 1-19; ÊXODO, 22: 31,23: 19; DEUTERO- NÔMIO, 12: 21-25; 14: 1-21). "Schechita" é o ritual de abate dos animais para o preparo da carne "kasher". Ele é realizado por um magarefe denomjnado "schochet" que recebe treina- mento por um longo período. A proposta do ritual é o corte das artérias carótidas e veias jugulares rapida- mente, proporcionando rápida inconsciência e insensi- bilidade. O instrumento cortante utilizado para essa operação é chamado de "chalaf", o qual é afiado de forma eficiente e examinado após cada utilização. Cada seção de "schechita" é precedida por uma pre- ce especial denominada "beracha". Quando são utili- zados animais não domésticos, o sangue deve ser co- berto por areia ou terra. A inspeção dos animais é rea- lizada pelo "shochet", para verificação de moléstias, injúrias e, principalmente, a presença de aderências ou malformações, que condenarão o animal para o consumo (HOROVITZ, 1998; SmSLER, 2000). Os pulmões são inflados para verificação de aderências. No Brasil, os animais também são inspecionados pelo Serviço de Inspeção Federal. Para a realização da degola, o animal é encami- nhado ao boxe que é utilizado para atordoamento do abate não destinado à produção de carne "kasher", expõe uma das patas traseiras em um espaço de aber- tura, a qual é presa por uma corrente com roldana, o boxe é aberto, permitindo a saída do animal enquanto a corrente é suspensa por um guincho. O animal é baixado até seu dorso tocar o solo, mantendo seu pos- terior suspenso. Um gancho, na forma de "V" é colo- cado sobre a mandíbula e o pescoço é tensionado. O "shochet" apóia uma das mãos sobre o pescoço do animal, e por um movimento realizado com a "chalaf',
ROÇA. R. O. Abate humanitário de bovinos! Humanc slaughter or caule.! Rev. educo contin. CRMV·SP! Continuous Education Journal CRMV-SP, São Paulo. volume
4. fascículo 2. p. 73 - 85. 2001.
Figura 1. Esquema do boxe de contenção ASPCA.
Figura 2. Modelo do boxe de contenção ASPCA.
corta, entre o primeiro e o segundo anel da traquéia, a pele, as veias jugulares, as artérias carótidas, o esôfa- go e a traquéia, não podendo encostar o fio da faca nas vértebras cervicais. A incisão deve ser executada sem interrupção, sem movimentos bruscos, sem per- furação, sem dilacerações e nem sobre a laringe. Após a incisão, o animal é suspenso ao trilho, seguindo para o término da sangria e esfola (PICCHI e AJZENTAL, 1993; PICCHI, 1996). O grande problema do ritual judaico de abate de bovinos no Brasil é o sistema de contenção dos animais, que é ineficiente e não considera que o gado abatido é principalmente o zebuíno, mais agitado que o taurino. A contenção e a degola cruenta provocam sérios efeitos estressantes nos animais abatidos pelo método "kasher". Nos momentos após a degola e sus- pensão, os animais abatidos por este ritual apresen- tam flexão dos membros anteriores e contração dos músculos da face, sinais evidentes de dor (ROÇA, 1999). Analisando-se as alterações cranioencefálicas, o abate "kasher" não provoca lesão de tegumento e no crâ- nio; nas meninges, ocorrem algumas hemorragias na arac- nóide e pia-máter. No encéfalo podem ser encontradas congestão e algumas lesões microscópicas de hemorra- gia. A injúria cerebral provocada por esse método de abate é extremamente pequena e inferiores aos abates com a utilização da marreta ou pistola pneumática (ROÇA, 1999). Tanto por razões humanitárias como de seguran- ça, os frigoríficos que executam abate judaico devem ins- talar equipamentos modernos de contenção vertical. A prática de suspender os bovinos ou ovinos vivos deve ser eliminada. Vários esquemas e aparelhos de contenção são preconizados pela "Arnerican Society for the Pre- vention of Cruelty to Animais" (ASPCA) (GRANDIN, 2oo0b). A Figura I mostra o esquema de contenção de bovinos, e a Figura 2, o modelo ASPCA de boxe de con- tenção. O aparelho consiste em um boxe estreito com abertura na frente para a cabeça do animal. Após a entrada do animal no boxe, um portão empurra-o para frente e um levantador abdominal é encostado debai- xo do peito. A cabeça é contida por um levantador facial de maneira que o rabino possa executar a dego- la. O movimento do levantador abdominal deve ser restrito a 70 centímetros, de forma que não levante o animal do piso. O portão que^ empurra o traseiro deve estar equipado com um regulador de pressão separa- do, que permita ao operador regular a pressão exerci- da sobre o animal. O operador deve evitar o movimen-
RoçA, R. Q. Abale humanilário de bovinos I Humane slaughter of caule. I Rev. educo contin. CRM-V-SP I Continuous Educatioo Jouroal CRMV-SP. São Paulo, volume 4, fascículo 2, p. 73 - 85. 2001.
