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PALAVRAS-CHAVE: Intertextualidade. Música. Ditadura militar. Page 5. [Digite texto]. RESUMEN. Este ...
Tipologia: Notas de estudo
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ABAETETUBA-PA FEVEREIRO /
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Faculdade de Ciências da Linguagem, vinculada à Universidade Federal do Pará - Campus Universitário de Abaetetuba/ Baixo Tocantins, como requisito para obtenção do título de Licenciada em Letras-Língua Portuguesa. Sob orientação da Prof.ª Dra Rosângela do Socorro Nogueira de Sousa.
ABAETETUBA-PA FEVEREIRO/
Este trabalho propõe uma análise da letra das músicas “perseguição (mais fortes são os poderes do povo)” de Glauber Ricardo, “enquanto seu lobo não vem” de Caetano Veloso e “Cálice”, escrita por Chico Buarque e Gilberto Gil; músicas de protesto do período ditatorial militar do Brasil, o qual ocorreu entre os anos de 1964 até 1985. Examinar as ocorrências da intertextualidade presentes nas canções, assim como, mostrar a grandeza e o valor deste fenômeno tanto no âmbito textual, quanto na esfera histórica-social. Para tanto, foram utilizados os pressupostos de Koch, Bentes e Cavalcante (2007) e Koch (1997) para delimitar a fundamentação teórica, os tipos das ocorrências e como elas se comportam no texto; A exploração histórica está baseada em Codato (2005) e Ferrari, Pereira (2009), os quais possibilitaram um alicerce histórico necessário para o entendimento do contexto. A partir do contexto histórico, o corpus do trabalho se deu e a escolha das músicas se concretizou. A escalação destas três músicas ocorreu em deferência de serem consideradas significativas em meio ao período tratado. Por meio das análises, pode-se concluir que as vozes expressas pela intertextualidade marcam uma nova leitura do objeto de estudo e proporcionam um rico e novo repertório de interpretações, ideias, sentimentos e conceitos através dos intertextos empregados, o que nos propicia a readquirir conceitos e lembranças anteriores e enriquece em todo o tempo a história e a cultura popular brasileira. PALAVRAS-CHAVE: Intertextualidade. Música. Ditadura militar.
Este trabajo propone un análisis de la letra de las canciones “Persecución (más fuerte son los poderes del pueblo)” de Glauber Ricardo, “Mientras su lobo no viene” de Caetano Veloso y “Cáliz” escribida por Chico Buarque y Gilberto Gil; canciones de protesta del período dictatorial militar en Brasil, lo cual ocurrió entre los años 1964 hasta 1985. Examinar las ocurrencias de la intertextualidad presentes en las canciones, así como, muestrar la grandeza y el valor de este fenómeno tanto en el ámbito textual, cuanto en la esfera histórica-social. Por lo tanto, fueran utilizados los presupuestos de Koch, Bentes y Cavalcante (2007) y Koch (1997) para delimitar la fundamentación teórica, los tipos de las ocurrencias y como ellas se comportan en el texto; la exploración histórica está basada en Condato (2005) y Ferrari, Pereira (2019), los cuales posibilitan el basamento histórico necesario para el entendimiento del contexto. La escalación de estas tres canciones ocurrió en consideración de su significado en medio al período tratado. Por medio del análisis, se puede concluir que las voces expresas por la intertextualidad marcan una nueva lectura del objeto de estudio y proporcionan un rico y nuevo repertorio de interpretaciones, ideas, sentimientos y conceptos a través de los intertextos empleados, lo que nos propicia a readquirir conceptos y recordaciones anteriores y enriquecer en todo el tempo la historia y la cultura popular brasileña. PALABRAS-CLAVES: Intertextualidad; Canción; Dictadura militar.
