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Evolução do IASC e IASB: História e Impacto, Notas de aula de Contabilidade

Este artigo apresenta uma revisão dos principais desenvolvimentos e marcos na evolução do international accounting standards committee (iasc) e do international accounting standards board (iasb). O documento discute o papel do iasc na harmonização internacional de normas contábeis, a motivação de seus fundadores e o impacto das suas normas na contabilidade global. O texto também aborda a relação do iasc com organizações como o iosco e as autoridades reguladoras de diferentes países.

O que você vai aprender

  • Quais foram as primeiras normas emitidas pelo IASC e o impacto delas na contabilidade global?
  • Como o IASC promoveu a harmonização internacional de normas contábeis?
  • Como as normas do IASC foram recebidas e adotadas por diferentes países?
  • Qual foi o papel do IOSCO na evolução do IASC e do IASB?

Tipologia: Notas de aula

2022

Compartilhado em 07/11/2022

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R. Cont. Fin. – USP, São Paulo, v. 25, Edição "História da Contabilidade", p. 300-320, set./out./nov./dez. 2014
300
A Evolução do IASC para o IASB e os Desafios Enfrentados
Stephen A. Zeff
Rice University
Publicado no The Accounting Review em janeiro de 2012
RESUMO
Este artigo apresenta uma revisão dos principais desenvolvimentos e marcos na evolução do International Accounting Standards Com-
mittee (IASC), seguida pela evolução do International Accounting Standards Board (IASB). Na conclusão, são sugeridos cinco desafios
enfrentados pelo IASB.
Palavras-chave: IASC. IASB. IAS. IFRS. Normalização. Regulamentação.
ISSN 1808-057X
10.1590/1808-057x201400040
Este artigo foi elaborado com base no meu discurso como Presidential Scholar na Reunião Anual da American Accounting Association (AAA), proferido em 10 de agosto de 2011,
em Denver, Colorado, EUA. Agradeço os comentários às versões preliminares de Kees Camfferman, Jim Leisenring, Harry Evans, Paul Pacter e Kay Stice. Sou o único responsável
pela versão atual.
Nota do Editor: Este comentário, elaborado com base em uma palestra proferida na Reunião Anual da American Accounting Association de 2011 em Denver, Colorado, EUA,
foi submetido a convite do Editor Sênior Johan Harry Evans III, em conformidade com a meta do Comitê Executivo da AAA de promover a ampla disseminação da Palestra do
Presidential Scholar da AAA.
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A Evolução do IASC para o IASB e os Desafios Enfrentados

Stephen A. Zeff Rice University Publicado no The Accounting Review em janeiro de 2012

RESUMO

Este artigo apresenta uma revisão dos principais desenvolvimentos e marcos na evolução do International Accounting Standards Com- mittee (IASC), seguida pela evolução do International Accounting Standards Board (IASB). Na conclusão, são sugeridos cinco desafios enfrentados pelo IASB. Palavras-chave: IASC. IASB. IAS. IFRS. Normalização. Regulamentação. ISSN 1808-057X 10.1590/1808-057x Este artigo foi elaborado com base no meu discurso como Presidential Scholar na Reunião Anual da American Accounting Association (AAA), proferido em 10 de agosto de 2011, em Denver, Colorado, EUA. Agradeço os comentários às versões preliminares de Kees Camfferman, Jim Leisenring, Harry Evans, Paul Pacter e Kay Stice. Sou o único responsável pela versão atual. Nota do Editor: Este comentário, elaborado com base em uma palestra proferida na Reunião Anual da American Accounting Association de 2011 em Denver, Colorado, EUA, foi submetido a convite do Editor Sênior Johan Harry Evans III, em conformidade com a meta do Comitê Executivo da AAA de promover a ampla disseminação da Palestra do Presidential Scholar da AAA.

A Evolução do IASC para o IASB e os Desafios Enfrentados

1 INTRODUÇÃO

A evolução do IASC e IASB é a história de um órgão de normalização contábil internacional do setor privado que conseguiu ganhar respeito e apoio, inicialmente das entidades contábeis nacionais, seguidas pelos órgãos de normalização nacionais e, finalmente, pelos reguladores dos principais mercados de capitais e dos ministérios go- vernamentais, além dos preparadores e usuários de de- monstrações contábeis ao redor do mundo. Parte de seu sucesso deve-se ao timing: era o único órgão competen- te de normalização contábil internacional no final dos anos 1990, quando a União Europeia (UE) se debruçava sobre a criação do mercado de capitais interno e a Co- missão Europeia estava em busca de uma alternativa aos Princípios Contábeis Geralmente Aceitos dos EUA (US GAAP) como fonte de normas contábeis exigidas para as empresas negociadas em bolsa naquele mercado. A pro- posta-surpresa da Comissão Europeia, emitida em 2000 para engajar as empresas negociadas em bolsa da UE na adoção das Normas Contábeis Internacionais até 2005, chamou a atenção mundial e outros países começaram a considerar seriamente o IASC como órgão global de nor- malização contábil. Com essa aceitação de suas normas, o IASB (como o IASC passou a ser conhecido a partir de

  1. iniciou um jogo de elevadas apostas no qual as em- presas e os governos participaram como players proativos e os reguladores ocuparam um lugar na mesa. Nos últimos anos, a maioria dos estudiosos na área da contabilidade tem acompanhado de perto o International Accounting Standards Board (IASB) e a produção de suas Normas Internacionais de Relatórios Financeiros (IFRS). Em sua curta existência, desde 2001, o IASB redesenhou substancialmente o mapa mundial das informações finan- ceiras empresariais. Entretanto, foi o International Accoun- ting Standards Committee (IASC), durante seus 27 anos, de 1973 a 2000, que serviu de palco para o IASB, que, por sua vez, nasceu do IASC^1. Mostra-se oportuno esboçar uma perspectiva histórica que possa lançar luz sobre o IASB de hoje. Neste artigo serão enfocados os principais desenvol- vimentos e marcos nesses 37 anos da sua evolução, sugerin- do alguns dos desafios que o IASB enfrenta hoje. A história contada neste artigo baseia-se em pesquisas históricas. Tal investigação raramente produz explicações simples e claras das causas e efeitos e dos motivos para eventos e desenvolvimentos. Apesar disso, procurei utilizar os frutos desta pesquisa para explicar a evolução em forma de história, porém, com apartes e eventuais qualificações e digressões para revelar mais que duas dimensões. Darei maior destaque aos primeiros que aos últimos anos, não somente porque é mais difícil obter uma perspectiva histó- rica de eventos e desenvolvimentos muitos recentes, mas, também, porque o IASB recebeu muito mais atenção de um público mais amplo nos últimos anos. (^1) A maioria dos fatos apresentados neste artigo que fundamentam a discussão do período do IASC, de 1973 a 2000, foram obtidos de Camfferman e Zeff (2007). Naqueles momentos em que o leitor deseje consultar a discussão mais ampla do livro, com eventuais citações relevantes, indicarei (CZ 2007) e os números da página ou capítulo. O capítulo 1 do livro apresenta uma visão geral de 12 páginas sobre a evolução do IASC.

2 CONTEXTO DE FUNDAÇÃO DO IASC

Após a Segunda Guerra Mundial, cada país tinha seus próprios Princípios Contábeis Geralmente Aceitos (GAAP, terminologia norte-americana), ou sua própria prática contábil. Inclusive entre os GAAP em países com merca- dos de capitais ativos, dos quais as companhias negociadas em bolsa dependiam fortemente para captação de recur- sos – os EUA, o Canadá, o Reino Unido, a Austrália e a Nova Zelândia –, havia importantes diferenças. Por exem- plo, no Reino Unido, na Austrália e na Nova Zelândia, era permitido às empresas reavaliar seus ativos fixos tangíveis, inclusive suas propriedades para investimento. Nos EUA e no Canadá, principalmente por causa da influência con- servadora da Comissão de Valores Mobiliários (SEC) (ver Zeff, 2007a), as companhias aderiram ao custo histórico. Na América do Norte, o Último que Entra, Primeiro que Sai (UEPS) estava amplamente disponível para fins de es- toque nos EUA, porém, no Canadá ele limitava-se a poucas indústrias (Skinner, 1972, pp. 79). Em 1975, o órgão nor- malizador neozelandês emitiu uma norma, a SSAP 3, sobre depreciação, que exigiu o uso do método linear (ver Zeff, 1979, pp. 59). Nenhum outro país fez o mesmo. Uma distância ainda maior existia entre os GAAP nes- ses países anglo-americanos e aqueles em países do conti- nente europeu e no Japão, onde o imposto de renda dirigia as práticas contábeis, onde o lucro declarado determina- va por lei o dividendo a ser declarado e onde os resulta- dos contábeis eram passíveis de manipulação por meio de reservas secretas. Em 1947, a França estabeleceu o Plan Comptable General (Plano Contábil Nacional), um regula- mento detalhado, codificado da contabilidade empresarial, posteriormente exportado para Bélgica e Espanha e, por fim, para Portugal, Marrocos, Tunísia, Argélia e Peru (ver Scheid & Walton, 1992, cap. 7). Na maioria dos países em desenvolvimento, a divulgação contábil era mínima e havia pouco a ser denominado GAAP além da possível heran- ça dos antigos colonizadores, tais como o Reino Unido e a França. Em suma, a prática contábil global era bastante di- versificada (ver, por exemplo, Nobes, 1983) e a comparação significativa entre as demonstrações contábeis de diferen- tes países era muito difícil. Os anos 1950 iniciaram o período de crescimento rá- pido no comércio internacional e no investimento direto estrangeiro e as empresas começaram a ampliar seu alcan- ce para além de suas fronteiras. As lideranças da profissão contábil consideravam “internacional” o novo desafio. O American Institute of Certified Public Accountants (AI-

