










Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Prepare-se para as provas
Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Prepare-se para as provas com trabalhos de outros alunos como você, aqui na Docsity
Os melhores documentos à venda: Trabalhos de alunos formados
Prepare-se com as videoaulas e exercícios resolvidos criados a partir da grade da sua Universidade
Responda perguntas de provas passadas e avalie sua preparação.
Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Comunidade
Peça ajuda à comunidade e tire suas dúvidas relacionadas ao estudo
Descubra as melhores universidades em seu país de acordo com os usuários da Docsity
Guias grátis
Baixe gratuitamente nossos guias de estudo, métodos para diminuir a ansiedade, dicas de TCC preparadas pelos professores da Docsity
Este documento discute a reação de mitsuda em indivíduos sados, sua classificação e as contribuições da escola brasileira de hansenologia na compreensão desta reação. O texto aborda a hipótese de rotberg sobre a natureza da reação, a influência da infecção pelo m. Tuberculosis e da vacina bcg, e a associação familiar da reação. Além disso, são citados estudos importantes sobre a reação de mitsuda, como os de bechelli, quagliato, hadler e outros.
O que você vai aprender
Tipologia: Notas de estudo
Compartilhado em 07/11/2022
4.5
(77)184 documentos
1 / 18
Esta página não é visível na pré-visualização
Não perca as partes importantes!
Bernardo Beiguelman 1
itenta anos depois da primeira descrição da prova cutânea que viria a ser denominada
literatura científica nacional de artigos tentando diminuir a sua importância em hansenologia. Além disso, é inadmissível, em trabalhos que pretendem fazer uma revisão sobre essa reação, a ausência total de autores brasileiros nas referências bibliográficas, como se fosse possível ignorar a notável participação da escola brasileira de hansenologia no estudo da reação de Mitsuda sob os pontos de vista clínico-epidemiológico, histológico, genético e de experimentação animal. Para impedir que se promova uma amnésia coletiva a respeito dessa contribuição científica nacional e, ao mesmo tempo, reafirmar a importância da reação de Mitsuda em hansenologia, foi que o autor do presente artigo, embora ciente de suas limitações, aceitou o honroso convite do Editor de (^1) Departamento de Parasitologia, Instituto de Ciências Biomédicas, Universidade de São Paulo Correspondência para R. Angelina Maffei Vita, 408 ap. 41 CEP 01 45 5-070 São Paulo, SP.
escrever uma revisão sucinta sobre essa reação no ano de seu octogésimo aniversário.
Em 1919 Kensuke Mitsuda ampliou bastante as investigações de Yoshinobu Hayashi, ao relatar na Revista
intradérmica de uma suspensão feita a partir de
durante duas horas, não provocava resposta macrosco-
atualmente, seriam classificados como virchowianos (Hayashi, 1953; Mitsuda, 1953). Em oposição, provocava
pacientes classificados, àquela época, como tendo hanseníase máculo-nervosa (provavelmente hanseníase tuberculóide e indeterminada). A suspensão feita a partir de hansenomas veio a ser denominada, posteriormente,
sugestão do Professor Abrahão Rotberg, a lepromina
As observações iniciais de Mitsuda passaram a ser conhecidas no mundo ocidental após a Terceira Conferência Internacional de Hanseníase, realizada em 1923 em Estrasburgo (Mitsuda, 1924), quando ele relatou suas experiências em 403 hansenianos, nos quais constatou que a injeção intradérmica de 0,05 ml de uma suspensão contendo bacilos de Hansen mortos pelo calor, por ele preparada a partir 1 g de hansenomas por 10 ml de água fenicada a 0,5%, podia provocar, já após 24
