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Este texto relata uma experiência na licenciatura em educomunicação da eca/usp, onde a formação ética na infância foi abordada através da análise crítica do filme 'o senhor das moscas'. A seção 2 apresenta a construção narrativa do livro de golding, seguida por uma análise comparada entre as duas versões do filme. O resultado foi o resgate e a ressignificação do conceito de educomunicação. O curso de licenciatura em educomunicação foi oferecido pela eca/usp desde 2011, com um enfoque humanista e crítico, empregando produções midiáticas como objeto e vetor de aprendizagem.
Tipologia: Notas de estudo
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A NARRATIVA MORAL, PIAGET E AS MOSCAS: educomunicadores discutem sobre crianças e ética nas adaptações cinematográficas de “O Senhor das Moscas” de William Golding RESUMO Este texto relata vivências desenvolvidas no curso de Licenciatura em Educomunicação da ECA/USP e que têm por objeto a formação moral da criança. A vivência tratada aqui é a da análise crítica e a construção de conceitos ligada ao desenvolvimento ético na infância a partir da problematização do filme “o Senhor das Moscas”, baseado no romance homônimo do escritor britânico William Golding. A base epistemológica dos debates na disciplina se apoia no modelo de fases do desenvolvimento moral construído pelo psicólogo estadunidense Lawrence Kohlberg (1927-1987) a partir da teoria da Epistemologia Genética de Jean Piaget (1896-1980). A discussão e a produção textual conduzidas em aula assumem vários dos pressupostos da Educomunicação, tais como a dialogicidade e a leitura crítica da mídia, sempre visando assegurar aos educomunicadores uma formação abrangente e aprofundada em temas significativos na interface entre Comunicação e Educação. PALAVRAS CHAVE: Ética, desenvolvimento moral, Construtivismo, Educomunicação, adaptação literária. Introdução Nosso texto está estruturado em cinco seções, sendo a inicial uma breve apresentação do contexto educomunicativo dentro do qual os filmes foram trabalhados. A seção 2 apresenta a construção narrativa do livro de Golding que serviu de base para as adaptações fílmicas detalhada capítulo a capítulo. Na seção 3, procedemos a uma análise comparada entre as duas versões do filme, ressaltando como eles incorporam a ideia básica presente no livro. O contexto pedagógico da vivência aqui relatada é objeto da seção 4, a qual, também, menciona o desenvolvimento da atividade em sala de aula e alguns dos aspectos relevantes no feedback proporcionado pelos alunos. Finalmente, reservamos o espaço da seção 5 para expor algumas considerações.
1. A Educomunicação como princípio Há cerca de três décadas, o radialista argentino Mario Kaplún (1923-1998) publicou uma obra bastante influente: o livro “Una Pedagogia de La Comunicación”, subtitulado como “El Comunicador Popular” (2002). Nele, o autor estabelecia uma agenda democratizante de ações educativas visando, entre outros pressupostos, integrar e aprofundar as ideias de Paulo Freire (1921-1997) — particularmente o combate ao modelo “bancário” na educação — com o apoio decisivo dos recursos e linguagens da comunicação, tais como o rádio, o vídeo, o jornal e outros. Em quatro passagens daquele memorável trabalho, Kaplún menciona o termo “educomunicadores”, sendo que três delas na terceira pessoa do plural isto é, assumindo esta designação. O termo já havia aparecido, de forma um tanto reticente, em documentos da UNESCO no Início dos anos 1980 (SOARES, 2012, 11). Uma década depois, o núcleo de extensão denominado NCE (Núcleo de Comunicação e Educação), sediado na Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP), se propôs a mapear a ocorrência da linha conceitual e
metodológica abordada por Kaplún, tais como a produção midiática participativa, a gestão de ações envolvendo comunicação e educação e a pesquisa acadêmica na interface instituída entre esses dois campos de conhecimento. O resultado foi o resgate e a ressignificação do conceito de “Educomunicação”, como um paradigma de abordagem educativa e comunicativa ou, nas palavras de SOARES (2012): Passou, então, o NCE/USP a ressemantizar o termo Educomunicação para designar o conjunto destas ações que produzem o efeito de articular sujeitos sociais no espaço da interface comunicação/educação. No caso, à leitura crítica da mídia e à produção midiática por jovens soma-se o conceito de estão da comunicação nos espaços educativos. (Soares: 2012, 11) No ano de 2011, o Centro de Comunicação e Artes (CCA) da ECA/USP abriu inscrições para um curso de Licenciatura em Educomunicação, objetivando, justamente, a formação de quadros profissionais para atuar em contextos educativos com base naquele paradigma. A grade curricular do curso é