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A história dos quadrinhos, desde suas origens pré-históricas até a era digital, é marcada pela interação com a imprensa, cinema, rádio, televisão e a formação da cultura ocidental. A estrutura básica da linguagem dos quadrinhos, composta por uma sequência de representações visuais interdependentes, constitui uma narrativa que pode ou não incluir linguagem verbal. Ao contrário do que pode parecer, as histórias em quadrinhos são mais do que uma mistura de desenhos e palavras, sendo uma linguagem artística específica. A origem moderna dos quadrinhos está ligada ao aperfeiçoamento das técnicas de impressão no ocidente e à estabelecida da sociedade burguesa. Os antepassados dos quadrinhos podem ser encontrados em obras pré-históricas, como hieróglifos egípcios, murais maiais e iluminuras medievais, entre outras. No entanto, as funções que elas exerceram nas sociedades em que surgiram e sua própria existência material os afastam das histórias em quadrinhos modernas.
Tipologia: Notas de estudo
Compartilhado em 07/11/2022
4.4
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A origem histórica dos quadrinhos (de hoje).
A história em quadrinhos tem sido, ao longo do século XX, um meio de comunicação bastante difundido e influente. Através das tirinhas de jornal, das revistas, fanzines e dos álbuns que colecionam trabalhos de autores consagrados, os quadrinhos estabeleceram um espaço próprio entre as demais linguagens e veículos da indústria cultural. Assim, em interação com a imprensa, o cinema, a publicidade, o rádio e, mais tarde, a televisão, a história em quadrinhos contribuiu para a formação da cultura de nosso século (um dos vários exemplos que serviriam para atestar essa afirmação é a popularidade do Super-Homem, personagem surgido nos comics norte-americanos em 1938, que se tornou conhecido em todo o mundo).
Uma sequência de representações visuais interdependentes é a estrutura básica da linguagem dos quadrinhos; através dela constitui-se uma narrativa, um texto que pode ou não incluir a linguagem verbal. Esta, quando aparece, é incorporada ao espaço visual da página, através dos balões, das legendas e das representações gráficas de onomatopéias. Ao contrário do que pode parecer à primeira vista, a história em quadrinhos não é uma simples mistura de desenhos e palavras, mas sim uma linguagem artística específica. Traçar sua origem histórica, relacionando-a com suas características específicas, é o propósito central deste texto.
Os quadrinhos têm uma história e ocupam um lugar entre as manifestações culturais da humanidade. Em geral, os trabalhos que tratam de sua origem, na tentativa de legitimá-los como tema relevante, partem da idéia de uma tradição ancestral que remontaria à arte rupestre do paleolítico. Segundo esta concepção, uma listagem dos “ancestrais” dos quadrinhos seria bastante extensa e poderia incluir, entre outros: os hieróglifos egípcios, com suas representações de cenas cotidianas e rituais; os murais da cidade maia de Bonampak, que representam batalhas e cerimônias religiosas; as iluminuras medievais ou a Tapeçaria de Baieux, que narra a invasão da Inglaterra pelos normandos; além de gravuras japonesas, que têm entre seus temas mais comuns combates entre samurais e narrativas mitológicas.
Contudo, apesar de algumas semelhanças formais, é evidente que os artistas pré- históricos e os artesãos egípcios ou medievais não faziam histórias em quadrinhos. Na verdade, essa pretensa “genealogia” apenas nos leva a constatar que há séculos e nas mais variadas sociedades os homens utilizam-se de sequências de desenhos para representar e registrar aspectos de seu cotidiano ou contar histórias. Embora seja possível identificar-se nessas obras alguns dos elementos que formam a linguagem dos quadrinhos, a função que elas exerceram nas sociedades em que surgiram e sua própria existência material afastam-nas das histórias em quadrinhos, cuja origem está ligada ao aperfeiçoamento das técnicas de impressão no Ocidente e ao estabelecimento da sociedade burguesa.