BEIGUELMAN, B. A reaçáo de Mitsuda oitenta anos depois horas, o aparecimento de uma reação hiperêmica no local da inoculação. Essa reação passou, depois, a ser
diferenciá-la daquela que leva mais tempo para se manifestar e que, geralmente, é avaliada após 28 a 30 dias
que, em indivíduos sadios que não são comunicantes de hansenianos, pode ser avaliada mais tardiamente, ainda
A reação precoce à lepromina, que é considerada positiva quando tem diâmetro entre 10 mm até mais de 20 mm, é provocada por um componente hidrossolúvel da lepromina, de origem bacilar e de natureza protéica (Hayashi, 1933; Fernandez, 1940; Kitano e Inoué, 1941; Lowe e Dharmendra, 1941; Dharmendra, 1941, 1942a;
em homenagem ao hansenólogo argentino José Maria Manuel Fernandez, pela ênfase que ele deu ao estudo dessa resposta. Componentes protéicos de origem não- bacilar presentes na lepromina também podem atuar como irritantes e provocar reações precoces, mas o halo eritematoso suscitado por essas frações tem diâmetro inferior a 10 mm (Lopes de Faria, 1953). Apesar de Mitsuda ter descrito a reação precoce à lepromina, ele dedicou maior atenção à resposta tardia que observara em hansenianos e em indivíduos sadios. A tradução para o português da descrição que ele fez, em francês (Mitsuda, 1924), da evolução da resposta no local da inoculação, após o aparecimento da reação hiperê- mica inicial, demonstra bem seu maior interesse pela reação tardia: "Mas, coisa curiosa e muito interessante do ponto de vista da imunidade; nós notamos uma grande diferença no concernente ao modo de se comportar dessa reação hiperêmica na hanseníase maculosa e nervosa, de um lado, e na hanseníase tuberosa, de outro. Nessa última, a hiperemia local observada em 279 doentes era passageira, desaparecendo em alguns dias sem deixar vestígio, enquanto na primeira, a reação observada em 124 doentes aumentava em uma grande proporção deles (isto é, em 79% dos casos), de modo crescente nos primeiros quinze dias, tornando-se uma infiltração celular formando uma espécie de pápula, que ainda persistia durante mais uma semana". Experimentando a inoculação da lepromina em dez indivíduos sadios, que não eram comunicantes de hansenianos, Mitsuda constatou a manifestação de uma reação tardia acentuada em sete deles. Por outro lado, a mesma inoculação efetuada em três enfermeiras, que haviam estado em contato com hansenianos por mais de dez anos, provocou, em todas, reação muito forte. A grande repercussão internacional do trabalho de Mitsuda, entretanto, só foi alcançada dez anos depois da Terceira Conferência Internacional de Hanseníase, em decorrência de um artigo de um seu discípulo, Fumio Hayashi (1933). Trabalhando na mesma linha, Hayashi (1933) confirmou as observações de seu mestre, ou seja, de que na hanseníase atualmente chamada virchowiana, e que, à época, era denominada nodular, a reação tardia a 0,1 ml da lepromina por ele preparada era quase sempre negativa (96% de 125 casos), sendo positiva na maioria dos doentes com hanseníase máculo-nervosa (97% de 64 casos). Desde então, os testes feitos em todo o mundo com a lepromina integral foram incontáveis (mas, seguramente, da ordem de milhões) e serviram para confirmar seu valor inestimável como auxiliar para a classificação da hanseníase, pois ficou plenamente demonstrado que a reação de Mitsuda é, regra geral, negativa em indivíduos com hanseníase virchowiana, predominantemente posi- tiva em pacientes com hanseníase tuberculóide e freqüentemente negativa em pacientes dimorfos. Em outras palavras, a exemplo de outras manifestações, os tipos polares, virchowiano e tuberculóide, de hanseníase comportam-se antiteticamente em relação à reação de Mitsuda. Nos pacientes com hanseníase indeterminada,