A Evolução do IASC para o IASB e os Desafios Enfrentados e Nova Zelândia. Os Países Baixos e África do Sul haviam lançado esses órgãos apenas recentemente. Os nove países cujos órgãos contábeis nacionais foram convidados por Benson a se tornar membros do IASC foram, em ordem al- fabética: Alemanha, Austrália, Canadá, EUA, França, Japão, México, Países Baixos e Reino Unido e Irlanda (combina- dos). Cada país era representado por uma delegação de, no máximo, 3 membros: 2 que decidiam sobre o voto da dele- gação e 1 observador oficial. Cada delegação tinha 1 voto. Inicialmente, somente o AICPA apoiava a delegação dos EUA mas, por fim, o Financial Executives Institute (FEI) e o Institute of Management Accountants tornaram-se coa- poiadores. É uma coincidência interessante que o IASC te- nha sido fundado em 29 de junho de 1973, 2 dias antes do Financial Accounting Standards Board (FASB), um órgão independente, suceder o Accounting Principles Board, que era um comitê do AICPA. O AICPA era 1 dos 5 apoiadores do Financial Accounting Foundation, que supervisionava o FASB, porém, então, também havia tornado-se o apoiador da delegação dos EUA no IASC, considerado por alguns concorrente do FASB, como descrito adiante. Inicialmente, os membros das 9 delegações eram só- cios das empresas de auditoria, profissionais de auditoria independentes, executivos de órgãos contábeis nacionais, um acadêmico e um executivo financeiro, todos traba- lhando em tempo parcial. Nos anos seguintes, mais execu- tivos financeiros e usuários das demonstrações contábeis tornaram-se membros. Além de seus “empregos fixos”, os delegados participavam das reuniões do conselho do IASC 3 ou 4 vezes por ano e leram a documentação preparada pela equipe técnica de 2 funcionários de tempo integral, que trabalhavam com comitês voluntários para esboçar as normas. Pequenos comitês presididos por um membro do conselho e constituídos por voluntários de todo o mundo preparavam as versões iniciais. O objetivo do IASC era emitir normas “básicas”, denominadas International Ac- counting Standards (IAS) que, esperava-se, pudessem le- var a uma harmonização das normas contábeis ao redor do mundo. O conselho elegeu Henry Benson como presidente em sua primeira reunião. Os órgãos contábeis nacionais firmaram o IASC Agre- ement and Constitution, afirmando que empregariam seus “melhores esforços” para promover o uso das normas do IASC em seus países (CZ 2007, pp. 52-53 e 500-503). Uma maioria de 3/4 era exigida para aprovar projetos e normas finais. Como os membros de uma série de países defen- diam a exatidão das práticas contábeis utilizadas em seus próprios países e, também, porque as delegações de alguns países preferiam a flexibilidade de ter à disposição trata- mentos ou métodos contábeis opcionais, havia muitas nor- mas emitidas com escolhas livres^4. O voto para cada projeto e norma não era informado e nenhuma visão contrária era publicada. A equipe técnica frequentemente consultava as normas norte-americanas e britânicas, entre outras, nos es- boços iniciais. Os empregadores dos membros custearam algumas despesas de viagem, porém, os órgãos contábeis nacionais apoiadores responsabilizaram-se pela maior parte dos en- cargos financeiros. O aluguel e despesas relacionadas da sede em Londres eram pagos pelo ICAEW. Dentro de um ano, os órgãos contábeis de outros países começaram a se tornar membros associados, firmando o compromisso de também empregar seus “melhores esforços” para promover a aceitação das normas do conselho em seus países e con- cordando, ainda, em contribuir com as despesas do IASC (CZ 2007, pp. 43-67). As reuniões do conselho representavam, provavelmen- te, um desafio para algumas delegações. Como as delibera- ções ocorriam em inglês (com vários sotaques nacionais), os membros da França, Alemanha, Japão e dos Países Bai- xos eram obrigados a discutir questões técnicas de conta- bilidade em outro idioma. Com mais de 25 membros do conselho, além da equipe, sentados ao redor de uma grande mesa, a compreensão e comunicação das perspectivas não deve ter sido fácil para todos os participantes. Desde o início, a Comissão Europeia, ala administrativa da EEC, deu pouca atenção ao IASC. Talvez acreditasse que um órgão do setor privado atenderia apenas aos interesses de seus próprios membros, não ao interesse público que uma agência pública como a comissão almejava servir. O FASB, por sua vez, também deu pouca atenção ao IASC e, em vez deste último, enfocava as melhorias dos US GAAP. Como veremos, essas posturas mudaram até o final dos anos 1980. (^4) Alguns exemplos notáveis foram: IAS 2, sobre estoques, permitiu os métodos Primeiro que Entra, Primeiro que Sai (PEPS), média ponderada, UEPS e estoque-base; IAS 4, sobre depreciação, não excluiu qual- quer método; IAS 12, sobre impostos, permitiu deferimento total ou parcial, além dos métodos de deferimento e do passivo; IAS 16, sobre ativo fixo tangível, permitiu a divulgação do valor contábil pelo custo histórico ou uma reavaliação; e IAS 23, sobre custos de empréstimo, permitiu uma política de capitalização ou não capitalização de tais custos.

4 APOIO SURPRESA DA SEC EM 1975

A SEC vinha acompanhando os desenvolvimentos in- ternacionais da contabilidade com grande interesse e foi estimulada pelo trabalho do AISG. Em maio de 1972, o presidente da SEC, William J. Casey (1972), disse: “Talvez [o AISG] represente um início na formidável tarefa de al- cançar algum nível aceitável de uniformidade contábil em uma base internacional”. Um mês depois, Casey indicou John C. (Sandy) Burton como contador-chefe da SEC. Em setembro de 1973, poucos meses após o IASC iniciar suas operações, o presidente da SEC, Ray Garrett Jr. (1973), afir- mou que Burton estava trabalhando com a AICPA “e vários grupos contábeis internacionais para resolver as diferenças importantes na divulgação contábil ao redor do mundo”. Em seguida, a SEC concedeu ao novato IASC um inespera- do voto de apoio. As primeiras três normas do IASC trataram da divulgação das políticas contábeis, estoques e demonstra- ções contábeis consolidadas. Em dezembro de 1974, o IASC emitiu o E3, projeto de uma norma sobre as demonstrações

Stephen A. Zeff e Rice University creveu para Garrett, com cópias para Armstrong e Hornbos- tel, que o Acordo e a Constituição do IASC foram “firmados por e em nome de dezesseis dos principais órgãos contábeis profissionais do mundo”. Garrett respondeu: “Acreditamos que tenha trabalho suficiente para todos e que os esforços de ambos os órgãos [IASC e FASB] possam ser combinados em benefício dos mercados de capitais globais em geral e dos acionistas norte-americanos em particular, sem colocar em risco a autoridade de qualquer um dos órgãos”. De fato, isso significou que a SEC não via o FASB como o único órgão a considerar para a liderança na normalização contábil. A SEC havia deixado claro que apoiava o movimento em direção às Normas Contábeis Internacionais e considerava o progresso do IASC com olhos positivos. No final, o IASC modificou sua norma final em junho de 1976, para permitir a exclusão das subsidiárias diferentes da consolidação, e a tensão entre o FASB e a SEC prontamen- te se dissipou (CZ 2007, pp. 157-160). Um motivo indicado para a modificação é revelador. Joseph P. Cummings, vice- -sócio sênior de Peat, Marwick, Mitchell & Co. e membro da delegação norte-americana no IASC, havia presidido o co- mitê orientador para o E3. Apesar da sua crença fervorosa de que não havia lógica na exclusão das subsidiárias diferentes, após o IASC ter ouvido as objeções norte-americanas e bri- tânicas ao E3 por contrariar os GAAP nos seus países, disse, “aprendemos uma lição”. O IASC, ele disse, “sairá do papel, alcançaremos algo, desde que mantenhamos as normas rela- tivamente básicas e desde que não ultrapassem as políticas e os princípios estabelecidos nos mercados mais sofisticados ao redor do mundo” (Cummings, 1976, pp. 5-6). Cummings (1976, p. 6), que sucedeu Benson como Presidente do IASC em julho de 1976, adicionou profeticamente: Não sei o que faremos se realmente tivermos uma dife- rença violenta entre o Reino Unido e os EUA e alguns dos outros países do mercado comum em relação a algum tema. Alguém vai sofrer mais, e esse dia chegará, não há nenhuma dúvida em relação a isso. Quando chegar, tere- mos o verdadeiro teste de sobrevivência. contábeis consolidadas, implicando que as demonstrações contábeis de subsidiárias diferentes, tais como as subsidiárias financeiras ou seguradoras de companhias-mães industriais, deveriam ser incluídas nas demonstrações contábeis consoli- dadas. Essa proposta contrariou os US GAAP, que excluíam tais subsidiárias da consolidação, com base no Accounting Re- search Bulletin n. 51, publicado em 1959. Sandy Burton prefe- riu a abordagem do IASC e, em 10 de junho, escreveu para a AICPA, apoiadora do IASC nos EUA, em nome da comissão: Os princípios apresentados [no E3] não são consistentes com os princípios contábeis geralmente aceitos neste país e realmente refletem o que acreditamos ser a prática con- tábil preferencial. [...] Se o Comitê Internacional de Nor- mas Contábeis emitir uma declaração final que incorpo- re esses princípios e se não houver nenhuma declaração oposta pelo Conselho das Normas Contábeis Financeiras, a Comissão proporá para comentários emendas ao seu Regulamento S-X, que conformará suas regras de consoli- dação com aquelas apresentadas na declaração. Naquele momento, o FASB não tinha nenhum ponto em sua agenda para tratar das demonstrações contábeis consolidadas. Ao tomar conhecimento da carta de Burton, Marshall S. Armstrong, presidente do FASB, reclamou com o presiden- te da SEC, Garrett Jr., expressando sua “grande preocupação com as consequências da ação proposta naquela carta. [...] Se realizada, a ação proposta poderia prejudicar gravemente a eficácia do conselho como fator significativo na melhoria das demonstrações contábeis”. Na verdade, no Accounting Series Release n. 150 (Securities and Exchange Commission, 1973), publicada em dezembro, a SEC havia declarado que con- siderava a liderança do FASB na normalização contábil. O Presidente do FEI, Charles C. Hornbostel, protestou de for- ma semelhante, argumentando que a carta de Burton “não consegue compreender o fato que o IASC é um órgão não autorizado, com pouca aceitação geral pelo seu eleitorado”. Henry Benson tomou conhecimento da carta do FEI e es-

5 REGISTRO E IMPACTO DO IASC ENTRE 1973 E 1987

A primeira norma do IASC sobre a divulgação das po- líticas contábeis foi divulgada em janeiro de 1975 e foi re- cebida com grande alarde ao redor do mundo. Entre 1975 e 1987, o IASC publicou mais 25 normas, incluindo uma sobre refletir os efeitos das alterações de preços, que substi- tuiu uma norma anterior (CZ 2007, cap. 5). O impacto apa- rente das normas do IASC variou consideravelmente entre os países. Com poucas exceções, os países representados no conselho não modificaram suas próprias normas para refletir os conteúdos das normas do IASC. Havia dois moti- vos para esse comportamento. Os países anglo-americanos representados no conselho geralmente consideravam suas normas superiores às IAS. A maioria dos outros países com delegações no conselho podem muito bem ter acreditado que o IASC não combinava com o modelo contábil em ba- ses fiscais que estavam utilizando. O comitê normalizador do CICA, que foi o órgão apoia- dor mais entusiasta durante os 27 anos do conselho, real- mente consultou algumas normas do IASC, particularmen- te a IAS 18, sobre o reconhecimento de receitas, na revisão de suas próprias normas. Nos Países Baixos, o Nederlands Instituut van Registeraccountants propôs um processo que permitiu “aceitar” algumas IAS para uso obrigatório mas, no final das contas, nenhuma dessas IAS chegou a ser aceita (CZ 2007, pp. 165-166 e 172-174). “Melhores esforços” foi interpretado de forma dife- rente em diferentes países, e as delegações da maioria dos países não incluíram um representante do normalizador nacional, mesmo se houvesse um no país. O(s) órgão(s) contábil(eis) apoiador(es) poderia(m) ter tido apenas uma influência limitada, se tivessem, nas práticas contá- beis do seu país.