Como produto cultural ou forma de comunicação, os quadrinhos existem a partir de sua reprodução e disseminação, não têm função enquanto “obra única”, e só podem ser pensados como produtos da Modernidade, como veículos de socialização de idéias e imagens; enfim, como forma de arte da “época da reprodutibilidade técnica”, como diria o filósofo alemão Walter Benjamin. O caráter moderno dos quadrinhos é confirmado em sua própria existência material: livros, jornais e revistas. Portanto, o antecedente primeiro que possibilitou seu surgimento foi o aperfeiçoamento das técnicas de impressão, levado a cabo, no Ocidente, por Guttemberg no século XV.
O surgimento da imprensa é um dos elementos que favoreceram a efervescência cultural e intelectual que caracterizou a Europa do início da Era Moderna. Entretanto, é bom lembrar que nesta sociedade, cuja maior parte da população não sabia ler, as imagens e a comunicação visual desempenhavam um papel fundamental, bastante explorado pelas instituições de poder. Assim, o desenvolvimento da impressão de textos escritos foi acompanhado pelo aperfeiçoamento das técnicas de reprodução de imagens, logo adaptadas a variados temas e múltiplas funções. Veiculadas como ilustrações em livros ou na forma de folhetos, as gravuras difundiram-se amplamente a partir do século XVI, tendo grande importância no processo de intercâmbio de idéias e tornando-se potenciais veículos para a propagação de doutrinas (fato explorado pelas autoridades leigas e religiosas).
Para ler e ser lido, não bastavam os avanços técnicos, era necessária também uma disponibilidade material e humana. Mesmo que de maneira lenta, a melhoria das condições materiais (possibilitada pelos avanços técnicos, sobretudo no setor das comunicações) e a crescente demanda por informações (fomentada pelo Renascimento, pelas Reformas e os contatos com o Novo Mundo e o Oriente) colaboraram para a expansão da imprensa. Os produtos culturais tornavam-se mais acessíveis, ao mesmo tempo em que seu público potencial ampliava-se. As transformações na Europa do início da Era Moderna, que levaram à descoberta de novos mundos, vieram acompanhadas de outra mudança que, desde o final da Idade Média, trouxe de volta à cena as cidades, dando vida a um novo personagem histórico, o burguês.
Segundo um ditado medieval “o ar da cidade torna o homem livre”. Nas cidades européias dos séculos XVII e XVIII, a vida proliferou, explodindo na forma de novas manifestações culturais e de revoluções sociais. Em importantes centros econômicos da época, como Londres e Paris, a dinâmica social levou ao surgimento de uma nova cultura, identificada com as classes médias e populares. Como frutos dessa explosão político-cultural e da valorização da ascendente classe burguesa, ao lado dos romances de folhetim, difundiram-se as charges e cartuns.
Ao mesmo tempo em que criticavam os hábitos e a opulência da aristocracia, as charges opunham-se ao padrão estético vigente. Com suas figuras engraçadas ou até grotescas, estes desenhos de caráter cômico e intenção política não seguiam os temas eleitos pelas elites, privilegiando o cotidiano urbano. Tendo como referencial a realidade dos grandes centros europeus, gravuristas como William Hogarth compuseram obras que tinham o objetivo de mobilizar e transformar a própria sociedade. Antes de mais nada, suas gravuras eram obras políticas, cuja perspectiva partia da experiência do autor e das aspirações e cultura de seu público.
Além de seu conteúdo formal, numa HQ, os componentes visuais têm função narrativa (a história se desenrola a partir da seqüência de desenhos, em interação com os textos escritos das legendas e balões). Tendo se tornado elementos característicos dos quadrinhos, a sequencialidade de quadros e os balões apareceram primeiro nas charges e cartuns, como resultado das experiências criativas de autores que buscavam aperfeiçoar
seus trabalhos, tornando mais precisas e comunicativas suas obras cômico-políticas. Já no século XVIII, alguns dos trabalhos do cartunista inglês James Gillray eram formados por dois ou mais quadros e traziam balões.
Se as bases formais e estruturais dos quadrinhos (grafismo sintético e narrativa visual) surgiram com as charges, foram os romances de folhetim e a literatura infantil que forneceram sua estrutura literária. Enquanto as charges e os cartuns geralmente estão ligados ao momento específico em que são produzidos e veiculados, desempenhando papel de crítica política e crônica social, no caso das histórias em quadrinhos predomina a dimensão de narrativa e o substrato literário. Esses elementos que as caracterizam, diferenciando-as de seus antecessores jornalísticos, estão diretamente ligados às condições econômicas e sociais da Europa na passagem para o século XIX.