distribuição das respostas negativa e positiva varia de acordo com a amostra estudada (Rotberg, 1944;
conseqüência da variação da proporção de pacientes que, potencialmente, podem evoluir para o tipo virchowiano ou para o tipo tuberculóide de hanseníase. O importante, porém, é que, de há muito, ficou demonstrado o valor prognóstico da reação de Mitsuda em pacientes com hanseníase indeterminada, pois, neles, a positividade forte ao antígeno de Mitsuda é uma indicação de que não haverá evolução para o tipo virchowiano da doença (Rotberg, 1944). Nas fases reacionais, os pacientes com o tipo tuberculóide da hanseníase podem perder, tempo- rariamente, a capacidade de responder positivamente ao teste de Mitsuda (Souza Lima e Souza Campos, 1947; Bechelli e Quagliato, 1953; Basombrio, 1956). É geral a aceitação de que a resposta negativa ao teste de Mitsuda dos pacientes virchowianos é perma- nentemente observada, apesar de terem sido assinalados casos de reações positivas fracas nesses hansenianos, após
Dominguez, 1953; Bechelli et al., 1959; Azulay et al., 1960; Mukerjee e Kundu, 1961; Leiker, 1961c). De
pacientes virchowianos não têm significação, porque as biópsias dessas reações, ao serem examinadas microsco- picamente, não revelam granuloma tuberculóide, típico das reações positivas. Por outro lado, as reações de Mitsuda fracas em pacientes virchowianos parecem ter Hansen. Int 24(2): 144 - (^16 999) 145
BEIGUELMAN. B. A reação de Mitsuda oitenta anos depois
Hansen. lnt., 24(2): 144 - 161, 1999 (^) 147
Hansenologia Internationalis realizada no Rio de Janeiro (cf. Bechelli e Rotberg, 1956), foi proposta a leitura da reação de Mitsuda três a quatro semanas após a inoculação da lepromina e a seguinte classificação dos resultados: ausência de elemento visível ou palpável (reação negativa, - ); elemento perceptível, s em os c ar ac t er es d e p os i tivid ad e ad ia nte d es c r itos (reação duvidosa, ±); elemento saliente, infiltrado, de cor variando do róseo ao violáceo, progressivo e persistente, de 3 a 5 mm de diâmetro (reação positiva +); elemento saliente, infiltrado, de cor variando do róseo ao violáceo, progressivo e persistente, com mais de 5 mm de diâmetro (reação p ositiva ++); reaç ão pos itiva c om ulcer ação (reação p ositiva +++). Essa propos ta, ratificad a nos C o n g r e s s o s I n t e r n a c i o n a i s d e L e p r o l o g i a d e 1 9 4 8 ( H a v a n a ) , d e 1 9 5 3 ( M a d r id ) e d e 1 9 5 8 ( T ó q u i o) é ,
E m 1 9 6 3 , n o V I I I C o n g r e s s o I n t e r n a c i o n a l d e Leprologia (Rio de Janeiro) sugeriu-se considerar como reação positiva as respostas com, pelo menos, 5 mm, p r e s s u p o n d o - s e a u t i l i z a ç ão d e l e p r o m i n a c o m 1 6 0 milhões de bac ilos de Hans en por ml. A classificaç ão propos ta levava em conta as classes — (ausênc ia d e reação); ± (induração com menos de 5 mm de diâmetro);
inoculação de lepromina integral, observadas consecuti- vamente após diferentes intervalos de tempo (Beiguelman e Quagliato, 1964; Beiguelman, Quagliato e Camargo, 1965), Beiguelman (1971 a) propôs considerar apenas três classes de reação: ausência de reação local ou presença de nódulo com menos de 3 mm de diâmetro (reação 0); nódulo c om 3 a 5 mm d e diâmetro (r eação 1); nódulo com diâmetro superior a 5 mm, que pode estar ulcerado (reação 2). V i s t o q u e e s s a s d i f e r e n t e s p r o p o s t a s p a r a a classificação macroscópica da reação de Mitsuda não diferem fundamentalmente entre si, a assim chamada classificação de Madrid (1953), que leva em conta cinco classes de resposta ( - , ±, +, ++ e +++) continua a ser a mais amplamente utilizada.