No momento em que dois textos passam a ter uma relação direta e dialogar entre si, tem-se a intertextualidade. Este fenômeno unido à origem de novos textos e seus contextos pode ocorrer em vários tipos de gêneros, entretanto, neste trabalho será tratado da intertextualidade e suas ocorrências nas músicas de protesto no período ditatorial do Brasil, o qual significou uma notável etapa da história deste país, onde a MPB como gênero, que será explicitado em posterior, serviu como instrumento de engajamento social e de resistência. Ao longo deste trabalho será explanado o percurso da intertextualidade com base, inicialmente, nas considerações de Koch (1997) e Koch, Bentes e Cavalcante (2007), inspirados nos pressupostos de Júlia Kristeva que nos anos 60, estabeleceu o conceito de intertexto onde diz que todo texto dispõe de um intertexto. Inicialmente, tratou-se a intertextualidade em duas formas, em sentido amplo e em sentido restrito e subdividindo-se em: Temática, estilística, explícita e implícita, entre outras. Bem como, por meio de Negri (2017) tratou-se de mostrar os exemplos de intertextualidade e como eles são identificados nos textos. Outra vertente tratada neste projeto está no viés histórico, baseado em Condato (2005) para explicitar e explorar esta etapa da história do Brasil situada entre os anos de 1964 a 1989, da mesma maneira que, Ferrari, Pereira (2009) foi usado para delimitar entender qual o ambiente musical da época e como se constituiu este cenário de prestígio conhecido internacionalmente, através da “era dos festivais”. Por conseguinte, na análise do corpus , três músicas foram escolhidas pela sua representatividade, as três, se situam em datas de origem diferentes, contudo, possuem o mesmo contexto e finalidade. Assim, tornou-se possível identificar como a intertextualidade pode ser usada como ferramenta de argumentação, crítica e resistência em termos obscuros. O principal intuito desta pesquisa está em mostrar e destacar a intertextualidade como um importante artificio usado pelos artistas para burlar a censura do período e que através dela se tornou possível “dar voz” as suas almas e consequentemente nos proporcionar obras extraordinárias, com extensa riqueza de detalhes, as quais descrevem seus sentimentos, angústias, aflições e desejos. Logo, em busca de encontrar intertextos que fundamentam tais teorias as análises se estruturaram, desse ponto se dá a importância de se investigar e analisar tal fenômeno nestas canções, na conjuntura política atual, tais estratégias encobertas devem ser nítidas e mostradas à sociedade, principalmente, em virtude dos tempos políticos turbulentos onde as conquistas alcançadas desde o fim do período ditatorial militar até nos dias atuais, estão ameaçadas.
As tipologias de Gérard Genette, em Palimpsestes (1982) que inspiraram Koch, Bentes e Cavalcante (1997 e 2004) foram os pressupostos utilizados para apontar, neste trabalho, de que forma a intertextualidade se abrange por meio de suas tipologias, as quais serão usadas para, posteriormente, subsidiar as análises do corpus. É importante ressaltar o conceito de Genette (1982), ao classificar os diálogos como uma relação de transtextualidade, a qual seria toda a relação entre um texto e outro que extrapole a unidade textual, isto é, na realização no entrelace de textos e na relação que eles estabelecem.
2.1 Intertextualidade: A origem do termo
Diversas vezes o termo intertexto foi atribuído a Mikhail Bakhtin, por conta de seus estudos apresentarem o significado da terminação, como no livro “dialogismo e polifonia”, onde o autor declara:
(...) Até que ponto a palavra pura, sem objeto, unívoca, é possível na literatura? Uma palavra na qual o autor não ouvisse a voz do outro, na qual houvesse somente ele, e ele por inteiro – tal palavra pode tornar-se material de construção de uma obra literária? (...) O escritor (mesmo no lirismo puro) não é sempre um “dramaturgo”, no sentido de que redistribui todas as palavras entre as vozes dos outros, incluindo-se nelas a imagem do autor (assim como as outras máscaras do autor) (BAKHTIN, 1992: 337 apud SOUZA,[20-?], p 121.).
Entretanto somente em 1960 com Julia Krisvera, crítica literária francesa, o termo Intertexto foi oficializado, quando, então, a mesma se inspirou nos escritos de Bakhtin ao alegar, em suma, que, para um texto ser produzido, é necessário que ele seja baseado em outros textos. Logo, todos os textos já produzidos se encontram interligados. Assim, a definição mais conhecida e aceita de intertexto é a de Kristeva, a qual diz que: “(...) todo texto se constrói como mosaico de citações, todo texto é absorção e transformação de um outro texto (...)” (2005: 68). Posteriormente, Bakhtin (1986 apud Koch, Bentes e Cavalcante, 2007) declara seu posicionamento ao concluir e concordar com a afirmativa de Kristeva, de que os textos se interligam, assim como influenciam um ao outro quando são produzidos. Logo, são criados “diálogos” entre os textos. Assim, através dos textos “diálogos possíveis” (Koch, Bentes e Cavalcante, 2007) e “O texto e a construção dos sentidos” (Koch 1997), serão delimitados os tipos de intertextualidade que trataremos nas análises deste trabalho.