Com a progressiva industrialização (que levou ao aperfeiçoamento gráfico e ao barateamento das edições) e a crescente população urbana (na qual se destacam as classes médias e a burguesia em ascensão), a imprensa e a indústria literária puderam expandir-se à medida que o público leitor também aumentava. Estas novas condições levaram a uma maior concorrência e ao desenvolvimento de gêneros literários e segmentos especializados, como os romances de aventura e a literatura infantil, além de reedições ilustradas de clássicos da literatura, como Dom Quixote e A Divina Comédia. É por inspiração e filiação a esta cultura e literatura “burguesas” que surgiram as histórias em quadrinhos.
Os trabalhos de pesquisa sobre a origem dos quadrinhos de maior credibilidade atribuem ao ilustrador suíço Rodolphe Töpffer a paternidade desta arte (opinião compartilhada por E. H. Gombrich em seu inspirador Arte e Ilusão ). Na década de 1820, Töpffer lançou sua primeira história composta por sequências de desenhos com legendas. Nas histoires en estamps de Töpffer, os desenhos não servem apenas de ilustrações para o texto escrito, cabendo-lhes uma função narrativa própria. Por sua vez, o texto escrito aparece na forma das legendas, sendo, portanto, incorporado ao espaço gráfico-visual da página. Narrativa visual e linguagem verbal coexistem numa mesma obra, ocupando um campo integrado, mas possuindo existência autônoma (os desenhos não são apenas
produção de histórias em quadrinhos em todo o mundo, sustentando a imagem de que elas são apenas “coisa de criança”.
Semelhante ao que aconteceu com o cinema, os europeus também foram os responsáveis pelo surgimento dos quadrinhos, contudo, foram os norte-americanos os pioneiros em explorar maciçamente suas possibilidades comerciais. Contudo, apesar do pioneirismo em explorar comercialmente os quadrinhos, não devemos incorrer no equívoco (muitas vezes proposital) de atribuir aos norte-americanos a paternidade da história em quadrinhos. Esta reivindicação baseia-se nos argumentos de que teria sido Richard Outcault o criador dos balões dos quadrinhos e de que seu personagem Yellow Kid seria o primeiro a obter ampla popularidade (ver, por exemplo, os argumentos de Maurice Horn na introdução de 100 Years of American Newspaper Comics ).
Em contrário a estas tendenciosas proposições, pode-se argumentar que o uso dos balões tornou-se um elemento característico da linguagem dos quadrinhos mas não é indispensável ou indicador automático de que se trate de uma história em quadrinhos (algumas charges já empregavam balões pelo menos desde o século XVIII e algumas histórias em quadrinhos, os exemplos seriam intermináveis, não apresentam balões, sem por isso deixarem de ser histórias em quadrinhos). Além do mais, a popularidade de um personagem ou série, com sua consequente exploração comercial, obviamente não pode ser considerada um indicador de que se está diante de uma história em quadrinhos. Mesmo que o fosse, a série Juca e Chico já tinha obtido sucesso na Europa, trinta anos antes de Yellow Kid ser lançado nos Estados Unidos.
Embora Rodolphe Töpffer seja considerado o primeiro desenhista a ter consciência de que lidava com uma nova linguagem artística, a idéia que temos do que vem a ser uma história em quadrinhos veio tomando forma nos últimos 170. Pode-se considerar (pelo menos em termos “estatísticos”) que qualquer pessoa que tenha feito uma história em quadrinhos contribuiu para a ampliação desta linguagem artística. Afinal, esse “autor” criou uma obra que não existia antes. Entretanto, nem todas as HQ’s lançadas até hoje trouxeram elementos que inovaram e enriqueceram a linguagem dos quadrinhos e, ao contrário do que pode se pensar, a influência exercida por um autor ou sua popularidade não são, necessariamente, atestados de qualidade para suas obras.