As primeiras descrições das alterações teciduais, ao nível microscópico, em conseqüência da inoculação da lepromina integral também foram feitas por Mitsuda. Hayashi (1933), ao comentar que as suas observações concordavam com as de seu mestr e, desc reveu, com precisão, o que ocorre nas reações tipicamente positivas, relatando que, após a injeção de lepromina, apareciam alterações inflamatórias agudas, as quais eram substituídas por alterações crônicas, com aparecimento de células epitelióides e gigantócitos, onde os bacilos haviam sido fagocitados. Descreveu, também, a pres ença de halo l i n f ó i d e r o d e a n d o a á r e a d e i n f i l t r a ç ã o d e c é l u l a s ep itelióid es e de g ig antóc itos , ond e, r ar amente, s e observam bacilos álcool-ácido-resistentes. Com a mesma finalidade de estudo histológico das respostas à inoculação da lepromina integral em seres humanos d evem ser mencionad os outr os tr ab alhos , d entr e os q uais desp ontam os r ealiz ados no Br as il, (Schujman, 1936; Rabello Jr. e Rotberg, 1937; Nagai, 1 9 3 8 ; A l a y o n , 1 9 3 9 ; A l a y o n e S o u z a - L i m a , 1 9 4 0 ; Nolasco, 1940; Büngeler e Fernandez, 1940; Souza-Lima, 1942; Rodriguez, 1950; Yokota, 1953; Lopes de Faria, 1953; Bechelli et al., 1959; Azulay et al., 1960; Andrade,
antigos estudos experimentais de Mariani (1924, 1925) com bacilos vivos e mortos. Entretanto, é importante assinalar que a investigação desse problema em grandes a m o s t r a s , s o m e n t e f o i r e a l i z a d a p o r g r u p o s d e pesquisadores brasileiros (Luiz Marino Bechel li, Paulo Rath de Souza e Reynaldo Quagliato, 1959; Rubem David A z u l ay , Ly g ia M. Céz ar d e A n d r ad e, C ân d i d o S i lv a , Américo V. Rabello Netto, Jacob D. Azulay, René Garrido- Neves e Avelino Miguez-Alonso, 1960; Nílceo Schwery Michalany e Jorge Michalany, 1983; Valéria Petri, Ernesto V. Mendes e Bernardo Beiguelman, 1985). Bechelli et al. (1959) estabeleceram os seguintes critérios para classificar histologicamente a reação de Mitsuda:
intens idad e, granulomatoso e constituído predominantemente por células epitelióides, assumindo a estrutura tuberculóide. Bacilos ácido-resistentes ausentes ou raros.
infiltrado inflamatório crônico banal (bacilos em geral ausentes ou em pequeno número) ou granulomatoso, sem es tr utu r a tub er c u lóid e e c ons tit uíd o p or e lemen tos histiocitários sem as características das células epitelióides (bacilos presentes em número substancial).