Stephen A. Zeff e Rice University A chamada da IOSCO pelas seguintes revisões nas nor- mas do IASC poderia muito bem ter originado-se na pró- pria SEC (International Organization of Securities Com- missions, 1988, p. 8): Eliminar as alternativas contábeis Garantir níveis suficientes de detalhamento e abrangência Garantir que contenham exigências adequadas de divulgação Em seguida, o IASC nomeou um comitê de “Compa- rabilidade” de alto nível, presidido por Ralph E. Walters e composto somente por membros do conselho, para pro- por reduções ou eliminações de opções, isto é, escolhas li- vres nas normas do IASC. O comitê realizou uma série de reuniões aceleradas e três representantes da IOSCO – os contadores-chefes da SEC, da COB e da Ontario Securities Commission – participaram como observadores e tiveram papel ativo nas discussões. O resultado dessas delibera- ções, com a aprovação final do conselho foi a declaração das intenções do IASC, intitulada Statement of intent: com- parability of financial statements, publicada em julho de 1990, que marcou inúmeras alternativas contábeis para a eliminação de mais de uma dúzia de normas. Uma das eli- minações acordadas foi o uso do UEPS como método de inventário aceitável. Em seguida, o conselho nomeou um comitê de “Melhorias”, presidido por Paul G. Cherry, para propor revisões em dez de suas normas para satisfazer a IOSCO. O objetivo não era somente reduzir a quantidade de opções de acordo com o relatório do comitê de Compa- rabilidade, mas, também, garantir que as normas revisadas tivessem níveis suficientes de detalhamento e abrangência e exigências de informações adequadas. Essa foi uma tarefa intimidante para um comitê que atuava em tempo parcial. Apesar disso, ele cumpriu a tarefa, que incluía assegurar as aprovações necessárias do conselho completo e, até o fi- nal de 1993, as dez normas revisadas foram submetidas à IOSCO para sua avaliação. A liderança durante as reuniões do conselho proveniente dos presidentes do IASC, Arthur R. Wyatt e, em seguida, Eiichi Shiratori, foi crucial para o êxito do projeto. O comitê sofreu um único revés. Apesar da recomendada eliminação do UEPS contar com o apoio da delegação norte-americana, essa mudança foi derrotada porque quatro outras delegações (Alemanha, Itália, Japão e Coreia) votaram a favor de sua continuação, impedindo, as- sim, uma maioria de 3/4 para aprovar a proposta de elimi- nação. Nesses quatro países, o UEPS era aceitável para fins do imposto de renda, e as informações contábeis naqueles países estavam vinculadas à tributação. Grupos industriais de lobbying podem ter pressionado suas delegações a não eliminar o UEPS das informações contábeis. A reação da IOSCO às normas melhoradas do conselho representou uma grande decepção para o presidente Shira- tori. A IOSCO considerou a maioria das dez normas acei- táveis, mas desejava mais melhorias nas outras. E queria ver normas sobre relatórios trimestrais, ativos intangíveis, ganhos por ação, benefícios aos empregados, a maioria dos instrumentos financeiros e questões de reconhecimento e mensuração para operações descontinuadas. O conselho, castigado por esse revés, acordou com a IOSCO o forneci- mento de um conjunto de duas dúzias de normas “chave”, apropriadamente melhores e mais abrangentes, até 1999. Esse era um pedido muito grande para um órgão que tra- balhava em tempo parcial, apesar de ter uma equipe de pesquisa (até meia dúzia) que aumentava gradualmente, incrementada por empréstimos de profissionais do CICA e outras fontes durante os anos 1990^7. Sir Bryan Carsberg su- cedeu David Cairns como secretário-geral em 1995, e Mi- chael Sharpe, australiano, assumiu a presidência do IASC em 1996 e ambos se mostraram lideranças críticas em um momento crítico, quando o conselho trabalhava em ritmo frenético para completar seu projeto de normas-chave a tempo (CZ 2007, pp. 215, 233-237, 269-286 e 293-328)^8.

6.2 Evolução nas Delegações Representadas no

Conselho

Talvez parcialmente, por causa do amplo interesse que a SEC tinha no trabalho do IASC, por meio de sua partici- pação ativa na IOSCO, o FASB aceitou o convite do IASC, em 1988, para enviar um convidado sem direito a voto e, posteriormente, observador, às reuniões do conselho: Ray- mond C. Lauver, seguido por James J. Leisenring e An- thony T. Cope. Após anos de indiferença perante o IASC, o FASB, com seu presidente Dennis R. Beresford, passou a ter ativo interesse em seu trabalho. De modo semelhante, antes do final dos anos 1980, a Comissão Europeia havia ignora- do as normas do IASC. Contudo, em 1990, com Karel Van Hulle substituindo o anterior chefe da unidade que lidava com as questões contábeis, a comissão aceitou a solicitação do IASC para começar a participar das reuniões do conse- lho na condição de observador sem direito a voto. A IOSCO começou a enviar uma delegação de observa- dores às reuniões do conselho em 1996, sempre incluindo pelo menos um oficial da SEC. Em 1997, uma delegação de observadores do Chinese Institute of Certified Public Accountants começou a participar das reuniões do conse- lho (CZ 2007, pp. 228-230). O claro progresso no trabalho do conselho e a atenção que estava recebendo da IOSCO estava começando a atrair o interesse de diversas partes. A equipe técnica também saiu fortalecida, com Liesel Knorr e James S. Saloman sendo indicados como diretores técnicos em 1994 e 1999, respectivamente. A quantidade de delegações representadas no conselho aumentou de 14 para 16 até 1996. Coreia e Jordânia, su- cedendo Nigéria e Taiwan, eram membros rotativos. Nos anos 1990, delegações da Nordic Federation of Public Ac- countants, da Índia (à qual se juntou subsequentemente o Sri Lanka) e da Malásia, e da Federation of Swiss Industrial Holding Companies, além de uma delegação de executi- vos financeiros, sucederam às delegações da Itália, Coreia e (^7) O orçamento do IASC era comparativamente modesto. A título de exemplo, uma comparação dos gastos totais do IASC para 1995 com aqueles do FASB e do U.K. Accounting Standards Board (ASB): £ 1.259.000 para o IASC contra £ 9.834.000 para o FASB e £ 2.247.000 para o ASB. Deve-se considerar o fato de que o orçamento do IASC, diferente dos orçamentos dos outros dois conselhos, tinha de custear viagens internacionais: no caso do IASC, para 1 dos 3 membros de cada delegação no conselho (CZ 2007, p. 239). (^8) O presidente, na maioria das ocasiões sócio de uma empresa de auditoria, era a liderança do IASC que presidia as reuniões do conselho. O mandato normal era de dois anos e meio.

A Evolução do IASC para o IASB e os Desafios Enfrentados Jordânia, e todas permaneceram no conselho até 2000 (CZ 2007, pp. 220-225 e 506-512). Assim, até 1997, o conselho estava reunindo-se ao redor de uma mesa muito maior, com a participação de mais de 45 membros, além da equipe e inúmeros observadores, totalizando entre 60 e 70 partici- pantes (Kirsch, 2006, pp. 370-373). Devido à necessidade de discutir e debater muitos esboços controversos de nor- mas novas e revisadas a ser submetidas à IOSCO até 1999, o conselho realizou uma série exaustiva de nove reuniões durante um período total de 45 dias em 1997 e 1998 (CZ 2007, pp. 213-237). Já havia se tornado claro que tal órgão de grande porte trabalhando nesse formato em tempo par- cial era difícil de justificar como normalizador eficaz.

6.3 Ascensão do G4+

Em 1993-1994, 4 normalizadores anglo-americanos

  • do Reino Unido, dos EUA, do Canadá e da Austrália – começaram a se reunir trimestralmente com suas equipes para cristalizar seus pensamentos sobre questões que es- peravam ser tratadas no IASC. O grupo tornou-se conhe- cido como o G4+1, o 1 sendo 1 representante, geralmente o secretário-geral, do IASC, que participava na condição de observador. Os 4 normalizadores tinham arcabouços conceituais e culturas contábeis semelhantes e era muito mais fácil para eles falar sobre perspectivas somente entre eles que nas reuniões do conselho do IASC, com muitas delegações de países tendo orientações contábeis históricas muito diferentes^9. Entre 1994 e 2000, o G4+1 publicou 12 artigos sobre os temas discutidos: hedge accounting, pro- visões, concentrações de atividades empresariais, leases, e pagamento com base em ações, entre outros. Em 1996, o normalizador da Nova Zelândia tornou-se o quinto mem- bro do G4. Havia receio dentro do conselho do IASC de que o G4+1 representasse uma tentativa das normalizado- res dos países anglo-americanos de dirigir as deliberações do IASC em direção às suas próprias soluções e que pudes- sem ter a ambição de competir com o IASC para se tornar o normalizador global (CZ 2007, pp. 443-446). Esta última possibilidade não era algo além da imaginação, já que os 5 normalizadores eram bem financiados e equipados e 2 de- les, o FASB e o U.K. Accounting Standards Board, estavam localizados em 2 dos maiores mercados de capitais do mun- do. Sir David Tweedie, do Reino Unido, James Leisenring, dos EUA, e Kenneth H. Spencer, da Austrália, se sucederam como presidentes do G4+1 e, como veremos adiante, os 3 se tornariam personagens-chave na organização do IASB a partir de 2000. Patricia L. O’Malley, do Canadá, também participou das reuniões do G4+1, e tornaria-se membro do IASB em 2001.