o mesmo conteúdo, como é o caso das paródias, imitação de vocabulários, idioletos, entre outros. A intergenérica corresponde à relação entre gêneros, isto é, quando um gênero se sobrepõe ao outro no seu sentido de origem, isto é, um gênero toma para si a função do outro na produção de um novo sentido e estilo, diferente do original, como é o caso das tirinhas humorísticas em jornais. A intertextualidade explícita e implícita ; a primeira condiz à citação, já as implícitas são o plágio e alusão. Na intertextualidade explícita, tem-se a citação, a qual, no momento em que o autor é mencionado no texto alheio, juntamente com seu texto há marcações, sinalização ou qualquer outro tipo de recurso que atribua a ele o valor devido. A intertextualidade explícita ocorre em três casos: Intertexto alheiro, sua formação acontece através da “voz” do autor, citado ou não, no enunciado sendo esta introduzida, ou não, por mecanismos ou expressões de fala; intertexto próprio quando a intertextualidade se dá por meio de retomadas de algumas referências ou segmentos de texto de própria autoria do autor citados no seu próprio texto; enunciador genérico são as falas introduzidas em um texto, onde há um enunciador indeterminado que possui vozes anteriores ilimitadas as quais são usadas na construção de tal discurso, isto é, não podem ser atribuídas a um único e específico enunciador; é o caso dos provérbios e ditos populares, por exemplo. Na intertextualidade implícita, a fonte não é citada, entretanto, o receptor é capaz de deduzir ou recuperar mentalmente que a ideia passada foi usada na construção do referido discurso, como é o caso das paródias, ironias e se dá no ato do autor ser citado tacitamente no texto, sem referências ou qualquer mecanismo que possam atribuir valor ao verdadeiro autor do enunciado. A intertextualidade das semelhanças e das diferenças. A primeira ocorre quando o intertexto é usado como base de referência de orientação argumentativa; a segunda acontece no ato de um texto se agrupar a outro, tomando sua forma a fim de julgar o valor do texto, menosprezando-o. Ocorre na fusão do texto com o intertexto usado para, segundo Koch, seguir-lhe a orientação argumentativa e, frequentemente, para apoiar-se nele a argumentação. Esta fusão pode ser conferida para ridicularizar ou até mesmo para atribuir notoriedade em determinado texto. É o que Maingueneau (1987) denomina de “valor de subversão”.
2.3 Os exemplos e classificações da intertextualidade
No trato das tipologias, têm-se os exemplos e classificações da intertextualidade segundo Negri (2017): Alusão : No ato de comparar este exemplo é usado para fazer referência implícita ou explícita e se diferencia da comparação por estar vinculado ao diretamente ao contexto. Citação : Ato de reproduzir um dito no seu discurso e dar nome do verdadeiro autor do enunciado. Dentre esta, temos a Ipsis litleris , citar com as mesmas palavras e a citação livre, também chamada de paráfrase, quando há a apropriação da fala do outro, no entanto, se indica a origem da ideia usada. Epígrafe : Fragmento de um texto ou um excerto posto no início do enunciado para dar exemplo ou reflexão ao texto apresentado. Metáfrase e Paráfrase : A primeira concerne no ato de traduzir literalmente palavra por palavra de um texto, sem o cuidado na alteração de sentido. A segunda trata-se da tradução do texto, entretanto, ocorre a atenção de mudança no sentido, isto é, não ocorre a tradução literal das palavras. Paródia : Com o intuito de ridicularizar ou enaltecer um discurso, o mesmo é recriado com um novo sentido. Pastiche : Imitação explícita de outros autores diferencia-se da paródia por não ter a intenção de ridicularizar o discurso original. Plágio : Apropriação da expressão do outro, usada como se fosse de autoria própria. Tradução : Quando ocorre a transposição de um enunciado em uma língua para outra, de forma que ambas sejam do conhecimento do tradutor. Versão : Ocorre no momento em que um texto é usado para dar suporte a um novo enunciado. Bricolagem : Comumente utilizado nas artes plásticas, no entanto, aparece também na literatura. Incide na colagem literal de outros enunciados para ser criado um original. Sample : Possui as mesmas características da bricolagem, porém, aparece com mais frequência nas músicas, quando um autor se apropria de um trecho da música de outro para ser usado em sua nova canção sem referenciar o autor original.