certa intensidade, porém não totalmente granulomatoso e nem constituído predominantemente por células epitelióides; aqui e ali mostram-se grupados, numa tendência mais ou menos nítida à formação de estruturas nodulares. Pode-se ver um ou outro gigantócito. Bacilos ausentes ou raros. 148
Hansenologia Internationalis da inoculação. De fato, Garrido Neves (1962) empregou um exame citobacterioscópico, que permite classificar microscopicamente as respostas ao teste de Mitsuda em duas classes alternativas, dependendo do comportamento dos macrófagos. Esse teste consistiu da análise do material colhido por raspagem dos bordos da incisão, feita com bisturi, na zona mediana da pele inoculada com lepromina. De acordo com Garrido Neves (1962), nas reações negativas predominam os macrófagos vacuolados com bacilos no citoplasma, enquanto que nas reações positivas predominam as células epitelióides e as células gigantes, tipo Langhans, com escassas granulações bacilares ou número escasso de bacilos com aspecto granuloso. Outra maneira de analisar microscopicamente os resultados da fagocitose do M. leprae pelos macrófagos foi
terísticas dos histiócitos migrantes dos tecidos. Bene- wolenskaja (1932) parece ter sido a primeira a observar a capacidade fagocitica de macrófagos originados dessa
de amostras de sangue total, do mesmo modo que Treo e Silva (1963). Outros pesquisadores usaram técnicas diversas, diferenciando os monócitos depois de incubar todos os leucócitos separados do sangue como coágulo ou como creme leucocitário, ou depois de separá-los por centrifugação diferencial (Beiguelman e Barbieri, 1965;
1967; Godal e Rees,1970; Drutz e Cline, 1970; Delville, 1 9 7 1 ; P i s a n i , B e i g u e l ma n e O p r o m o l l a , 1 9 7 3 ;
Freire-Maia, 1983a, b). Com exceção de Godal e Rees (1970), Drutz e Cline (1970) e Parmaswaran et al. (1976), todos os autores observaram que os macrófagos oriundos de monócitos de
expectativa de não digerir os bacilos da lepromina quando procediam de pacientes virchowianos, segura- mente Mitsuda-negativo, de digerir esses bacilos quando procediam de pacientes tuberculóides Mitsuda-positivo e de mostrar fraca atividade de lise bacilar nos pacientes dimorfos. Entretanto, nos indivíduos sadios, apesar de todos concordarem que neles existe uma variabilidade da capacidade de lise bacilar pelos macrófagos derivados dos monócitos, nem Pisani et al. (1973) nem Veliath et al. (1979) conseguiram observar uma associação entre a intensidade da reação de Mitsuda e a velocidade de lise
publicados por Barbieri e Correa (1967).
A análise microscópica das biópsias das reações de Mitsuda provocadas pela lepromina integral em hansenianos revelou que, nesses pacientes, a resposta negativa (-) e as positivas fortes (+ + e +++) tiveram boa correspondência histológica. Assim, nos dados de Bechelli et aI. (1959), cerca de 95% dos hansenianos com reação de Mitsuda macroscopicamente negativa mostraram uma resposta histológica igualmente negativa, enquanto que entre os pacientes com reação de Mitsuda ++ e +++, apenas 7% apresentaram resposta histologicamente negativa, devendo-se notar que nenhum hanseniano com resposta +++ apresentou quadro histológico negativo. Além disso, tanto no caso das reações + + + quanto nas reações ++ a estrutura histológica predominante foi o granuloma tuberculóide. Já entre os hansenianos com reação de Mitsuda fraca (+), a porcentagem daqueles com resposta histologicamente negativa foi maior (33%), crescendo para 67% entre aqueles com reação de Mitsuda duvidosa (±). Convit et aI.(1972), empregando uma lepromina mais concentrada que a usual (640 milhões de bacilos por ml), para poder provocar uma reação tardia macrosco- picamente perceptível em pacientes virchowianos, não conseguiram observar reação histologicamente positiva nos pacientes com lesões ativas nem nos bacterio- logicamente negativos. Notaram, entretanto, que nos pacientes virchowianos há graus variados de incom- petência de seus macrófagos para digerir os bacilos fagocitados. Assim, enquanto em alguns pacientes os bacilos da lepromina aparentavam integridade mesmo após 120 dias no local do inóculo (totalmente incom- petentes), em outros os macrófagos mostravam maior competência para digerir tais bacilos, eliminado-os num período entre 90 e 120 dias (Convit et al., 1979). Entre os comunicantes de hansenianos, os resul- tados de Bechelli et al. (1959) mostraram uma associação entre as respostas macroscópicas e histológicas à lepromina bem semelhante à observada nos hansenianos. Já em uma grande amostra de pessoas sadias (100) que não eram comunicantes de hansenianos, a investigação
reação de Mitsuda provocada por lepromina integral revelou um resultado diverso. Assim, tanto as biópsias dos 77 indivíduos Mitsuda-positivo (+, ++ e +++) quanto as dos 19 Mitsuda-duvidoso (±) mostraram diferentes graus de positividade histológica, sendo que, entre os M i ts ud a - p o s it iv o , a i nt e n s id ad e d as r e s p o s tas macroscópicas não mostrou associação significativa com o grau de positividade histológica. Além disso, entre os 150
BEIGUELMAN, B. A reação de Mitsuda oitenta anos depois poucos Mitsuda-negativo (4), um apresentou positividade histológica. Os resultados de Petri et al. (1985) falam, pois, a
comunicantes de hansenianos, qualquer reação tardia provocada pela lepromina no local da inoculação, mesmo que seja uma infiltração com menos de 3 mm de diâmetro, não deveria ser catalogada como reação de Mitsuda duvidosa (±) e muito menos negativa, porque ela seria uma indicação de que os macrófagos desses não-
fagocitado. Em outras palavras, para os não-comunicantes não se deveriam aplicar os mesmos critérios que são empregados para os comunicantes. Visto que a pesquisa de Petri et al. (1985) foi feita com lepromina integral A, seria interessante repetir essa investigação em outra amostra de não-comunicantes, com o emprego de lepromina integral H, a fim de comparar os resultados.