variada, alternando tópicos específicos de fundamentação teórica e com orientações e vivências em atividades de produção midiática colaborativa. Uma das disciplinas constantes no currículo é denominada “Legislação e Ética no Âmbito da Educomunicação” (código CCA0306) e tem como foco (…) o sentido ético do agir humano, garantindo para o estudante o sentido humanista da prática educomunicativa. Nesse sentido, procura elementos teóricos e metodológicos para ressaltar a predominância do caráter sócio- político-cultural da ação do profissional sobre uma possível perspectiva tecnicista de sua intervenção na sociedade. (USP, 2014) O contexto historicamente construído da Educomunicação define, de um lado, a abordagem humanista e crítica que perpassa todo o currículo do curso mencionado e, de outro, o emprego ubíquo e permanente das produções midiáticas como objeto e vetor dos pressupostos deste “novo campo de conhecimento”. Um exemplo desta integração conceito-método pode ser ilustrado, na disciplina CCA0306, pela escolha de determinadas obras audiovisuais como ponto de partida para as discussões necessárias na construção de conhecimentos filosóficos (muitas vezes complexos e abstratos) para fundamentar o posicionamento ético do profissional Educomunicador. Por este motivo, todas as turmas do curso tiveram a oportunidade de conhecer o filme “O Senhor das Moscas”, seja em sua versão original, realizada por Peter Brook em 1963, quanto na sua releitura pelo cineasta Harry Hook, em 1990. As atividades de discussão e produção textual reflexiva tiveram como elementos de destaque a teoria de desenvolvimento moral da criança (BIAGGIO, 2002).
2. O romance de Golding O livro “O Senhor das Moscas” está estruturado em doze capítulos identificados por títulos sintéticos. No primeiro, “A Voz da Concha”, os protagonistas Ralph e Piggy (“Porquinho”, nas traduções em língua portuguesa) se encontram após o acidente aéreo que os levou a um lugar selvagem e desconhecido. A descoberta de uma concha que soa como uma trombeta permite reunir os outros sobreviventes. Dentre eles, Jack, líder do coro, representará o antagonista que se oporá, de forma cada vez mais ferrenha, à razoabilidade lógica e madura representada pela dupla Ralph e Piggy. O segundo capítulo, “Fogo na Montanha”, mostra os meninos descobrindo que estão numa ilha e que o resgate poderá demorar bastante, daí a necessidade de tomarem
“Visão de uma Morte” é um capítulo breve e intenso, que começa descrevendo o constrangimento de Ralph e Piggy por irem até o acampamento dos caçadores e comerem a carne assada. A tentativa de Ralph de retomar a autoridade é frustrada por Jack. Os meninos reencenam a dança da morte, mas a festa é interrompida por uma tempestade, justo no momento em que uma figura indistinta sai do mato gritando. Antes que conseguisse se identificar, Simon é morto impiedosamente pelas lanças dos caçadores. “A Concha e os Óculos”, décimo capítulo do livro de Golding, abre com Jack lamentando e se culpando pela morte de Simon. Piggy ressalta a inutilidade de falar no assunto e os gêmeos, alegam que nada presenciaram. Entrementes, Ralph foi visitar o acampamento de Jack, só para descobrir como ele se tornou o senhor absoluto daquele lado da ilha, ordenando castigos arbitrários e a construção de uma armadilha mortal. Jack espalha o boato de que o monstro é imortal e pode se disfarçar com qualquer aparência e toma a decisão de roubar o fogo do outro acampamento. Após uma batalha confusa e desigual os caçadores levam como troféu de vitória, os óculos do Porquinho. No undécimo e penúltimo capítulo, “Castelo de Pedra”, acontece uma tentativa desesperada do grupo original – agora reduzido a Ralph, Piggy e os dois gêmeos – de dialogar com os caçadores, exigindo que eles devolvessem os óculos roubados e ajudassem a manter a fogueira acesa. Eles são recebidos com grande hostilidade e, enquanto Ralph e Jack se engalfinham num corpo-a-corpo renhido, os gêmeos são capturados. Inesperadamente, Piggy é vítima da armadilha mortal, que lança sobre ele uma rocha esmagadora a qual também destrói o último símbolo de autoridade moral: a Concha. Ralph se vê escorraçado pelo bando de Jack e foge para o “território do monstro”. A distopia de Golding se encerra do capítulo 12, “Gritos de Caçadores”, que apresenta um Ralph acuado que descobre, pelos gêmeos, que Jack quer matá-lo. Logo, a caçada humana força-o a abandonar seu esconderijo, pois os perseguidores ateiam fogo à mata. Exausto e entregue, ele só tem forças para chegar à praia, onde se depara com um oficial da marinha. Quando a situação se esclarece, o oficial declara não entender como “um grupo de meninos ingleses pôde chegar a esse ponto” Ralph, e alguns meninos, caem num pranto inconsolável, enquanto o olhar do oficial se desvia para o mar. Fim.