3 A DITADURA MILITAR NO BRASIL
Com base em Codato (2005) será elaborada uma breve retomada histórica do Brasil. O regime militar ditatorial se manteve entre os anos de 1964 até 1989, isto é, 25 anos e
se início a grandes passeatas pelas ruas de todo o país. Estas sempre marcadas por muita violência, repressão, morte e prisões. Além dos transtornos nas cidades, nos campos, lutas armadas eram cada vez mais comuns e verdadeiras guerras rurais ficaram cada vez mais frequentes. Em 1968, Costa e Silva editou o AI-5 e decretou recesso ao congresso nacional além de atribuir plenos direitos ao executivo na cassação de seus mandatos e direitos políticos, negando o direito a habeas corpus e prerrogativas políticas. Em 1969, Médici tomou posse e com ele o “milagre econômico” trouxe entusiasmo aos brasileiros, por meio de propagandas acompanhadas do lema “Brasil: ame-o ou deixe-o” tentavam calar as vozes da oposição e manipular a real situação de massacre que o povo sofria nas ruas diariamente, assim como mascarava a grande dívida econômica para os posteriores governos. Os “anos de chumbo” deixaram um ferimento muito profundo na história do Brasil, um saldo de mortes forçadas, corpos que nunca foram encontrados, desaparecimentos mal explicados. Segundo a Comissão Nacional da Verdade (CNV), foi levantada uma lista com mais de 400 nomes de pessoas vítimas deste período, entretanto, sabe-se que o número pode ser muito maior. Afinal, diversos estudantes, intelectuais, artistas, políticos, jornalistas, militantes, professores entre outros, foram levados pelo Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), como ameaça a nação e por serem acusados de propagarem o comunismo no Brasil e desapareceram e seus familiares, até os dias atuais, não possuem notícia alguma de seus destinos. Uma grande mancha de sangue na história deste país, a qual jamais será esquecida. Em 1967, Emílio Garrastazu Médici foi indicado à presidência da república e o apogeu do regime militar foi a marca de seu governo, onde se intensificaram os protestos e a resistência foi acentuada, assim como a repressão e a censura, principalmente dos meios de comunicação; prisões políticas, desaparecimentos, mortes, tortura, tornaram-se cada vez mais corriqueiras, pois era crescente o número de simpatizantes do governo comunista. Assim, algumas operações, como a Operação dos Bandeirantes (Oban) foram expandidas para departamentos, a fim de desenfrear e banir tais ideais. O Comando de Operações e Informações (DOIs) e o Comando de Operações de Defesa interna (CODI) e outros órgãos do governo foram criados a partir de operações repressivas centradas em São Paulo, com a finalidade de reprimir o comunismo no Brasil. No ano de 1974, Médici deixou o poder e foi substituído por Ernesto Geisel, que, surpreendentemente, começou um gradual processo de mudança para a democracia. Seu governo é marcado pela crise gerada pelo “milagre econômico” e pela população insatisfeita.
Contudo, os militares tradicionais não apoiavam as decisões de Geisel e causavam ataques de forma clandestina a alguns esquerdistas, como a morte do jornalista Vladimir Herzog no DOI- Codi em São Paulo. Em 1975, e, no ano posterior, o assassinato do operário Manuel Fiel Filho, morto com as mesmas características do jornalista. Geisel, em 1975, acaba com o AI- e abre espaço novamente para a democracia no Brasil. Apesar disso, as eleições para presidente ainda eram feitas pelo colégio eleitoral. Logo, o ano de 1978, com o general João Baptista Figueiredo, último presidente do governo ditatorial, foi marcado pela redemocratização do país, iniciada no governo anterior. A lei da anistia foi decretada, diversos presos políticos exilados retornaram ao Brasil, no entanto, operações de repressão clandestinas ainda eram desenvolvidas. Em 1979, o pluripartidarismo foi reestabelecido e este ato possibilitou que os partidos políticos voltassem a funcionar em sua normalidade, mas a crise econômica gerava revolta nas ruas e movimentos como as “Diretas Já” em 1984 ganhavam força nas ruas e pediam eleições diretas para presidente. Todavia, o colégio eleitoral elege o deputado Tancredo Neves como novo presidente da República e marca o fim da ditadura militar no Brasil, porém, antes do mesmo assumir o cargo, acaba sofrendo de uma grave doença e falece, seu vice José Sarney assume e aprova em 1988 uma nova constituição para o país instituindo novos princípios de democracia no Brasil.