6.4 A SEC Anuncia os Atributos que Busca nas

Normas do IASC

Em 1996, a SEC decidiu fazer seu primeiro pronun- ciamento público (i. e., não por meio do IOSCO) sobre os atributos que as normas do IASC devem ter para ser acei- táveis para a preparação das demonstrações financeiras nas ofertas transfronteiras. Em um comunicado à imprensa em 11 de abril de 1996, a SEC afirmou que as normas devem refletir “três elementos-chave”: ◆ As normas devem incluir um conjunto-chave de pro- nunciamentos contábeis que constitui uma base contá- bil abrangente, geralmente aceita; ◆ As normas devem ser de alta qualidade – devem resul- tar em comparabilidade e transparência e devem pro- porcionar informações plenas; e ◆ As normas devem ser interpretadas e aplicadas com ri- gor (CZ 2007, pp. 331-335). Esse foi o primeiro uso do termo “alta qualidade” na discussão de normas e do processo de normalização, um termo ampla e frequentemente evocado desde então. O objetivo da SEC era tornar conhecidos os atributos gerais que buscava ao participar da avaliação das normas-chave do IASC pelo IOSCO. Em 1997, a mando do congresso, a SEC emitiu um re- latório para o congresso sobre o progresso no desenvolvi- mento das IAS e sobre a perspectiva de seu possível uso futuro por emissores privados estrangeiros nas ofertas e arquivamentos nos mercados de capitais norte-americanos (CZ 2007, pp. 335-338).

6.5 Europa Começa a Considerar a Contabilidade

em Termos do Mercado de Capitais e

Entusiasma-se com o IASC

Em abril de 1996, o IASC acelerou repentinamente o prazo para a submissão de suas normas principais ao IOSCO, de 1999 para março de 1998. Quais fatores leva- ram o IASC a adotar essa mudança em um cronograma já apertado? Desenvolvimentos importantes estavam ocorrendo no continente europeu, em especial na Alemanha, que incli- naram a Europa mais para a necessidade de normas contá- beis em sintonia com as necessidades dos investidores no mercado de capitais. Até então, Alemanha, França e alguns outros países do continente ainda eram mais envolvidos na tradição de um modelo contábil modelado, principalmen- te, pelas restrições legais da tributação e pela determinação do dividendo a ser pago aos acionistas. O princípio difun- dido da prudência, ou conservadorismo, era inquestioná- vel. Contudo, estavam ocorrendo mudanças nos mercados e nas instituições financeiros que desafiavam essa realidade. Tradicionalmente, os denominados bancos universais ou empresariais eram membros dos conselhos de adminis- tração das multinacionais alemãs. Tinham uma participa- ção acionária na empresa e os bancos estavam prontos para fornecer os empréstimos necessários. Portanto, as empre- sas não tinham de depender do mercado acionário para financiamento, a não ser de modo limitado. Entretanto, com a reunificação da Alemanha, em 1990, os principais bancos alemães buscavam diversificar em busca das ativi- dades bancárias de investimento e algumas multinacionais (^9) Até os anos 1990, havia tornado-se mais comum para membros dos normalizadores nacionais ser incluídos nas delegações para o conselho do IASC. A maioria dos membros do G4+1 eram membros das delegações ou observadores nas reuniões do conselho.

A Evolução do IASC para o IASB e os Desafios Enfrentados

6.8 O IASC se Reestrutura: 1997-

A liderança do IASC tinha motivos para acreditar que o IOSCO estaria pouco disposto a endossar suas normas, a não ser que fosse para se reestruturar de tal modo que os reguladores, inclusive, particularmente, a SEC, pudes- sem confiar que o conselho, ao avançar, seria um nor- malizador de alta qualidade. Um órgão com atuação em tempo parcial com equipe relativamente pequena, com comitês voluntários responsáveis por esboçar as normas, com reuniões em plenário nas quais entre 60 e 70 pes- soas se reúnem ao redor de uma enorme mesa não esta- belece confiança. Portanto, o IASC criou um Grupo de Trabalho Estratégico, com o presidente e vice-presidente do conselho, outro membro do conselho (David Tweedie) e os principais representantes dos interesses da profissão contábil, da comunidade financeira, do setor empresarial e dos reguladores. O grupo foi presidido por Edward J. Waitzer, um advogado e ex-presidente imediato da Onta- rio Securities Commission (OSC)^10. O grupo de trabalho recebeu a tarefa de propor um normalizador mais eficaz. Após mais de 12 meses de frequentes reuniões, durante as quais debatia propostas para diferentes níveis de enga- jamento por órgãos contábeis e normalizadores nacionais em várias versões de uma estrutura normalizadora, o grupo de trabalho quase parecia ter alcançado um impasse entre abordagens rivais. Então, em setembro de 1999, o contador- -chefe da SEC, Lynn E. Turner, enviou uma carta ao grupo de trabalho, informando a insistência da SEC de que o órgão reestruturado, para ter “autoridade e legitimidade”, fosse re- lativamente pequeno, independente, com atuação em tempo integral, assistido por uma grande equipe de pesquisa e com procedimentos sólidos e transparentes. O principal critério de associação ao conselho, segundo a SEC, foi conhecimento técnico, não origem geográfica. Sem especificá-lo na carta, a SEC defendeu um órgão semelhante ao FASB. Vozes no continente europeu, em especial a da Comis- são Europeia, defendiam um órgão maior, com pelo menos algumas pessoas trabalhando em tempo parcial e alguma representação geográfica dos países comprometidos com a aplicação das normas. Na reunião do conselho do IASC em novembro de 1999, quando se determinou o desenvolvimento de um plano de reestruturação, o conselho, apesar de continuar dividido sobre a melhor forma, decidiu com relutância, porém de modo unânime, aprovar uma reestruturação das linhas das demandas da SEC. Para o conselho, era impensável que um normalizador global não tivesse o apoio do país cujo mer- cado de capitais era o maior do mundo. A seguir, o grupo de trabalho elaborou os detalhes da nova estrutura. Um conselho diretor de 19 membros “com diferentes características geográficas e funcionais”^11 supervisionaria o conselho reestruturado. Os curadores (1) levantariam os fundos; (2) indicariam os membros do conselho, um comitê de interpretações (sucessor de outro estabelecido pelo IASC em 1997)^12 , e um Standards Ad- visory Council; e (3) monitorar a eficácia do conselho. A “principal qualificação para associação ao conselho seria o conhecimento técnico” e a “seleção dos membros do conse- lho não seria baseada em representação geográfica”. O con- selho teria 12 membros em tempo integral e 2 em tempo parcial; 7 dos 14 membros do conselho teriam de possuir vínculos formais com normalizadores nacionais, “que as- sistiriam o IASC no alcance da convergência das normas contábeis com soluções de alta qualidade”. O grupo de tra- balho declarou que “uma equipe técnica de alta qualidade com 15 pessoas é considerado um número inicial razoável”. O conselho aprovaria suas decisões sobre questões técni- cas por maioria simples. O secretário-geral supervisionou a elaboração de uma constituição baseada no relatório final do grupo de trabalho e o conselho do IASC a aprovou por unanimidade em sua reunião de março de 2000. Em maio de 2000, todos os órgãos membros do IASC – 143 órgãos contábeis profissionais em 104 países – aprovaram a rees- truturação, inclusive a nova constituição, tornando-a defi- nitiva. Por meio dessa decisão, a profissão contábil global cedeu sua “propriedade” do IASC^13. O grupo de trabalho determinou que um comitê de no- meação de 5 a 8 “indivíduos notáveis com diferentes carac- terísticas geográficas e funcionais” selecionasse os curado- res iniciais. O comitê poderia “incluir membros sêniores de órgãos reguladores, grandes organizações internacio- nais, grandes corporações globais e a profissão contábil” (parágrafo 21). O conselho do IASB aprovou um comitê de 7 membros, inclusive o presidente da SEC, Arthur Levitt, selecionado pelo comitê como seu presidente. Os outros membros foram o presidente do Banco Mundial, os presi- dentes do COB francês, da Financial Services Authority do Reino Unido e da Securities and Futures Commission de Hong Kong, o principal executivo da Deloitte Touche Toh- matsu e o vice-presidente do Accounting Standards Board alemão^14. O comitê, e particularmente Levitt, acreditava que os curadores exigiam uma pessoa de renome interna- cional para ser presidente do conselho diretor, e consegui- ram recrutar Paul A. Volcker, ex-presidente do U.S. Fede- ral Reserve Board, para a posição. Os outros 18 curadores eram indivíduos notáveis do mundo inteiro. A primeira reunião do conselho diretor foi realizada em junho de 2000, e Volcker selecionou Kenneth Spencer, da Austrália, 1 dos 3 contadores qualificados no conselho, para liderar o comitê de nomeação dos curadores. Spencer havia sido presidente do G4+1 e havia sido membro da delegação australiana no conselho do IASC em 2 ocasiões. (^10) Por muito tempo, a SEC considerou a OSC como regulador que compartilha seus valores e crenças sobre questões de contabilidade e divulgação. O grupo de trabalho do IOSCO sobre divulgação e contabilidade multinacionais, como observado, sempre foi presidido por um oficial sênior da SEC, e sempre foi conveniente ao presidente que seu subcomitê de contabilidade e auditoria fosse presidido pelo contador-chefe da OSC ou seu vice. Assim, à medida que a SEC pode ter sido consultada acerca da seleção do presidente do Grupo de Trabalho Estratégico, a escolha do ex-presidente imediato da OSC seria bem-vinda. (^11) As citações neste parágrafo foram extraídas dos parágrafos 19(a), 19(b) e 64 do relatório do grupo de trabalho, Recommendations on Shaping IASC for the Future (1999). A referência ao parágrafo 21 no próximo parágrafo foi extraída da mesma fonte. (^12) O Standing Interpretations Committee do IASC foi renomeado International Financial Reporting Interpretations Committee (IFRIC), em 2002, e, em 2010, foi renomeado IFRS Interpretations Committee. (^13) Uma cessão semelhante da propriedade da profissão contábil do normalizador nacional ocorreu nos EUA em 1973, quando o FASB sucedeu o Accounting Principles Board, e no Reino Unido em 1990, quando o Accounting Standards Board sucedeu o Accounting Standards Committee. (^14) O Accounting Standards Board da Alemanha havia sido criado em 1998.