dos para avaliação da eficiência da sangria. O emprego em ovinos da eletronarcose em contraste com degola cruenta, avaliada por CHRYSTALL et ai. (1981) e ele- tronarcose com pistola de dardo cativo ou choupa, estu- dada por WARRlSS e LEACH (1978), não apresenta- ram variações nos valores de hemoglobina residual na carne, porém PAULICK et ai. (1989) encontraram uma menor quantidade de sangue colhido durante a sangria de ovinos submetidos à eletronarcose, quando compara- dos com animais submetidos ao atordoamento por pistola de dardo cativo. Para bovinos, o método de abate afeta sensi- velmente o processo de sangria, sendo a eficiência maior no abate "kasher" e menor no abate realizado mediante a insensibilização por pistola pneumática, seguida imediatamente pela estimulação elétrica (ROÇA, 1999). O atordoamento do animal, por qualquer método, produz uma elevação da pressão sangüínea no sistema arterial, venoso e capilares, e dá um aumento transitório nos batimentos cardíacos (THORNTON, 1969), fatores que favorecem a sangria. O volume de sangue colhido também é maior se a sangria é realizada imediatamente após a insensibilização. A esse respeito, VIMINI et alo (1983, 1983a) estabeleceram que o volume de sangue colhido é inversamente proporcional ao intervalo entre o atordoamento e a sangria. A importância da sangria imediata é evidente quan- do se verifica que a velocidade de um fluxo de um vaso cortado é 5 a 10 vezes mais rápida do que no vaso ínte- gro e somente depois de perder-se muito sangue é que a
pressão sangüínea começa a cair (THORNTON, 1969). Na Argentina, o intervalo máximo permitido é de dois minutos para bovinos (ARGENTINA, 1971) e, na Holanda, 30 segundos após eletronarcose em ovinos (LE- ACH, 1985). No Brasil, o Serviço de Inspeção Federal recomenda um intervalo máximo de I minuto (BRASil.., 2000). Um problema relacionado com a sangria é o apa- recimento de hemorragias musculares caracterizadas por petéquias, listras ou equimoses em várias partes da mus- culatura, provocadas por aumento da pressão sangüínea e ruptura capilar (THORNTON, 1969; LEACH, 1985). Vários fatores são responsáveis por essas alterações como o aumento do intervalo entre o atordoamento e a sangria (THORNTON, 1969), o estado de tensão dos animais no momento do abate (Gil.. e DURÃO, 1985), os traumatismos, as infecções e a ingestão de substân- cias tóxicas (SMULDERS et ai., 1989). A eficiência da sangria pode ser definida como o volume de sangue residual ou retido nos músculos após o abate. A literatura sobre métodos de avaliação da eficiência da sangria é escassa. Talvez a dificulda- de técnica para avaliar o sangue residual seja o fator principal dessa escassez de trabalhos científicos (WARRlSS, 1977). Considerando uma variação indi- vidual muito acentuada no teor de hemoglobina san- güínea, ROÇA (1993) empregou a relação entre a he- moglobina sangüínea e a hemoglobina residual no mús- culo para estabelecer a eficiência da sangria, cujos resultados foram expressos em ml de sangue retido no músculo por 100g de músculo.
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Humane slaughter can be defined as the set of technical and scientific procedures that assure the animais welfare from loading the trucks in the farm until the exsanguination in the slaughterhouse. Animais should be slaughtered without unecessary suffering and humane conditions should prevail at alI times during the pre-slaughter management. Animal stunning is considered to be the most criticai operation during slaughter as animais should be unconscious until the end of exsanguination, preven- ting suffering and assuring an efficient blood loss. This article presents aspects related to ante-mor- tem processing such as transport, pen management, stunning and exsanguination methods and their effect on animal welfare and meat quality.
Key words: cattle slaughter, animal welfare, handling, transport, stunning, exsanguination.
ROÇA, R. O. Abate humanitário de bovinos! Humane slaughter of caule.! Rev. educo contin. CRMV -SP! Continuous Education Journal CRMV -SP, São Paulo. volume
I. ABATE Humanitário (filme). Tradução de A. Escosteguy e J.S. Madeira. PortoAJegre: CRMYIRJ, 1997.90 min, color, som, VHS.
lI. BRASIL. Ministério da Agricultura. Instrução Normativa n°. 17, de 16 de julho de 1999. Regulamento técnico de métodos de insen- sibilização para o abate humanitário de animais de açougue. S.D.AJ M.A.A. Diário Oficial da União, Brasilia, 20 jul. 1999. Seco I p. 17-18.
ROÇA, R. O. Abate humanitário de bovinos I Humane slaughler or caule. I Rev. educo contin. CRMV-SP I Continuous Education Journal CRMV-SP. São Paulo. volume