3.2 A Música Popular Brasileira em tempos de censura
Com o regime ditatorial militar imposto em 1964, se instaurou no Brasil um novo governo, marcado por perseguições políticas, tortura, exílio e mortes, embasadas no argumento de redemocratizar o país. Diante disso, segundo reportagens da época apontaram que diversos músicos, artistas plásticos, universitários, jornalistas, dentre outros, cada um em sua área de atuação usavam seu melhor para resistir e contribuir com sua luta, desde o questionamento a levar para a população informação e engajamento, como foi o caso das músicas de protesto que mesmo em meio a censura conseguiu romper com os paradigmas impostos. A este respeito, deve-se destacar o empenho dos cantores e compositores de MPB que nesta época da história do Brasil, usavam de suas canções para descrever e denunciar a repressão e a censura sofridas pelo Departamento de Ordem Política e Social (DOPS). É importante ressaltar a diferença de Música Popular Brasileira e MPB, a primeira, se refere a uma esfera maior, de todas as produções musicais geradas no Brasil, de estilos e gêneros
comum o desejo por mudança e dialogam com diversos gêneros textuais como na análise será vista a relação de uma música de protesto com um conto de fadas. A primeira, “Perseguição” foi composta por Sérgio Ricardo no ano do golpe civil militar em 1964 e faz parte da trilha sonora do filme “Deus e o diabo na terra do sol”, o último verso, um grito do personagem Corisco, “mais fortes são os poderes do povo”, consagrou e perpetuou esta música onde é citada. A próxima, “Enquanto seu lobo não vem”, composta por Caetano Veloso enquanto fazia parte do grupo “tropicália” o qual surgiu no ano de 1968 que se difundiu pelas diversas esferas artísticas, como o teatro e a dança além da musical. A última é conhecida como o “hino da anistia” e retrata o final do período ditatorial, quando o povo já estava cansado de sofrer. As três se destacam entre todas pela força e proporção que possuem, mesmo com o passar dos anos, pois mostram a coragem e sentimento que jamais serão esquecidos. Em todas elas, os diversos tipos de intertextualidade se apresentam e são recorrentes como ferramentas de expressão, o que nos mostra o grande valor destas músicas, tanto textual, quanto histórico e humano.
5 ANÁLISE DE DADOS
Dentre o vasto acervo de composições musicais escritas no período ditatorial brasileiro, três canções merecem o devido destaque por apresentarem o devido conceito que este trabalho aborda, o estudo da intertextualidade nas músicas de protesto, o qual, por conseguinte será exposto ao longo das análises.
5.1- Perseguição (Mais fortes são os poderes do povo)
No ano de 1964, Glauber Rocha lançou o filme “Deus e o diabo na terra do sol”. O filme se passa no sertão nordestino e retrata a injustiça e desigualdade social, miséria, violência e diversas problemáticas vivenciadas pelos sertanejos, denotou o “cinema novo” ou “cinema do povo”, um novo estilo de produzir cinema no Brasil, com um tom mais realista e de fuga dos padrões americanos, marca o início da ditadura militar. Dentre a trilha sonora do filme, uma música ganhou notoriedade pelo contexto histórico vivenciado no período, como se pode ver a seguir: Se entrega, Corisco!
- Eu não me entrego, não!
Eu não sou passarinho Pra viver lá na prisão
_- Se entrega, Corisco!
Em relação direta com o filme, nesta música encontramos intertextualidade stricto sensu temática^1 , afinal, a canção dialoga diretamente com o filme. Consiste no mesmo conteúdo de abordagem, isto é, a música mesmo que isolada complementa a ideia passada pelo filme e ainda que o receptor não possua o conhecimento prévio a cerca da produção, se conhecer o meio sertanejo, é capaz de perceber que o enredo traz a referência de Corisco, popular cangaceiro da época, o qual é um personagem retratado no filme e esta música complementa uma de suas falas e se faz presente na sua trilha sonora. Em associação e resistência ao período político do Brasil, tanto a canção como o filme abordam características opostas ao governo, bem como do cenário escolhido, os personagens, sendo um deles cangaceiro, inimigo direto dos militares, a miséria da população opondo-se a imagem idealizada que o governo insistia em mostrar um país economicamente desenvolvido. Estes são alguns dos atributos totalmente opostos aos paradigmas do governo, mostrados na música e no filme, assim, todos os que simpatizavam com os mesmos ideais eram considerados subversivos. Caso este conhecimento prévio não esteja ao alcance do ouvinte, depreende-se que leigos possam compreender e associar o conceito original ao que a composição quer transmitir, partindo do entendimento de tal sujeito em perseguição e resistência aos moldes militares.