Stephen A. Zeff e Rice University Entre 1973 e 2000, mais de 200 indivíduos altamente qualificados, com diversas trajetórias profissionais, serviram em 22 delegações o conselho do IASC, assistidos por uma equipe talentosa e grupos de voluntários dedicados de todo o mundo, que elaboraram os documentos preliminares como membros dos comitês. Essa foi uma colaboração global re- almente sem precedentes entre os profissionais contábeis. Nesse período, o IASC realizou 87 reuniões em 37 cidades ao redor do mundo e emitiu um arcabouço conceitual, 41 normas e 24 interpretações. Também publicou um periódi- co, o IASC Insight (CZ 2007, cap. 13, pp. 238-240 e 504-526). Exposição 1 International Accounting Standards Board (membros originais) Presidente: Sir David Tweedie – ex-presidente do Accoun- ting Standards Board (Reino Unido) Vice-presidente: Thomas E. Jones – ex-vice-presidente exe- cutivo, Citigroup (EUA) Mary E. Barth (tempo parcial) – professor de contabilidade na Stanford University (EUA) Hans-Georg Bruns (vínculo com normalizador alemão) – ex-diretor contábil, Daimler/Chrysler (Alemanha) Anthony T. Cope – ex-membro do Financial Accounting Standards Board (EUA) Robert P. Garnett – ex-vice-presidente executivo de finan- ças, Anglo American plc (África do Sul) Gilbert Gélard (vínculo com normalizador francês) – ex- -sócio da KPMG, Paris (França) Robert H. Herz (tempo parcial) – sócio técnico da Pricewa- terhouseCoopers, Nova York (EUA) James J. Leisenring (vínculo com o FASB) – ex-vice-presi- dente do FASB (EUA) Warren McGregor (vínculo com normalizador australiano e neozelandês) – ex-diretor executivo do Australian Ac- counting Research Foundation (Austrália) Patricia O’Malley (vínculo com normalizador canadense) – ex-presidente em tempo integral do Accounting Standar- ds Board e ex-sócio técnico da KPMG, Toronto (Canadá) Harry K. Schmid – vice-presidente sênior aposentado, Nes- tlé (Suíça) Geoffrey Whittington (vínculo com normalizador britâni- co) – professor de contabilidade aposentado na Cam- bridge University e ex-membro do Accounting Standar- ds Board (Reino Unido) Tatsumi Yamada (vínculo com normalizador japonês) – ex-sócio da ChuoAoyama Audit Corporation (membro da PwC), Tóquio (Japão).

7 ORGANIZAÇÃO DO IASB EM 2000-

O primeiro membro do conselho reestruturado a ser eleito foi seu presidente, David Tweedie, que presidia em tempo integral o UK Accounting Standards Board desde 1990, ele era membro da delegação britânica ao conselho do IASC desde 1995, originador e primeiro presidente do G4+1. Os curadores escolheram os outros 13 membros após extensa busca de candidatos e entrevistas. Não estabe- leceram quotas formais de países ou regiões para a associa- ção ao conselho. A composição geográfica resultante foi: 5 membros dos EUA, 2 do Reino Unido e 1 da Austrália, do Canadá, da França, da Alemanha, do Japão, da África do Sul e da Suíça, cada. Era um conselho composto por pro- fissionais de alto gabarito. (Ver Exposição 1 com a lista dos membros do conselho inicial.) O contingente americano no novo conselho do IASC poderia contar com 5 dos 14 votos, desde que todos chegassem a um consenso, contra somente 1 dos 16 votos no conselho antigo. A pesada repre- sentação dos países anglo-americanos foi devidamente re- gistrada, e não de forma positiva, no continente europeu; 9 dos 14 votos, 1 a mais de uma maioria simples, seriam con- cedidos pelos 5 dos EUA^15 , os 2 britânicos, 1 canadense e 1 australiano. Grande parte do conselho inicial consistia em “técnicos”^16 e ex-normalizadores nacionais. Jim Leisenring e Tony Cope haviam trabalhado no FASB, David Tweedie e Geoffrey Whittington haviam sido o presidente em tempo integral e membro em tempo parcial, respectivamente, do UK Accounting Standards Board e Tricia O’Malley havia sido presidente em tempo integral do Accounting Stan- dards Board canadense. Warren McGregor foi, por longo período, o diretor da fundação de pesquisa que apoiava o Australian Accounting Standards Board. Whittington e Mary E. Barth eram professores de contabilidade. Hans- -Georg Bruns havia sido o chefe de contabilidade da Daim- ler. Metade dos membros do conselho haviam sido sócios de auditoria de uma das 5 Grandes (ou 6 Grandes); 8 dos 14 membros haviam sido delegados ou observadores sem direito a voto no antigo conselho do IASC. Quatro mem- bros haviam participado do G4+1. A socialização do novo conselho não foi nada difícil, considerando que a maioria dos membros já se conhecia. A composição do conselho deveria incluir pelo menos 5 membros de empresas de auditoria, 3 de empresas e 3 da comunidade de usuários e pelo menos 1 acadêmico. O grupo mais difícil de recrutar eram o dos usuários, e ha- via dúvidas quanto ao fato de 2 dos 3 classificados como usuários serem membros daquela classe. Somente 1 dos 3 realmente havia sido usuário profissional do mercado de valores mobiliários durante bastante tempo. Os curadores levantaram os fundos necessários das 5 grandes empresas de auditoria, empresas, instituições fi- nanceiras e bancos centrais, e o conselho, cujo nome foi al- terado para Financial Accounting Standards Board (FASB), (^15) Dos 5 dos EUA, 2, Cope e Jones, eram de origem britânica, mas cada um deles, respectivamente, havia passado a maior parte ou grande parte de sua carreira nos EUA. (^16) Esse termo refere-se àqueles com forte base técnica na aplicação e interpretação das normas contábeis.

Stephen A. Zeff e Rice University cessidade de desenvolver seu mercado de capitais interno, a questão das práticas contábeis comparáveis que atenderiam às necessidades de informação dos pesquisadores surgiu como uma questão importante. Para ter certeza, os 15 GAAP nacionais na UE haviam tornado-se um tanto mais pareci- dos como resultado da incorporação pelos estados membros da Quarta e Sétima Diretrizes da Lei Societária sobre conta- bilidade em suas legislações nacionais, mas isso não bastaria. Não eram “sistemas de divulgação contábil orientados ao investidor” (parágrafo 14), sintonizados com as neces- sidades de informação do mercado de capitais. As outras opções, além das diretrizes, eram os US GAAP e as IAS. Os US GAAP estavam fora de cogitação, por ser provenientes dos EUA e pelo excesso de volume e detalhamento. Além disso, haviam sido formulados pelo FASB, e qual interes- se o FASB teria nas perspectivas europeias ao desenvolver suas normas? Pelo contrário, o IASC era um normalizador declaradamente internacional, sediado em Londres, e, de- certo, incluiria diversos membros europeus após a reestru- turação. A Comissão Europeia observou que, desde 1995, “o IASC empreendeu um processo de revisão gradual, mas aprofundado, de revisão de suas normas. As IAS já propor- cionam um conjunto abrangente e conceitualmente sólido de normas de divulgação contábil que deveria atender às necessidades da comunidade empresarial internacional” (parágrafo 15). Isso constituía um apoio encorajador de um órgão que, apenas 15 anos antes, havia descartado as nor- mas do IASC por considerá-las irrelevantes para a Europa. Em maio de 2000, o conselho da UE havia se reunido em Lisboa, quando adotou um passo político importante em direção a um mercado integrado de serviços financeiros e de capitais na UE, enfim, até 2005. Portanto, o anúncio da Comissão Europeia em junho de 2000, como discutido, sig- nificou as implicações daquele passo para o papel do IASC e suas normas no desenvolvimento futuro da UE. Essa revisão significativa na estratégia da Comissão Europeia era de im- portância histórica para o IASC, que em breve se tornaria o IASB. Significou que o novo IASB teria garantido uma gran- de clientela para suas normas, porque nenhum outro país(es) do mundo desenvolvido tinha(m) anunciado um compro- misso com as normas do IASC. Se o IASB tivesse iniciado suas operações em 2001 sem tal base de apoio, teria sido tão duradoura e significativa sua influência? Como veremos adiante, os países de outras regiões do mundo notaram o compromisso da UE e, portanto, passaram a considerar as normas do IASB muito mais como consequências que como mera extensão da série de normas voluntárias emitidas pelo antigo IASC (CZ 2007, pp. 430-432). A estratégia revisada da Comissão Europeia impôs um dilema processual, porque não havia precedente nos EUA para o estabelecimento, de fato, de leis europeias por um órgão do setor privado. Para que as empresas europeias ne- gociadas em bolsa fossem obrigadas a obedecer às IAS, tal exigência havia de ter a força das leis europeias. Por meio de um procedimento conhecido na UE como “comitologia”, a Comissão Europeia montou um processo por meio do qual as normas do IASB pudessem ser endossadas para uso com- pulsório por empresas europeias negociadas em bolsa sem a necessidade de submeter cada norma ao Parlamento e ao Conselho Europeu para aprovação (Van Hulle, 2008). Pri- meiro, a Comissão Europeia instigou o setor privado a es- tabelecer um comitê de especialistas contábeis baseados na UE que pudesse fornecer feedback técnico ao conselho do IASB no desenvolvimento de suas normas e interpretações e depois pudesse aconselhar a comissão sobre a solidez técni- ca da norma ou as interpretações finais para uso obrigatório na UE. Esse órgão, estabelecido em 2001, foi denominado European Financial Reporting Advisory Group (EFRAG), que evoluiu para um comentarista proativo das normas con- tábeis na Europa (Enevoldsen & Oversberg, 2008). O Tech- nical Expert Group (TEG) do EFRAG possui uma dúzia de membros votantes, representando uma série de característi- cas profissionais e geográficas, que discutem os projetos do IASB e aconselham a Comissão Europeia quanto à qualida- de técnica de suas normas e interpretações finais. Segundo, a comissão criou um Accounting Regulatory Committee (ARC) com representantes de todos os governos dos Estados membros. Após a comissão receber uma avaliação positiva em nível técnico do TEG, submete a norma ou interpretação ao ARC para avaliação de sua aceitação “política”. Porque um ou mais governos dos Estados membros se pronunciaria sobre a aceitação “política” de uma norma ou interpretação? No processo de elaboração do IASB, empre- sas, bancos, associações de negócios ou grupos de investi- dores podem apresentar preocupações ao seu governo na- cional de que a norma, se endossada, teria um custo alto demais para ser implementada ou traria consequências adversas para a economia nacional, tais como incentivos redutores das atividades empreendedoras. Em casos excep- cionais, essas preocupações também podem ser formuladas aos membros do Parlamento Europeu. Até o momento, as queixas aos membros do Parlamento Europeu levaram à postergação do endosso de uma única norma, a IFRS 8, so- bre segmentos operacionais (Roberts, 2010, pp. 465-469). O Parlamento tem o poder de postergar ou vetar um endosso de acordo com esse procedimento de comitologia, mas não pode, por si, tomar a iniciativa de endossar uma norma que a Comissão Europeia não submeteu a endosso. A própria Comissão Europeia postergou as ações sobre algumas nor- mas e interpretações do IASB, porque um ou mais governos importantes da UE recusaram-se a fazer parte dele^19. Em 7 de junho de 2002, a UE anunciou que o Parlamento e o Conselho Europeu haviam aprovado o Regulamento (EC) 1606/2002, conhecido como o Regulamento das IAS, imple- mentando a estratégia revisada da Comissão Europeia e im- pondo a obrigação, à maioria das empresas negociadas em bolsa da EU, de iniciar a utilização das IAS/IFRS endossadas até 1º de janeiro de 2005 (IAS Regulation 1606/2002, 2002)^20. (^19) Exemplos notáveis são a IFRIC 12, sobre acordos de concessão de serviços, de novembro de 2006, e a IFRS 9, sobre instrumentos financeiros, emitida em novembro de 2009. A IFRIC 12, enfim, foi endossada mais de dois anos após sua emissão, após a preparação e emissão pela Comissão Europeia de um estudo de impacto (disponível em http://ec.europa.eu/internal_market/accounting/docs/effect_stu- dy_ifric12_en.pdf). (^20) Veja o comunicado da Comissão Europeia à imprensa disponível em http://www.iasplus.com/resource/euiasregpr.pdf. O Regulamento IAS da UE também se aplica aos três membros da European Economic Area (Noruega, Islândia e Liechtenstein). Um número limitado de empresas negociadas em bolsa na UE, principalmente aquelas negociadas em New York, recebeu uma extensão até 1º de janeiro de 2007.