3. O Senhor da Moscas no Cinema 3.1 O Filme de Brook Peter Stephen Paul Brook nasceu em Londres, em 1925. Sua carreira de encenador inclui montagens de óperas e grandes dramas teatrais, tendo ocupado a direção da Royal Shakespeare Company durante duas décadas. A proximidade com as artes cênicas talvez explique a abordagem naturalista, quase de “teatro filmado” que caracteriza sua interpretação do livro de Golding que realizou em 1963. Uma explicação menos glamorosa e mais pragmática reputa as escolhas estéticas como soluções limitadas pelo baixo orçamento^1 conseguido para a empreitada — sem dúvida, as duas explicações se complementam. Seja como for, o emprego massivo de jovens não-atores no casting , o uso de recursos econômicos como a sucessão de imagens estáticas na abertura do filme e a (^1) Ao que consta, o sucesso comercial do livro não se refletiu no cinema pelo fato de que a violência inerente à história (ainda que modesta para os padrões de hoje) restringia, por motivo de censura, seu público potencial.
filmagem, realizada integralmente em preto e branco, acentuam a crueza do drama ali retratado. Brook também foi econômico nos diálogos: a maioria deles foi transcrita diretamente do livro, o que torna esta primeira adaptação, a mais fiel ao original. Não obstante, algumas passagens marcantes do original são suprimidas, como a conversa imaginária entre o personagem Simon e a cabeça do porco morto (o “Senhor das Moscas”). Por outro lado, cena da morte de Simon é valorizada pelo recurso cinematográfico de justaposição entre os trovões e relâmpagos da tempestade e os golpes violentos desferidos pela turba de meninos descontrolada. As diferenças entre a obra literária e o filme, neste caso, são perfeitamente compreensíveis pela simples diferença entre as duas linguagens – textual e audiovisual – e a idiossincrasia comunicativa de cada uma. Podemos notar que a essência da mensagem antibelicista e distópica de Golding sobrevive à adaptação, oferecendo ainda um aspecto intertextual que pode ser explorado quando lidamos com a Media Literacy (BUCKINGHAM, 2009). Os noventa e dois minutos aos quais a edição final do filme chegou, resultaram da redução de um copião de quatro horas, obtido a partir de um total de 60 horas de material gravado em uma ilha próxima a Porto Rico. 3.2 O Filme de Hook No site Internet Movie Data Basis (IMDB) há uma informação lacônica sobre uma nova produção em desenvolvimento homônima. Eventualmente, esta seria a segunda “atualização” da trama de Golding para a sempre fugaz contemporaneidade. O conceito de releitura contemporânea das obras apresenta um quê de necessidade – visto que a cultura se modifica, assim como a relação do público com os meios de comunicação. Entretanto, esta necessidade desperta certa preocupação quando aspectos importantes ligados à construção lógica e argumentativa da narrativa original (AUMONT & MARIE,
Existem atividades, comuns em cursos de comunicação e afins, que correspondem à elaboração de resenhas críticas de filmes e livros, orientadas no sentido de relacionar a narrativa analisada com os temas que s estudam àquela altura do curso. Este exercício básico introduz, muitas vezes, o hábito e o método de “ler” os filmes como textos audiovisuais que, em verdade, eles são. Dentre as leituras possíveis que o filme suscita no âmbito do desenvolvimento moral da criança, o ponto de partida, usualmente, é sugerir que os alunos relacionem os estádios com um ou outro personagem do filme, justificando seu parecer mediante um exercício de argumentação textual. Invariavelmente, os alunos encontram exemplos de praticamente todos os estádios dos Níveis 1 e 2 e, inclusive, atitudes