Para chegarem a ser o que são hoje, a linguagem e a indústria dos quadrinhos somaram contribuições internacionais. Mas é inegável que, nas primeiras décadas do século XX, os Estados Unidos foi o país que mais contribuiu para seu desenvolvimento e popularização. Emergindo como uma potência econômica, o país atraía imigrantes de todo o mundo. Levado pelos europeus, o hábito de ler quadrinhos foi incentivado pela competitiva imprensa norte-americana. Para conquistar um público que muitas vezes mal falava inglês, os jornais investiram nos cartuns e tirinhas.
Motivados pela concorrência e pela liberdade de criação, os desenhistas aprimoraram o visual e a linguagem das HQ’s. Um exemplo seriam os trabalhos de Rudolph Dirks ( Os Sobrinhos do Capitão ), um dos responsáveis pelo desenvolvimento do estilo cartunístico. Também são inestimáveis as contribuições de Winsor McCay e George Herriman. Em Little Nemo , série de páginas dominicais lançada em 1905, McCay utiliza um traço refinado e uma narrativa pormenorizada para dar forma às oníricas aventuras do pequeno Nemo. Na década seguinte, foi a vez de Herriman dar vida à estranha fauna da surrealista tirinha Krazy Kat. Pela qualidade técnica e expressividade estilística de suas obras e por sua própria genialidade inventiva, a influência destes autores ultrapassou os quadrinhos, contribuindo para o desenvolvimento e enriquecimento de outras artes, como o cinema e a animação.
Nas primeiras décadas do século XX, o sucesso das páginas dominicais, tirinhas e suplementos com histórias em quadrinhos motivou os editores e desenhistas a experimentarem novas temáticas (até então predominava o gênero cômico) e investirem em publicações periódicas de grande tiragem, desvinculadas dos jornais e especialmente dedicadas aos quadrinhos (chamadas comic books ). Em 1929, surgiram os quadrinhos de aventura épica com as tiras dos heróis Tarzan e Buck Rogers. Na década seguinte, apareceram duas das mais célebres séries de quadrinhos de aventura, Flash Gordon de Alex Raymond e Príncipe Valente de Harold Foster. Mas foi nas páginas da revista Action Comics que Jerry Seigel e Joe Shuster lançaram o Super-Homem, personagem que inaugurou o gênero “super-herói”. No início da década de 1930, estabeleceu-se a indústria dos comics , cujos produtos foram exportados para todo o mundo, contribuindo para a disseminação da cultura e ideais dominantes na sociedade norte-americana. Na
para citar alguns: Will Eisner ( Spirit ), Jack Kirby ( Thor ), Charles Schulz ( Peanuts ), Hugo Pratt ( Corto Maltese ), Moebius ( Arzach ), Robert Crumb ( Fritz, the cat ), Alberto Breccia ( Mort Cinder ), além dos brasileiros (ainda não devidamente reconhecidos) Henfil ( Fradins ), Flavio Colin ( Anjo ) e Julio Shimamoto ( Os fantasmas do Rincão Maldito ). Ampliando o campo das temáticas, aprimorando as possibilidades narrativas e inovando o visual, esses autores fizeram escola , tornando-se mestres da chamada Arte Seqüencial.
Sua valorização cultural coincidiu com a incrementação da indústria e conteúdo dos quadrinhos. Nos anos 80, enquanto os mangás com a série Akira , de Katsuhiro Otomo, alcançavam tiragens astronômicas e os europeus lançavam luxuosas edições de séries como Os Companheiros do Crepúsculo , de François Burgeon, os norte- americanos criaram as graphic novels. Em publicações que conciliam caráter popular e elaboração gráfico-narrativa, quadrinistas como os norte-americanos Frank Miller ( O Cavaleiro das Trevas ) e Bill Sienkiewcz ( Elektra Assassina ) ou o inglês Alan Moore ( Watchmen ) tiveram espaço e suporte técnico para experimentar novas influências, técnicas e linguagens. Após anos de autoconsumo, os comics se abriram novamente para o mundo.
Mas esse novo boom dos quadrinhos norte-americanos também teve suas conseqüências negativas. Interessadas exclusivamente em seus lucros, as editoras não se preocuparam em manter a qualidade das revistas, valorizando apenas a popularidade dos autores. Infelizmente, fama e talento não andam sempre juntas, como é o caso de Todd McFarlane, o mais famoso desenhista da atualidade, e também um dos quadrinistas mais medíocres que surgiram nos últimos tempos.