(^1) Segundo Borges (2009) a intertextualidade estilística é a forma e a maneira que um autor aborda determinado conteúdo com intenção de repetir, imitar ou parodiar estilos.
No próprio título da canção “Enquanto seu lobo não vem” é possível encontrar a referência que Caetano usou para escrever esta canção; a fábula da “Chapeuzinho Vermelho” o qual, o autor da canção usou de um trecho de uma cantiga infantil popular baseada na narrativa. Vamos passear pelo bosque Enquanto seu lobo não vem
Na canção, Caetano escreveu:
Vamos passear na floresta escondida, meu amor Vamos passear na avenida Vamos passear nas veredas, no alto meu amor (...) Vamos passear nos Estados Unidos do Brasil Vamos passear escondidos
Na narrativa, uma garota intitulada como “Chapeuzinho Vermelho” é designada por sua mãe a levar uma cesta com mantimentos a sua avó que morava do outro lado da floresta e no meio do caminho encontrou com o “lobo mau” que em meio aos dilemas da história, alcança a casa de sua avó a devora e posteriormente “chapeuzinho” também, contudo, no final da narrativa são salvas por um lenhador e tudo termina bem. Além do conto de fadas expresso no título da canção, desde os primeiros versos, nos remete a ideia de resistência, pois, no verso “ Vamos passear na avenida ” nos leva a associação das passeatas e manifestações de rua contra o governo, além disso, a referência instrumental desta canção tem um papel importante na crítica repassada, quando Caetano compôs “ (Os clarins da banda militar…) ”, denota-se que o cantor fez alusão não só a banda militar, nisto se dá a crítica ao regime mais explícita, contudo, a música “Dora” de Dorival Caymmi, composta no ano de 1941:
Dora, rainha do frevo e do maracatu Dora, rainha cafuza de um maracatu Te conheci no Recife Dos rios cortados de pontes
Dos bairros, das fontes coloniais Dora, chamei Ò Dora!.. .Ò Dora! Eu vim à cidade Pra ver você passar Ò Dora ... Agora no meu pensamento eu te vejo requebrando Pra cá,ora prá lá Meu bem! .... Os clarins da banda militar, tocam para anunciar Sua Dora, agora vai passar. Venham ver o que é bom Ò Dora, rainha do frevo e do maracatu Ninguém requebra, nem dança, melhor que tu!
Na canção de Caetano, a melodia, assim como na de Caymmi, são fundamentais para se entender as referências. No entanto, na primeira os “clarins” remetem a exaltação, saudação; oposto do contexto que a última quer repassar, assim como a ideia do “lobo” no conto de fadas, mostrar um cenário de coibição, aliado a um tom irônico de Caetano como Larson (2004) aponta:
Acredito ser mais coerente pensar que Caetano Veloso vale-se do aspecto irônico e carnavalesco presente no verso de Caymmi para enriquecer as possibilidades ambíguas de sua composição, portanto não há uma atitude parodística quanto à utilização do intertexto, mas a intenção de reproduzir a ironia no contexto trágico de “Enquanto seu Lobo não vem”. Quero dizer, se o ouvinte não ativar o texto-fonte em sua memória, o verso torna-se vazio de ironia, colaborando para caracterizar o clima de repressão, se há a ativação do texto-fonte, o verso ganha um sentido irônico. Não por contradizer o verso original, mas por dar continuidade ao seu aspecto irônico e carnavalesco. (LARSON, 2004. p 6).
Diante do exposto é possível encontrar intertextualidade stricto sensu implícita^2 , pois, o autor citou a narrativa na sua canção, entretanto, deduz-se que o receptor possui algum conhecimento prévio da história, a qual faz parte da cultura popular mundial assim, se possibilita a associação e relação entre os textos.
(^2) Borges (2009) explica que na intertextualidade implícita é preciso haver por parte do leitor/ouvinte o reconhecimento da presença do intertexto através de sua memória para que o texto tenha sentido.