A Evolução do IASC para o IASB e os Desafios Enfrentados No início do próximo mês, o Financial Reporting Council (FRC) da Austrália anunciou que “formalizou seu apoio à adoção das normas contábeis internacionais até 1º de janei- ro de 2005” (Adoption of International Accounting Stan- dards by 2005, 2002). No comunicado à imprensa do FRC, Jeffrey Lucy, o presidente do FRC declarou que “a Austrália definitivamente não pode se dar o luxo de ficar atrás da Eu- ropa nesse aspecto”. O mundo havia começado a notar a im- plementação da estratégia revisada da Comissão Europeia. Após o endosso de uma norma ou interpretação do IASB para uso compulsório por empresas negociadas em bolsa da UE, como a empresa e o auditor devem formular a afirmação de que as demonstrações financeiras estão de acordo com as normas endossadas? Em 2005, a Comissão Europeia, em consulta com o ARC, decidiu que a formula- ção exigida deve ser: “De acordo com as Normas Interna- cionais de Relatórios Financeiros, conforme adotadas pela UE” (Reference to the financial reporting framework in the EU in accounting policies and in the audit report and ap- plicability of endorsed standards, 2005). Essa decisão cria um problema para leitores que não sabem quais diferenças, se for o caso, existem entre as IFRS endossadas pela UE e as IFRS, conforme emitidas pelo IASB. Para que os leitores das demonstrações financeiras possam confiar na comparabili- dade das IFRS entre os países, eles devem ser informados acerca de quaisquer diferenças salientes entre os arcabou- ços dos países para a elaboração dos relatórios financeiros. Como, então, um leitor em, digamos, Tóquio, Sydney ou Nova York, das demonstrações contábeis de uma empresa europeia negociada em bolsa, acompanhadas por tal decla- ração de conformidade, poderá saber se, e até que ponto, as demonstrações contábeis cumprem o conjunto completo das IFRS conforme emitidas pelo IASB? A UE não exige que as empresas informem os desvios das IFRS como emi- tido pelo IASB^21. Esse dilema tornou-se uma preocupação para a SEC em 2007, como discutido na próxima seção.

9 OS PRIMEIROS CINCO ANOS DO IASB: 2001-

Uma das prioridades do IASB em 2001 e 2002 foi iniciar um processo de convergência mútua com o FASB, de tal modo que, após a quase compatibilidade dos dois conjun- tos de normas, a SEC pudesse quase desistir de sua exigên- cia de conciliação para emissores privados estrangeiros que utilizam os IFRS (Pacter, 2005). Como contemplado pela liderança do antigo IASC, já em 1987, a desistência pela SEC de sua exigência de conciliação também era a prin- cipal perspectiva nas mentes da liderança do conselho do IASB. De sua parte, a SEC estimulou ambos os conselhos a diminuir as diferenças entre suas normas. Quando Robert Herz se demitiu do IASB, em junho de 2002, para se tornar o presidente do FASB, a oportunidade de consolidar esse relacionamento havia chegado. Em outubro de 2002, após a primeira reunião conjunta formal entre os dois conselhos, o IASB e o FASB emitiram um memorando de entendi- mento (MdE) conhecido como o “Acordo de Norwalk”, que afirmou seu compromisso de “tornar suas normas para a elaboração dos relatórios financeiros existentes totalmente compatíveis no menor prazo praticável”. Prometeram pro- gresso em projetos não especificados de curto prazo, que poderiam ser completados nos próximos anos, além da coordenação de seus futuros programas de trabalho para projetos de maior prazo^22. Em fevereiro de 2006, ambos os conselhos firmaram outro MdE para esboçar seu futuro progresso de convergência mútua em uma série de normas principais^23. Esse MdE foi atualizado em 2008 e estabeleceu uma meta de término até 2011^24 , e, em 2009, os dois con- selhos anunciaram publicamente um prazo acelerado para completar os projetos do MdE^25.

9.1 A Agenda de Projetos do IASB

Em 2001, o conselho do IASB decidiu sobre uma agenda ambiciosa de projetos, inclusive o pagamento baseado em ações, combinações de negócios, contratos de seguros, rela- tórios de desempenho e melhoria da IAS 39. Outra priorida- de do conselho foi a melhoria das outras normas herdadas do IASC para lidar com as muitas questões levantadas pelo grupo de trabalho do IOSCO em sua recomendação ao co- mitê técnico, que levou ao endosso pelo IOSCO em 2000. O pagamento baseado em ações era um projeto con- troverso porque as multinacionais europeias não queriam ver-se em desvantagem competitiva perante empresas que não tinham a obrigação de custear as opções de ações pelos US GAAP (Zeff, 2010, pp. 266-267). Apesar dessa controvérsia, o IASB conseguiu emitir a IFRS 2, em fe- vereiro de 2004. Exigiu que as despesas apareçam na de- monstração dos resultados e seguiu de perto o projeto do FASB emitido em 1993 (solução preferida do FASB), que o FASB não conseguiu incorporar à SFAS 123 em 1995, devido à intensa oposição política (Zeff, 1997). Em 2002, logo após o IASB ter começado a trabalhar no pagamen- to baseado em ações, o FASB retomou o assunto. Apesar do tratamento contábil das opções de ações dos empre- gados seguir sendo fonte de grande discussão nos EUA, com membros do Congresso ameaçando impedir o FASB (Zeff, 2002, pp. 44-45; Zeff, 2010, pp. 272-274), o FASB, mesmo assim, explorou o precedente do IASB e emitiu a SFAS 123R nas mesmas linhas que a IFRS 2, exigindo o custeio das opções de ações. A IFRS 2 realmente foi um dos sucessos do IASB. 21 Em seu comunicado no qual transmitiu a notícia da decisão da Comissão Europeia sobre a formulação exigida a ser adotada por empresas e auditores, a Fédération des Experts Comptables Européens (FEE) “estimulou fortemente” as empresas a incluir uma explicação nas notas às demonstrações contábeis sobre quaisquer diferenças entre suas políticas contábeis e IFRS como emitidas pelo IASB. A FEE também recomendou que as empresas europeias negociadas em bolsa afirmassem seu cumprimento com as IFRS completas (Reference to the financial reporting framework in the EU in accounting policies and in the audit report and applicability of endorsed standards, 2005). Essas recomendações também deveriam aplicar-se ao relatório da auditoria. Contudo, a Comissão Europeia não reiterou essas recomendações. Alguns auditores de empresas europeias, na verdade, deram essa segunda opinião, sobre o cumprimento com as IFRS completas, em seus pareceres (Nobes & Zeff, 2008). 22 Para o texto do acordo, ver http://www.fasb.org/news/memorandum/pdf. Entre os projetos de curto prazo lançados na sequência do Acordo de Norwalk, havia projetos sobre impostos de renda, uma revisão da IAS 37, sobre provisões, da IFRS 5, sobre ativos não circulantes mantidos para venda e operações descontinuadas, e a apresentação das demonstrações contábeis. 23 Ver http://www.fasb.org/cs/ 24 Ver http://www.fasb.org/intl/MOU_09-11-08.pdf. 25 Ver http://www.fasb.org/cs/ContentServer?c¼Document_C&pagename¼FASB%2FDocument_C%2FDocumentPage& cid¼1176156245558.

A Evolução do IASC para o IASB e os Desafios Enfrentados No início desse período, a SEC estimulou duas vezes o renome das IFRS no mercado de valores mobiliários dos EUA e o AICPA concedeu ao IASB um voto de confiança. Esses desenvolvimentos foram seguidos em 2008 pelas nu- vens escuras da crise econômica e financeira.