Pode-se afirmar sem medo de errar que o
alcançado graças às contribuições da escola brasileira de hansenologia, a começar pela brilhante intuição de Rotberg, ao estabelecer, já em 1937, a sua hipótese sobre a natureza da reação de Mitsuda. De acordo com a hipótese de Rotberg (1937), apenas uma pequena fração da população seria, geneticamente, incapaz de reagir à infecção pelo bacilo de Hansen ou à inoculação
pela qual esse grupo seria permanentemente Mitsuda-
fração da população seriam incapazes de responder
indivíduos com hanseníase virchowiana se originariam, portanto, dessa fração da população. Ainda de acordo com Rotberg (1937) a maioria dos seres humanos nasceria
para demonstrar essa resistência geneticamente determinada, isto é, para demonstrar positividade ao teste de Mitsuda, essas pessoas necessitariam passar por um processo imuno-alérgico, que ele pensou,
Posteriormente ele estendeu a experiência imunológica a outras mico- bactérias. Numerosos estudos feitos desde então trouxeram argumentos a favor da consistência da teoria de Rotberg
Augusto Hadler, usando o modelo animal do cobaio e do rato. Os macrófagos do cobaio têm a capacidade de
fagocitam (Hadler, 1953b). Por ser a destruição bacilar dentro dos macrófagos a condição essencial para o desen- volvimento de hipersensibilidade (Hadler, 1953a), essas
capacidade de provocá-la, o que pode ser demonstrado pelo teste tuberculínico (Hadler e Ziti, 1953). Os macrófagos do rato, por sua vez, não têm capacidade de
Quando inoculados intradermicamente com lepro- mina, tanto o cobaio quanto o rato mostram macrosco- picamente pouca reação cutânea no local do inóculo, a qual pode ser catalogada como negativa. O estudo histo- lógico, porém, revela que os macrófagos dessas duas espécies têm um comportamento diferente em relação ao
bacilos da lepromina e se transformam em células epite-
esses bacilos se acumulam em seu interior. A vacinação desses animais com BCG não altera a capacidade de lise
macroscopicamente a intensidade da resposta. De fato, os cobaios previamente hipersensibilizados mostram maior nódulo no local da inoculação da lepromina, mas a estrutura e citologia da lesão não difere da dos cobaios não vacinados (Hadler, 1956). Nos ratos vacinados com BCG, a sensibilização é menor do que a desenvolvida por cobaios nas mesmas condições. De qualquer modo, mesmo nos ratos que mostram reação macroscópica mais intensa no local da inoculação da lepromina, essa reação não pode ser catalogada como positiva porque não possui correspondência histológica (Hadler e Ziti, 1955). Como se vê, de acordo com o modelo animal utilizado por Hadler, os macrófagos do rato se compor- tariam, em relação aos bacilos da lepromina, como os dos indivíduos da fração da população contida no que Rotberg denominou de margem anérgica. Os macrófagos do cobaio, por sua vez, se comportariam de modo análogo aos dos indivíduos resistentes à hanseníase, os quais, desde que devidamente sensibilizados, expressam macroscopicamente a capacidade de digerir os bacilos da lepromina, isto é, mostram-se Mitsuda-positivo. Por essa analogia, nos indiv íduos cujos macrófagos são
citose, a sensibilização poderia ser induzida tanto pelo M.