ambíguas ou mudanças de estádio de um mesmo personagem ao longo do filme. Quando a tarefa envolve a elaboração de um plano de aula que porventura utilizasse cenas do filme, surgem as questões relacionadas com a classificação indicativa que incorreria sobre o mesmo, além da questão “Como apresentar, numa aula, esta situação de crianças praticando barbáries?” A ética do grupo contraposta à ética social, também aparece nas discussões, dialogando com textos clássicos trabalhados previamente, tais como “O Anel de Giges”, de Platão, e “O Caso dos Exploradores de Caverna”, de Lon L. Fuller. Em suma: a atividade aqui relatada atende ao triplo propósito de aprofundar o domínio dos educomunicadores sobre os conceitos da ética, as teorias pedagógicas e a leitura crítica da mídia. Alinhavando o conjunto de saberes que consideramos indispensáveis para o educomunicador egresso do curso de Licenciatura ministrado no CCA-ECA/USP.
5. Considerações Finais Nosso contexto está vinculado ao campo da Educomunicação ou, mais especificamente, à formação de educomunicadores que é promovida no curso de Licenciatura oferecido pela Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP). Poderíamos descrever nossa abordagem como “metaformativa”, uma vez que tanto o objeto de estudo – a correlação entre ética e infância – quanto à metodologia na abordagem – análise crítica de mídia audiovisual – remetem às prerrogativas do educomunicador. Além desta preocupação mais imediata com os conteúdos e habilidades exigidos para integralizar a formação do educomunicador, consideramos que o resgate de obras literárias e audiovisuais culturalmente importantes, pode ser um diferencial significativo para os jovens profissionais que convivem com um imenso volume de informações, nem sempre originais ou pertinentes, mas sempre propícias à instauração de um debate. Talvez, mais que tudo, o exercício do diálogo e da argumentação acalorada de temas fortes — como aqueles suscitados pela obra de Golding, ajude a formar o senso crítico do educomunicador. Assim, pensamos garantindo que, além do âmbito dos conteúdos e das competências técnicas, esse futuro profissional também possa desenvolver aquela dimensão atitudinal que é a razão de ser do estudo da moral e da ética, em qualquer contexto.
Referências Bibliográficas, Eletrônicas e Filmográficas LIVROS AUMONT, Jacques e MARIE, Michel. A análise do filme. Lisboa: Editora Texto e Grafia, 2004. BIAGGIO, A. M. B. Lawrence Kohlberg: ética e educação moral. São Paulo, Moderna,
BUCKINGHAM, David. The Future of Media Literacy in the Digital Age: Some Challenges for Policy and Practice. Texto apresentado na European Conference on Media Literacy, Bellaria, Italy, 2009. Disponível para download em http://www.childrenyouthandmedia.org, acessado em 20/08/2014. GOLDING, William. O Senhor das Moscas. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 2006. KAPLUN, Mario. Una Pedagogia de La Comunicación (El Comunicador Popular ). La Habana, Editorial Caminos, 2002. SOARES, Ismar de Oliveira. Educomunicação: o conceito, o profissional, a aplicação. São Paulo, Paulinas, 2012. SITES WILLIAM GOLDING LIMITED. http://www.william-golding.co.uk/ (___________)http://explorewilliamgolding.com/lord-of-the-flies-on-film/ Internet Movie Data Basis. http://www.imdb.com USPDIGITAL.https://uspdigital.usp.br/jupiterweb/obterDisciplina?sgldis=CCA0306&c odcur=27570&codhab= FILMES
- O Senhor das Moscas (1963) "Lord of the Flies" – 92 min, P&B, UK (Fra-USA). Direção e roteiro de Peter Brook. - O Senhor das Moscas (1990) "Lord of the Flies" - 90 min, Cor, USA. Direção de Harry Hook e roteiro de Jay Presson Allen. MINI CURRÍCULO: Marciel A. Consani