10.1 Ações pela SEC e AICPA

Os principais desenvolvimentos externos que influen- ciaram o trabalho do conselho em 2007 foram, provavel- mente, decisões tomadas na SEC. Em abril de 2005, o con- tador-chefe do SEC, Donald T. Nicolaisen, havia proposto um possível “mapa do caminho” para abandonar a exigên- cia de conciliação para os emissores particulares estran- geiros que utilizavam as IFRS (Nicolaisen, 2005). Apesar de ele abraçar somente seus pontos de vista pessoais, essa direção, aparentemente, tinha amplo suporte dentro da co- missão. Entre outros fatores, a Europa pressionava para que a SEC finalmente se comprometesse com as IFRS. Em julho de 2007, então, a SEC lançou uma proposta de norma para abandonar a exigência de conciliação para os emissores particulares estrangeiros que adotavam “as IFRS conforme publicados pelo IASB” e, em 15 de novembro de 2007, a comissão unânime aprovou a regra, para entrada em vigor imediata^29. A rapidez com que a SEC adotou essa regra sur- preendeu muita gente, inclusive no IASB. Havia uma ideia crescente na comissão de que a nota de conciliação às de- monstrações financeiras não continha informações úteis aos investidores (Walton, 2009, pp. 12-13). Também em 2007, a SEC lançou um documento de discussão para explorar a possibilidade de permitir que os usuários dos EUA utilizassem as IFRS em suas submissões à comissão^30. Antes da publicação desse documento, poucos acreditavam que, um dia, a SEC iria tão longe em direção ao possível uso das IFRS pelas empresas norte-americanas. Então, em agosto de 2008, a SEC aprovou, de modo unâni- me, com o apoio entusiasmado de todos os seus escritórios e divisões participantes, uma proposta de norma com um mapa do caminho para a eventual adoção compulsória das IFRS pelos emissores norte-americanos^31. Esses desenvol- vimentos em 2007, inclusive o abandono da exigência de reconciliação, e em 2008 foram impulsionados por Chris- topher Cox, presidente da SEC. Entretanto, diante da crise econômica e financeira emergente no sistema econômico e político dos EUA, a nova presidente da SEC, Mary L. Scha- piro, que sucedeu Cox em janeiro de 2009, testemunhou em sua audição de confirmação que não se sentiu obrigada pelo mapa do caminho (New Chairman Appointed, 2009). Desde 2009, a equipe contábil da SEC vinha sugerindo um processo denominado “condorsement”, que, essencial- mente, refere-se à convergência gradual com as IFRS a ser projetada pelo FASB, como possível caminho (Beswick, 2010; Work plan for the consideration of incorporating international financial reporting standards into the finan- cial reporting system For U.S. issuers: exploring a possible method of incorporation, 2011). A SEC havia prometido exprimir sua posição perante as IFRS até o final de 2011, porém, agora se espera que anunciará sua posição em 2012. O AICPA anunciou uma decisão em maio de 2008 que tornou os EUA o primeiro país onde as empresas com ca- pital fechado podem adotar as IFRS antes das empresas negociadas em bolsa. O conselho diretor do AICPA desig- nou o IASB como órgão contábil para fins de elaboração de princípios de contabilidade e divulgação internacionais, proporcionando, assim, aos membros do AICPA a opção de realizar as auditorias de acordo com as IFRS, como al- ternativa aos US GAAP, segundo as Regras 202 e 203 do Code of Professional Conduct (AICPA Council, 2008). Portanto, as empresas com capital fechado com sede nos EUA subsidiárias de matrizes estrangeiras que utilizam as IFRS também podem adotar as IFRS em suas demonstra- ções financeiras auditadas.

10.2 Impacto da Crise Econômica e Financeira

Em outubro de 2008, a crise econômica e financeira in- vadiu repentinamente o mundo do IASB (ver Meltdown at the IASB?, 2008). Os preços do mercado dos valores mobi- liários haviam desabado no terceiro trimestre do ano e os bancos que haviam classificado suas posições de títulos de dívida como negociáveis desesperaram-se com a perspectiva de registrar gigantescas perdas de posse não realizadas em seus ganhos trimestrais. Apesar de as IFRS não permitirem às empresas reclassificar títulos em uma carteira de negócios, os US GAAP permitiam tal reclassificação, mas somente em circunstâncias muito raras. Contudo, os bancos europeus se queixaram de estar em desvantagem competitiva nesse sen- tido perante aquelas empresas que utilizavam os US GAAP, e pressionaram o IASB a conceder aos usuários das IFRS a oportunidade de reclassificar suas posições de dívida de “ne- gócio” para “posse até o vencimento”. Quando os títulos de dívida são classificados como “posse até o vencimento”, não haveria necessidade de registrar nenhum ganho ou perda não realizado(a) (a não ser que haja um prejuízo). A Co- missão Europeia notificou o IASB de que devia emitir uma norma imediatamente, sem o due process, para autorizar tal reclassificação – senão, a comissão tomaria alguma ação não especificada, que poderia causar a perda pelo IASB de seu privilégio de normalizador contábil na UE. A questão tinha urgência, porque os bancos estavam prestes a lançar seus re- latórios de ganhos do terceiro trimestre. Engolindo a seco, o IASB aprovou devidamente tal norma, de modo retroativo (como exigido pela comissão) até 1º de julho de 2008, quan- do os valores de mercado de suas posições de dívida podem não ter sido inferiores (ou pelo menos não muito) aos va- lores escriturados. Foi um episódio bizarro e o presidente

10 OS CINCO ANOS SEGUINTES DO IASB: 2006-

(^29) Ver http://www.sec.gov/rules/final/2007/33-8879.pdf. (^30) Ver http://www.sec.gov/rules/concept/2007/33-8831a.pdf. ContentServer?c¼Document_C&pagename¼FASB%2FDocument_C%2FDocumentPage& cid¼1176156535882. (^31) Ver o webcast da audição da SEC de 27 de agosto de 2008, disponível em http://www.sec.gov/news/openmeetings/2008/ agenda082708.htm.

Stephen A. Zeff e Rice University Tweedie afirmou que quase pediu demissão (Pressured IASB Chairman Considered Resigning, 2008). Contudo, o que foi ignorado é que o IASB estipulou uma exigência de divulga- ção que obrigou os bancos que reclassificaram a revelar o valor de seus lucros sem a reclassificação. A Comissão Euro- peia aprovou a norma apenas dois dias depois, estabelecendo um recorde de atuação veloz. O Deutsche Bank foi um dos primeiros a aproveitar esse presente contábil e foi obrigado a divulgar que seu lucro antes de impostos de € 93 milhões no terceiro trimestre teria sido uma perda antes de impostos de € 732 milhões sem a reclassificação (ver Stice & Stice, 2010). A precipitada rendição do IASB à exigência da Co- missão Europeia proporcionou tempo pensar àqueles nos EUA, talvez até dentro da SEC, acerca da credibilidade do conselho como normalizador capaz de defender seus prin- cípios. Os críticos norte-americanos utilizaram esse episó- dio como prova de que não se pode confiar no IASB diante de pressões políticas, em especial de dentro da Europa (ver, por exemplo, Deans & Mott, 2008; Selling, 2008; Ciesiel- ski 2009). Porém, esses críticos esqueceram que o próprio FASB foi dominado pela SEC em 1978 em relação ao tra- tamento contábil de empresas produtoras de petróleo e gás (SFAS 19) e capitulou perante as forças políticas sobre a contabilização da reestruturação de dívidas problemáticas em 1977 (SFAS 15), contabilização de investimentos em dé- bitos e ações de capital em 1993 (SFAS 115), contabilização de compensação baseada em ações em 1995 (SFAS 123), aspectos de divulgação sobre resultados acumulados em 1997 (SFAS 130) e contabilização de patrimônio de marca e outros ativos intangíveis em 2001 (SFAS 142) (Zeff, 2010). Durante a crise econômica e financeira, uma das ques- tões que importunaram o IASB e, também, o FASB, foi o conflito entre seu objetivo declarado de prestar informa- ções transparentes aos investidores no mercado de capitais –a serviço dos reguladores do mercado de valores mobiliá- rios – e o forte desejo dos bancos e reguladores das ativida- des bancárias de que (1) as normas do IASB projetem uma imagem de estabilidade financeira e (2) não resultem em “crises do crédito” ao deprimir o capital bancário em mo- mentos de preços de títulos em queda. Durante momentos econômicos ruins, os interesses declarados dos regulado- res do mercado de valores imobiliários e dos reguladores bancários podem muito bem colidir e o normalizador pode ser submetido a intensa pressão política para acomodar os últimos. A pressão específica sobre o IASB para acomodar as preocupações dos bancos em outubro de 2008 não teria acontecido em momentos econômicos bons. O FASB foi submetido a pressões semelhantes durante uma audiência do U.S. House Subcommittee em março de 2009, encoraja- da por uma campanha agressiva de lobbying pela American Bankers Association (ver Pulliam & McGinty, 2009). Preo- cupações têm sido manifestadas no G20, em reuniões dos ministros de economia e finanças da UE e por reguladores bancários sobre o papel que preveem para as normas con- tábeis na preservação da estabilidade financeira^32.

10.3 Outras Alterações Constitucionais

No início de 2009, os diretores da Fundação IASC, hoje conhecida como a Fundação IFRS, efetuaram duas alterações importantes na constituição. Decidiu-se que um normaliza- dor global deveria ser visto apoiando-se explicitamente na vila global. Revisou a constituição para aumentar a quanti- dade de membros do conselho de 14 para 16 e especificou cotas geográficas de associação: 4 da América do Norte, 4 da Europa, 4 da Ásia/Oceania, 1 da América do Sul, 1 da África, e 2 para alcançar equilíbrio geográfico. Além disso, os membros em tempo parcial não mais seriam 2, mas 3 dos 16 membros poderiam trabalhar em tempo parcial. Além disso, em resposta às críticas levantadas no Par- lamento Europeu e em outras instâncias, os diretores con- cordaram que um normalizador do setor privado afirman- do sua atuação em prol dos interesses públicos deveria ser supervisionado por lideranças do mundo regulatório. Por- tanto, os diretores revisaram a constituição para conceder certa autoridade a um conselho de monitoramento, que aprovaria a indicação de diretores e supervisionaria seu de- sempenho geral. O conselho de monitoramento, pelo me- nos inicialmente, incluiu representantes da SEC, da Finan- cial Services Agency japonesa, da Comissão Europeia, e dos Emerging Markets and Technical Committees do IOSCO. O Comitê de Basileia de Supervisão Bancária participa na condição de observador. A presidente da SEC, Mary Sha- piro, tem participado regularmente das reuniões do con- selho de monitoramento, que serviram para incrementar sua compreensão das operações e dos objetivos do IASB e permitiram que conhecesse outros reguladores do mundo também interessados no trabalho do conselho. Sua experi- ência no conselho de monitoramento pode fundamentar a decisão que acabará apoiando se, e quando, as empresas norte-americanas negociadas em bolsa podem, ou devem, utilizar as IFRS em suas demonstrações financeiras.