térias com similaridade antigênica e que pudessem ser lisadas. Já nos indivíduos cujos macrófagos são
micobactérias não seria capaz de alterar o comporta- Hansen. let., 24(2): 144 - 161, 1999 (^) 151
BEIGUELMAN, B. A reação de Mitsuda oitenta anos depois
Apesar de Rotberg ter proposto em 1937 uma hipótese genética para explicar a reação de Mitsuda, as investigações a respeito da possibilidade de tal reação ser um polimorfismo genético somente foram iniciadas 25 anos depois, em uma amostra de 220 famílias de Rio das Pedras, SP sem casos de hanseníase (Beiguelman, 1962). Nessa
indiscutivelmente, um caráter familial, pois há uma grande associação entre as distribuições dessa reação nas gerações paterna e filial, resultante de os filhos de genitores Mitsuda- negativo terem maior probabilidade de apresentar resposta negativa ao teste de Mitsuda do que os filhos de genitores Mitsuda-positivo. Essa associação familial permitiu aventar a hipótese de que ela poderia decorrer de um par principal de alelos autossômicos, com relação de dominância, sendo a resposta negativa ao teste de Mitsuda recessiva, aceitando-se, entretanto, que uma parte dos homozigotos recessivos poderia manifestar reação positiva, como decorrência da ação de fatores do ambiente (Beiguelman, 1962, 1963, 1971a). A associação familial da reação de Mitsuda foi confirmada em outra amostra, de 100 famílias sem casos de hanseníase, residentes em Cosmópolis, SP (Beiguelman e Quagliato, 1965; Beiguelman, 1971a), bem como em famílias de hansenianos do Brasil e da Índia (Beiguelman, 1965; Saha e Agarwal, 1979; Kundu et al., 1979). Além disso, ao analisar quantitativamente a reação de Mitsuda em famílias de hansenianos e naquelas sem essa doença, Botasso et al. (1984), na Argentina, constataram uma correlação significativa entre as médias das respostas dos genitores e dos filhos. Nas famílias de hansenianos de Campinas, mais expostas do que as pessoas da população geral a agentes sensibilizantes (inoculações repetidas de lepromina, vaci-
associação familial da reação de Mitsuda foi mais acentuada do que nas famílias de indivíduos sadios (Beiguelman,1965), provavelmente porque, nas primei- ras, os agentes sensibilizantes acentuariam a corres-
inoculação da lepromina Nas famílias de hansenianos brasileiros, a hipótese de herança monogênica autossômica da reação de Mitsuda, com a reação positiva sendo o fenótipo dominante, ficou perfeitamente satisfeita quando foram levados em conta apenas as irmandades geradas por casais que incluíam pelo menos um cônjuge Mitsuda- positivo. Entretanto, entre os filhos de casais virchowianos e, portanto, indiscutivelmente Mitsuda-negativo, consta- tou-se que 30,9% responderam positivamente à inoc ulaç ão d a lepromina, em ve z de todo s , o u praticamente todos, os membros das irmandades serem Mitusda-negativo (Beiguelman, 1965). Para explicar essa discrepância foi aventada a hipótese de que a capacidade de lise, isto é, de destruição do bacilo de Hansen fagocitado pelos macrófagos poderia ser um fenômeno de limiar (Beiguelman, 1967, 1968, 1971a). De acordo com com essa hipótese, tanto as pessoas
tanto os lisadores quanta os não-lisadores seriam hete- rogêneos. Admitindo que, segundo o limiar de lise, tanto os lisadores quanto os não-lisadores se distribuiriam de modo unimodal, podia-se admitir, também, que a distribuição dos seres humanos segundo a capacidade de seus macrófagos em digerir o bacilo de Hansen seria bimodal. Essa capacidade de lise seria, pois, um caráter semi-descontínuo, com os fenótipos lisador e não-lisador discriminados pela região antimodal.