A década de 80 também viu a consagração definitiva de um autor brasileiro de quadrinhos para quem os dividendos econômicos parecem importar mais que a qualidade cultural das revistas que levam seu nome. Embora as simplórias e repetitivas HQ’s da Turma da Mônica sejam as campeãs de vendas do mercado brasileiro, o talento nacional continua desconhecido do grande público. As histórias em quadrinhos têm um importante papel na formação do imaginário e cultura internacionais. Assim, já passa da hora de realmente vermos o Brasil nas páginas das HQ’s que chegam às bancas.
Atualmente, o cinema é considerado pela maioria das pessoas como uma forma de arte, mas há um consenso em torno da idéia de que nem todos os filmes produzidos têm valor artístico. Esta afirmação pode ser transferida para as histórias em quadrinhos, cuja linguagem tanto serve à realização de obras de valor cultural e qualidade artística, quanto à produção de meros artigos de consumo rápido. De fato, o que predomina nas bancas de jornais são os quadrinhos comerciais, esta espécie de fast food mental que acaba por estigmatizar toda a produção de HQ’s, impossibilitando que a maioria das pessoas tenha acesso ao que se cria em termos de quadrinho-arte.
Porém, em se tratando dos quadrinhos, não se pode, a priori , atribuir valor negativo à sua condição de integrante da indústria cultural, pois uma HQ só tem função enquanto uma obra feita para ser reproduzida em série. Isso implica no fato dos quadrinhos não deverem ser julgados a partir de critérios de outras formas de arte (como os das artes plásticas, por exemplo); eles devem ser avaliados esteticamente a partir de elementos que são próprios à sua linguagem (assumidamente híbrida) e avaliados culturalmente por sua própria trajetória como meio de comunicação e forma de arte.
A cada dia, os computadores e a Internet estão mais presentes em nosso cotidiano. Os quadrinhos não poderiam passar indiferentes (ou incólumes) pela chamada “revolução cibernética”. A utilização de recursos de computação gráfica na confecção das HQ’s e a chegada dos quadrinhos à Internet vêm trazer novas possibilidades que levam a questionamentos como: existirão histórias em quadrinhos no futuro?
Na última década, começaram a surgir HQ’s cujo visual era inteiramente produzido através de computação. No Brasil, foram lançadas as graphic novels Crash , de Mike Saenz, e Digital Justice , de Pepe Moreno. Dez anos atrás, o surgimento destes trabalhos levou algumas pessoas a pensarem que no futuro os desenhos feitos à mão se tornariam obsoletos e computadores especialmente programados substituiriam os desenhistas. Anunciadas como o futuro dos quadrinhos, as primeiras graphic novels criadas por computador deixaram muito a desejar.
A outra evidência que sugere o desaparecimento dos quadrinhos, como os conhecemos, é o fato de que a Internet fornece mais recursos tecnológicos do que a linguagem dos quadrinhos demanda. Numa HQ, as imagens e o texto possuem função de simulação: a sequência de desenhos produz a ilusão de movimento e os balões e onomatopéias representam o som (mas som e movimento não existem de fato). Já a Internet tem como recursos tanto o áudio quanto a animação de imagens, que se aplicados às histórias em quadrinhos criam uma nova linguagem híbrida, ou simplesmente levarão ao desaparecimento dos quadrinhos.
Em contrapartida, é inegável que os elementos característicos dos quadrinhos (a narrativa visual, os balões e o grafismo sintético) há muito tempo projetaram-se para além do espaço das HQ’s, estando hoje plenamente difundidos. Basta dar uma olhada nos anúncios publicitários, no cinema, tevê e na própria Internet. Enquanto se desenvolvem as possibilidades de veiculação das HQ’s no espaço virtual, a questão de como elas se adaptarão fica em aberto, mas certamente decidirá o papel dos quadrinhos (e até sua própria existência) no próximo século.
Wellington Srbek, Graduado em História pela Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas e mestrando pela Faculdade de Educação da UFMG; editor e roteirista das revistas SOLAR e CALIBAN e editor dos fanzines REPLICANTES, IDEÁRIO e ÁGAPE.
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