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Um texto de francisco mata machado tavares descreve o medo de um retorno da direita no poder no brasil, baseado em observações de cultura cyberpunk e distopias. O autor detalha os riscos potenciais, incluindo a restauração de projetos de desenvolvimento tecnocrático, a aliança com bancadas teocráticas, a repressão de rádios livres e a desvalorização dos direitos humanos.
Tipologia: Esquemas
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Não perca as partes importantes!
por Francisco Mata Machado Tavares*
Ouve-se no Brasil destes dias de junho e julho de 2013 um grave e recorrente aviso.
Trata-se do alarme, em geral proveniente dos palácios governistas, sobre os riscos atinentes à iminente “volta da direita” ao poder na chefia do Executivo da União.
Seja por golpe de Estado, na versão dos mais aflitos, seja por meio do sufrágio, segundo outros igualmente ressabiados, acautela-se a nação com a possibilidade, intensificada pelos protestos de rua, de um regresso dos setores sombrios, reacionários, perigosamente nefastos à República e à participação social em nossa crescentemente inclusiva sociedade.
Tenho lido muitos romances da cultura cyberpunk.
Dei-me a assistir, com estranha frequência, à filmografia das distopias de um mundo low-life-high-tech, como The Dune, Matrix ou BladeRunner. E, patologicamente imerso nessa estética, tenho até mesmo dedicado algumas horas mensais a jogar um videogame chamado Deus Ex: Human Evolution, cuja narrativa se dá em um caótico ano de 2027, quando as corporações controlam a política e a biotecnologia promete, a um só tempo, potência e disciplina, saber e dominação, de um modo que bem ilustra o ponto acadêmico dos estudiosos do biopoder, ou mesmo dos críticos da razão instrumental.
É assim que, diante dos constantes alarmes sobre os riscos da apocalíptica
“volta da direita” e imerso em distopias ficcionais sobre um futuro próximo assustadoramente verossímil, deparei-me, qual Gregor Samsa, com os mais intranquilos sonhos (espero não acordar metamorfoseado em variantes bizarras ou improváveis, como, talvez, um petista que se diga socialista), nos quais vejo detalhes desse pavoroso Brasil sob o restaurado jugo das forças de direita. Nesse psicanalítico expediente orientado a superar o meu pânico, peço- lhe s, leitores, vênia para externalizá-lo e detalhá-lo convosco.
O meu pesadelo se dá em treze atos, em cabalístico mimetismo do número de um partido brasileiro.
Quando a direita voltar ao poder, uma concepção tecnocrática de desenvolvimento, própria da época em que os militares governaram, será restabelecida. Projetos sobre os quais não se ouvia falar desde os tempos de Médici, como a Usina de Belo Monte, serão retomados e conduzidos em parceria com grandes conglomerados do capitalismo oligopolista. Indígenas serão assassinados e, quando menos, publicamente insultados por ministras de Estado. A Polícia Federal confiscará o material de trabalho dos jornalistas que cobrem conflitos ambientais e agrários. A Força Nacional de Segurança será despachada para reprimir insurgências operárias nas grandes obras da Amazônia. A legislação ambiental será dilacerada, sob efusivos aplausos de lideranças latifundiárias, aliadas à regressante direita em seu governo.
Quando sofrermos a iminente volta da direita, o governo será aliado indissolúvel das bancadas parlamentares teocráticas. Seu partido abdicará da coordenação da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, em benefício de um notório teocrata. As políticas públicas educacionais voltadas ao respeito à população LGBT serão desqualificadas pela Presidente da República como “propaganda de opção sexual”. É possível, até mesmo, que se faça aprovar uma bolsa orientada a inibir o exercício, por mulheres vitimadas por violência
auditoria, permanecerá uma letra morta. É possível que o sistema tributário se torne ainda mais regressivo do que nos anos FHC e que os pobres, por conseguinte, vivam sob uma escorchante carga tributária, ao passo que os ricos experimentem padrões de arrecadação próprios de paraísos fiscais.
Com a volta da direita, pode ser que aprovem uma lei ordinária com o escopo de afastarem, em favor da FIFA (e, por via oblíqua, das corporações que tal entidade representa sob o estímulo pecuniário de patrocínios oficiais), liberdades fundamentais de expressão e de associação dos brasileiros, proibindo-se, por exemplo, faixas de protestos dentro dos estádios de futebol ou em suas proximidades. Imagina-se até mesmo que a Presidente mande sua Força Nacional para reprimir ativistas e faça pronunciamentos em rede nacional com apelos clamorosos ao primado da lei e da ordem.
A direita manterá os gastos da União com educação superior nos mesmos 0,7% do PIB dos tempos de FHC, mas expandirá o sistema nominalmente, dando origem a universidades com aulas em containers e a professores com vencimentos reais inferiores aos dos direitistas tempos de Paulo Renato Souza. O partido da direita, quando gerir municípios, dilapidará o SUS e apostará no privatizante modelo das organizações sociais. As estradas no país da direita serão custeadas por pedágios. O transporte público será exceção, enquanto os incentivos fiscais à indústria automotiva serão a regra.
Se a direita voltar, seu partido não receberá ativistas ou manifestantes. Tentará confinar-lhes em espaços controlados e assépticos, como conferências mantidas pelo governo do partido, para que sejam frequentadas por filiados ao partido, onde terão diálogos com empresários que financiam as campanhas do partido. Quem for às ruas conhecerá a mais violenta máquina de violação dos direitos humanos, a se manifestar na Bahia, no Rio Grande do Sul, no Distrito Federal e onde mais o grupo da direita governar. Onde não governarem,
pedirão apoio das forças policiais dos governos de seus adversários, em uma aliança tática contra a democracia e os direitos políticos ou civis.
Se a direita voltar, ai meu Deus, o país começará a se desindustrializar e ocupará o papel precípuo de exportador de commodities minerais e agrícolas sem valor agregado, semeando no presente a grande crise do futuro.
No governo da direita, ao menor sinal de inflação (que será uma inflação de preços, impulsionada por tarifas administradas pelo governo em favor do grande capital, antes de inflação de demanda) o Banco Central elevará a taxa de juros SELIC, semeando recessão e usura.
No governo da direita, assim como se alardeava o milagre econômico em Médici, a máquina oficial de propaganda, onipresente (depois de bater recorde de fechamentos coercitivos de rádios livres) da grande mídia (dizem que a Veja dedicará capa laudatória à Presidente da direita e que a Globo receberá somas recordes de publicidade governamental) à blogosfera, vai dizer que a renda nacional foi desconcentrada. Mas, se alguém perguntar sobre os dados referentes à diferença entre renda do trabalho e renda do capital, os intelectuais da direita dirão que é metodologicamente impossível medir tal separação, de modo que ficarão satisfeitos em dizer que remediados passaram parcos recursos aos pobres, enquanto os bilionários enriqueceram como nunca. Que a direita nunca volte! Que o presente nunca aconteça! Voltemos ao passado em nossas máquinas do tempo e desçamos em julho de 2013, para, ali, derrotarmos, nas ruas, o governo da direita que, àquele tempo, ainda não era conhecido por seu nome real!
*Francisco Mata Machado Tavares é professor Assistente da Faculdade de Ciências Sociais da UFG.