responsável pelo fenótipo lisador e um seu alelo principal responsável pelo fenótipo não-lisador. Em outras palavras, a capacidade de lise dos macrófagos em relação aos bacilos de Hansen fagocitados seria um caráter genético que dependeria muito de fatores do ambiente para se expressar. Por isso, em que pese a alta probabilidade de encontrar uma reação de Mitsuda histologicamente positiva nos indivíduos em que essa reação também é positiva macroscopicamente, isto é, em que pese a alta associação existente entre ambas, a primeira poderia ser herdada e a segunda não. Essa teoria também não exclui a possibilidade de ocorrência de genocópias do alelo nãolisador, isto é, de se admitir que a incapacidade de destruição dos bacilos de Hansen pelos macrófagos pode ser conseqüência de mais de um tipo de erro genético. De acordo com essa nova proposta, poder-se-ia explicar a ocorrência dos cerca de 30% de indivíduos macroscopicamente Mitsuda-positivo observados por Beiguelman (1965) entre os filhos de casais virchowianos e, portanto, seguramente Mitsuda-negativo, como conse- qüentes das seguintes causas:
Hansenologia Internationalis
al. (1960) sobre a correspondência histológica das reações de Mitsuda em comunicantes de hansenianos, na análise realizada por Feitosa et al. (1996), as reações +, ++ e +++ foram consideradas como resposta positiva, ao passo que as reações - e ± foram classificadas como resposta negativa. Os resultados da análise de segregação aplicada aos dados familiais de Campinas, SP, revelaram que a associação familial da reação de Mitsuda notada pela primeira vez por Beiguelman (1962) é inquestionável, do mesmo modo que se deve aceitar, para explicar essa associação familial, a transmissão mendeliana de um par principal de alelos. Essa mesma análise indicou, ainda, que o efeito do gene determinador da reação de Mitsuda
parcialmente dominante (d = 0 ,811). Esses resultados acenam, pois, com a possibilidade de localização do eventual loco gênico responsável pela reação de Mitsuda, o que equivale a dizer que eles apontam para a tentativa de, com o emprego de métodos da genética molecular, localizar um gene responsável pela predisposição à manifestação da hanseníase virchowiana. Sabendo-se que a região distal do braço inferior do cromossomo 2 humano (região 2q31- 2q37) contém um
pela resistência ou suscetibilidade inata à infecção por
ia tentar, como próximo passo, estudos de ligação da reação de Mitsuda com marcadores dessa região. Oxalá essa tentativa resulte em maior sucesso do que aquelas que tiveram por objetivo os estudos de ligação entre os marcadores dessa região do cromossomo 2 humano e a
Apesar de a lepromina integral ser considerada um reagente rústico, ela continua tendo importância funda- mental em hansenologia, porque, até o presente, não se encontrou um substituto para competir com a reação de Mitsuda em seu valor prognóstico, mormente na hanseníase indeterminada e dimorfa, e na avaliação da resistência de comunicantes à manifestação da hanseníase virchowiana. Por outro lado, graças ao estudo da reação de Mitsuda, pode-se antever a possibilidade de localizar, com o emprego de métodos da genética molecular, o eventual gene responsável pela predisposição à mani- festação da hanseníase virchowiana.
154
Hansenologia Internationalis
BEIGUELMAN, B. A reação de Mitsuda oitenta anos depois
BEIGUELMAN, B. A reação de Mitsuda oitenta anos depois
Hansenologia Internationalis
1 5 5. SI X TH I NT ER NATI ON AL CONG R ES S OF L EPRO SY (MADRID) Immunology. The lepromin reaction. Int. J. Leprosy , 21: 531-535, 1953. 160