10.4 O IASB e o FASB Pressionam para

Completar sua Convergência de Projetos

Principais até 2011

Prosseguindo em sua série de MdEs, ambos os conselhos têm-se esforçado para completar vários grandes projetos de convergência: instrumentos financeiros, contratos de seguro, arrendamento e reconhecimento de receitas. Os conselhos esperavam completar esses projetos até junho de 2011, quan- do os últimos três membros originais do IASB, inclusive o Presidente Tweedie, estariam aposentados, mas a complexi- dade das questões, aliada aos diferentes estilos de trabalho e constituição dos dois conselhos, obrigaram a um adiamento de suas datas de término. A aposentadoria repentina do Ro- bert Herz como presidente do FASB em agosto de 2010 e a redução do tamanho do conselho pelos diretores da FAF, su- pervisora do FASB de 7 para 5 a partir de 1º de julho de 2008 e depois, abruptamente, anunciou um novo aumento para 7 em agosto de 2010, não contribuíram para deliberações sua- ves e fáceis entre ambos os conselhos. (^32) Ver, por exemplo, as questões levantadas no discurso de David Tweedie na reunião ECOFIN, em 9 de junho de 2009, disponível em http:// www.ifrs.org/News/AnnouncementsþandþSpeeches/Chairmanþo- fþtheþIASBþaddressesþECOFINþmeeting.htm Sobre o papel da contabilidade na Reunião de Cúpula dos G20 em Londres, em abril de 2009, relacionado à prociclicalidade e aos bancos, ver http://governance- xborders.com/2009/04/04/accounting-at-the-g20-london-summit-watering-down-or-walkingthe- talk/.

Stephen A. Zeff e Rice University Alguns dos desafios que o IASB enfrenta, como norma- lizador contábil global, estão fora de seu controle. Contudo, apesar disso, o IASB tem influência. Abaixo são discutidos cinco desafios. Primeiro, como o IASB deve lidar com a eventual de- cisão da SEC de adotar, convergir ou continuar estudan- do as IFRS como arcabouço de divulgação contábil a ser utilizado pelos emissores norte-americanos? O processo de convergência mútua entre as IFRS e US GAAP, que tem sido uma política declarada do IASB e do FASB desde 2002, com certeza, não ultrapassará as datas finais dos grandes projetos que estão sendo completados^37. Os países que ado- taram as IFRS, além da liderança do IASB, acreditam que tenha chegado a hora da SEC, enfim, decidir quanto a se comprometer, ou não, com as IFRS. Caso não, o IASB deve considerar as consequências de um mundo IFRS sem os EUA. Diversos países, inclusive Japão e China, estão obser- vando o próximo movimento da SEC como sinal que po- deria influenciar a direção e o escopo de seu próprio com- promisso^38. Apesar dos EUA corresponderem a apenas 31% da capitalização do mercado global de valores mobiliários no final de 2009, uma queda significativa dos 52% em 2001 (Tweedie, 2011), o mercado de capitais norte-americano continua sendo o maior e mais importante no mundo, e a SEC é o regulador do mercado de valores mobiliários mais respeitado no mundo. Segundo, o IASB terá de administrar e equilibrar o fee- dback diverso dos grupos regionais recém-constituídos de normalizadores na Ásia-Oceania e América Latina, além do aconselhamento que já recebe da Europa e dos EUA e dos National Standard Setters. Como os países e regiões começaram a apreciar o pleno impacto das decisões do IASB na divulgação contábil de suas empresas e, também, nas consequências econômicas e políticas percebidas como resultado dessas decisões, o aconselhamento recebido de diferentes partes do mundo tornou-se mais organizado e, talvez, mais insistente. Terceiro, o IASB necessita estimular melhorias no de- sempenho dos reguladores do mercado de ações no alcan- ce do cumprimento, por parte das empresas negociadas em bolsa, das IFRS. Há grande variação na eficácia do desempenho regulatório, inclusive dentro da UE, e ainda mais entre os países no resto do mundo, particularmente em economias emergentes e países em desenvolvimento. A um compromisso de um país cujas empresas negocia- das em bolsa são obrigadas a utilizar as IFRS falta credi- bilidade se não for apoiado por um regulador vigilante e proativo, seja no setor público ou privado. Na UE, o an- tigo Committee of European Securities Regulators publi- cou autoavaliações e revisões por pares do desempenho dos reguladores em seus 27 Estados membros, além da Noruega e Islândia (ver, por exemplo, Final report of the review panel concerning the updated self assessment and peer review of CESR’s Standard no. 1 on Financial Infor- mation, 2009), mas tinha pouca influência para aprimo- rar seu desempenho. Seu sucessor, a partir de janeiro de 2011, a European Securities and Markets Authority, tem um tanto a mais de poder nessas questões. Em outros lu- gares no mundo, o IOSCO apenas consegue convencer os reguladores nacionais a se tornar mais proativos quando encontram práticas deficientes de divulgação contábil, mas não tem autoridade além da persuasão. Quarto, naquelas jurisdições onde as IFRS são o conjunto mandatório de normas para as empresas negociadas em bol- sa, a confirmação do cumprimento com as IFRS pela empre- sa ou pelo auditor, ou ambos, pode referir-se ao arcabouço de divulgação contábil de tal forma que não esteja claro ao público se, e em qual grau, corresponde às IFRS como emiti- das pelo IASB. Por exemplo, na UE, exige-se que as empresas e auditores confirmem o cumprimento com as “IFRS confor- me adotadas pela UE”. Como os leitores em outras partes do mundo podem saber se “conforme adotadas pela UE” é igual a “conforme emitidas pelo IASB”? Em Hong Kong, onde o pleno uso das IFRS é obrigatório, é improvável que se exija que as empresas negociadas em bolsa e seus auditores confir- mam seu cumprimento com as Hong Kong Financial Repor- ting Standards ao invés das IFRS. A Índia, ao completar sua transição para as IFRS, exigirá que as empresas e auditores confirmem seu cumprimento com as normas contábeis in- dianas e com as IFRS. Em fevereiro de 2008, o Comitê Téc- nico do IOSCO recomendou que as empresas em países que utilizam as IFRS fossem responsáveis por informar se suas demonstrações contábeis cumprem com as “IFRS conforme emitidas pelo IASB” (IOSCO Technical Committee, 2008). Os auditores devem carregar a mesma responsabilidade. O IASB pode contribuir ao estimular essas e outras jurisdições a permitir que os leitores das demonstrações contábeis de suas empresas negociadas em bolsa sejam informados sobre se, e em qual grau, seu arcabouço de divulgação contábil cor- responde plenamente às IFRS. Quinto, e esse desafio está longe do controle do IASB, deve ser tomado o devido conhecimento no desenvolvi- mento das normas e interpretações sobre as diferenças na maneira fundamental de fazer negócios em diferentes pa- íses. Por exemplo, como uma norma sobre demonstrações contábeis consolidadas pode ser elaborada para refletir as relações substantivas no keiretsu japonês e chaebol coreano, as redes de empresas afiliadas que podem não ter uma em- presa controladora? Na China, a maior parte dos negócios é feita por entidades públicas, não por empresas do setor privado. Em qual grau as normas contábeis devem fazer provisões explícitas para as diferentes formas de fazer ne- gócios nos países islâmicos? A insistência no uso de um único método contábil em uma norma em todos os países pode, em alguns momentos, meramente salientar essas di- ferenças, sem promover a verdadeira comparabilidade glo-

11 ALGUNS DESAFIOS A SER ENFRENTADOS PELO IASB

(^37) Em um discurso proferido no dia 29 de julho de 2011, o Presidente do IASB Hans Hoogervorst se referiu à “agenda pós-convergência” do Conselho, o que implica que o programa de convergência mútua com o FASB não ultrapassa os grandes projetos que estão sendo completados (Hoogervorst 2011). (^38) Para Japão, ver Yorihiro (2011) e http://www.fsa.go.jp/en/announce/state/20110621-1.html.

A Evolução do IASC para o IASB e os Desafios Enfrentados bal. Alcançar a comparabilidade global não é sinônimo de alcançar a comparabilidade em um único contexto nacio- nal, onde há estímulos fiscais e hábitos comerciais em co- mum (Zeff, 2007b). O IASB deve tomar suas decisões com sabedoria e à luz do que parece ser exigido para promover a verdadeira comparabilidade global, o que pode significar a provisão de abordagens opcionais em sintonia com as cir- cunstâncias nacionais expressamente especificadas.

12 CONCLUSÃO

A maioria das pessoas que acompanha o trabalho do IASB atualmente pode não saber quase nada sobre seu fun- damental antecessor, o IASC. Entretanto, sem o pioneiris- mo do IASC, o IASB não existiria hoje. Em 1973, o IASC foi lançado em tempo parcial como o primeiro normalizador internacional, descendente dos órgãos contábeis profissio- nais em nove países. Para persuadir um mundo descrente, ele teve de construir um histórico de amplas consultas pro- cessuais e uma produção de normas competentes, inclusi- ve uma atenção à necessidade de aumentar a qualidade de suas normas iniciais genéricas. Ao final, conquistou os nor- malizadores nacionais, reguladores dos mercados de ações, o Banco Mundial e, final e fundamentalmente, a Comissão Europeia. Após a reestruturação necessária do IASC, res- surgiu como o IASB em 2001, com uma clientela prometida de aproximadamente 7.000 empresas negociadas em bolsa na União Europeia. Trabalhava, então, praticamente em tempo integral com uma equipe técnica muito maior e su- pervisionada por um conselho de diretores eminentes, que levantaram o apoio financeiro exigido. Suas normas não eram mais consideradas suplementos voluntários às nor- mas nacionais, mas sua intenção era substituir as normas nacionais ao redor do mundo. Em menos de dez anos, o IASB alcançou muito. Independentemente do que poderia se dizer sobre pequenas rachas na armadura da comparabi- lidade global, por causa das isenções ou exceções concedi- das por determinados países ou pelos atrasos tolerados na aceitação do conjunto completo das normas do IASB – e alguns países convergiram com as IFRS somente até certo ponto – a comparabilidade dos relatórios financeiros em- presariais ao redor do mundo, hoje, é muito superior ao nível anterior a 2005, quando a União Europeia indicou o caminho com sua exigência de adoção das IFRS em seus 25 Estados membros. Como sugerido, ainda há muito a ser feito. O IASB deve proporcionar normas fundamentais so- bre temas que atormentaram até os normalizadores nacio- nais mais avançados. E deve continuar a redefinir e melho- rar e ampliar o leque de suas normas, especialmente com o surgimento de novas questões e problemas. A lista dos grandes países que adotaram ou convergiram com as IFRS já é impressionante. E, com o tempo, aqueles recalcitrantes se acostumarão à ideia de que os relatórios financeiros, di- ferente da lei, devem ser os mesmos ao redor do mundo, já que os mercados de ações, hoje, são uma coisa só. Achleitner, A.-K., & Eberle, R. (2010). Switzerland. In G. J. Previts, P. Walton, & P. Wolnizer (Ed.), A global history of accounting, financial reporting and public policy: Europe (chap. 9). Bingley: Emerald. Adoption of International Accounting Standards by 2005. (2002). Bulletin of the Financial Reporting Council, 4 (3). Retrieved from http://www. iasplus.com/resource/ausfrc.pdf A driving wind for IFRS from Asia-Oceania. (2011). 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Referências