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Guias e Dicas
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Desinstitucionalização psiquiátrica e o papel da família na saúde mental, Provas de Serviço Social

Neste documento, os assistentes sociais discutem sobre a desinstitucionalização psiquiátrica, um processo que sempre existiu, mas agora recebe grande ênfase devido às directivas da comissão europeia. Eles refletem sobre a importância da família na reabilitação do doente mental, observando que muitas vezes a doença é confundida com comportamento inadequado e não diagnosticada atempadamente. Além disso, eles discutem as dificuldades que os doentes mentais enfrentam, como exclusão social e estigma, e a necessidade de apoio familiar e comunitarizado.

O que você vai aprender

  • Quais são as dificuldades enfrentadas por um doente mental na sociedade?
  • Qual é a importância de apoio familiar e comunitarizado para um doente mental?
  • Qual é o papel da família na reabilitação de um doente mental?
  • Que é a desinstitucionalização psiquiátrica?
  • Por que a desinstitucionalização psiquiátrica recebeu grande ênfase atualmente?

Tipologia: Provas

2022

Compartilhado em 07/11/2022

jacare84
jacare84 🇧🇷

4.5

(451)

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Não perca as partes importantes!

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A. Entrevistas
A.1. Guião Técnico(a) Serviço Social
Boa Tarde, o meu nome é Marta Rodrigues, sou estagiária de Sociologia e estou a
realizar um estágio de quatro meses aqui no C.H.P.C. Para tornar o meu estágio
mais enriquecedor, aplicarei várias entrevistas a diversos técnicos deste hospital.
Antes de mais gostaria de agradecer a sua disponibilidade para me responder a
algumas perguntas. É meu dever ainda garantir a confidencialidade das suas respostas,
uma vez que o seu nome nunca será associado à informação que me for dada. À sua
entrevista será associado um código, apenas para efeitos de numeração da entrevista.
O gravador serve apenas para facilitar o meu trabalho aquando da transcrição.
1. Boa Tarde, para começar, gostaria que me falasse um pouco sobre o que é para si a
doença mental.
-Tentar que o entrevistado fale o mais abertamente possível, falando dos contornos
que a doença mental pode assumir.
2. Para si, no que consiste o processo de desinstitucionalização psiquiátrica?
-Deixar que o entrevistado fale sobre aquilo que pensa, de forma a perceber a
posição do entrevistado relativamente a esta questão
3. A sua experiência no que diz respeito ao apoio prestado pela família do doente,
revela que a maioria é apoiante ou não? Na sua opinião, qual o papel da família no
processo de reabilitação e integração do doente e qual a sua importância?
4. Concorda com a afirmação de que os cuidados aos doentes mentais têm de
respeitar os direitos humanos? Na sua opinião, em que situações se coloca o
problema do respeito pelos direitos humanos?
-Tentar perceber até que ponto o profissional inclui a questão dos direitos humanos
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Baixe Desinstitucionalização psiquiátrica e o papel da família na saúde mental e outras Provas em PDF para Serviço Social, somente na Docsity!

A. Entrevistas

A.1. Guião Técnico(a) Serviço Social

Boa Tarde, o meu nome é Marta Rodrigues, sou estagiária de Sociologia e estou a realizar um estágio de quatro meses aqui no C.H.P.C. Para tornar o meu estágio mais enriquecedor, aplicarei várias entrevistas a diversos técnicos deste hospital. Antes de mais gostaria de agradecer a sua disponibilidade para me responder a algumas perguntas. É meu dever ainda garantir a confidencialidade das suas respostas, uma vez que o seu nome nunca será associado à informação que me for dada. À sua entrevista será associado um código, apenas para efeitos de numeração da entrevista. O gravador serve apenas para facilitar o meu trabalho aquando da transcrição.

  1. Boa Tarde, para começar, gostaria que me falasse um pouco sobre o que é para si a doença mental. -Tentar que o entrevistado fale o mais abertamente possível, falando dos contornos que a doença mental pode assumir.
  2. Para si, no que consiste o processo de desinstitucionalização psiquiátrica? -Deixar que o entrevistado fale sobre aquilo que pensa, de forma a perceber a posição do entrevistado relativamente a esta questão
  3. A sua experiência no que diz respeito ao apoio prestado pela família do doente, revela que a maioria é apoiante ou não? Na sua opinião, qual o papel da família no processo de reabilitação e integração do doente e qual a sua importância?
  4. Concorda com a afirmação de que os cuidados aos doentes mentais têm de respeitar os direitos humanos? Na sua opinião, em que situações se coloca o problema do respeito pelos direitos humanos? -Tentar perceber até que ponto o profissional inclui a questão dos direitos humanos
  1. Agora falando um pouco mais da função dos técnicos de serviço social, gostava que me falasse sobre o vosso papel, bem como os processos que vocês desencadeiam para apoiar o doente mental. -Perceber as respostas existentes.
  2. Na sua opinião, o que acha que deveria ser feito para além das respostas existentes para ajudar o doente mental no processo de reintegração social? -Obter a opinião dos diferentes membros da equipa.
  3. Como é sabido, o doente mental quando sai da instituição onde esteve internado é confrontado com diferentes obstáculos. A seu ver, quais pensa que são as dificuldades que o doente mental passa? -Tentar com esta pergunta chegar ao conceito de rotulação; -Verificar os estereótipos existentes em torno do doente mental.
  4. Nesta instituição existe uma preocupação das diferentes profissões que aqui cooperam, isto é existe uma multidisciplinaridade. O que pensa sobre esta questão?

Muito obrigada pela colaboração.

  1. A sua experiência no que diz respeito ao apoio prestado pela família do doente, revela que a maioria é apoiante ou não? Na sua opinião, qual o papel da família no processo de reabilitação e integração do doente e qual a sua importância?
  2. Gostaria que me falasse um pouco sobre a Psiquiatria portuguesa, nomeadamente a sua opinião sobre os cuidados a nível da saúde mental em Portugal. Acha que são adequados e eficazes?
  3. Na sua opinião, o que acha que deveria ser feito para além das respostas existentes para ajudar o doente mental no processo de reintegração social? -Pretende-se obter a opinião dos diferentes membros da equipa.
  4. Como é sabido, o doente mental quando sai da instituição onde esteve internado é confrontado com diferentes obstáculos. A seu ver, quais pensa que são as maiores dificuldades por que o doente mental passa? -Tentar com esta pergunta chegar ao conceito de rotulação; -Verificar os estereótipos existentes em torno do doente mental; -Tentar perceber se o(a) médico(a) psiquiatra tem noção dos constrangimentos sociais com os quais o doente mental se depara.
  5. Nesta instituição existe uma prática de cooperação inter-profissional. À luz da sua experiência pode identificar os pontos fortes e os pontos fracos dessa prática?

Muito obrigada pela colaboração.

A.3. Guião Psicólogo(a)

  1. Bom Dia, para começar gostaria que me falasse um pouco sobre o que é para si a doença mental? -Tentar que o entrevistado fale o mais abertamente possível, falando dos contornos que a doença mental pode assumir.
  2. Qual é o papel do psicólogo no tratamento da doença mental?
  3. Quando é que um doente é sinalizado para o Psicólogo? Há algum requisito, é por encaminhamento do médico psiquiatra…
  4. Para si, no que consiste o processo de desinstitucionalização psiquiátrica? -Deixar que o entrevistado fale sobre aquilo que pensa, de forma a perceber a posição do entrevistado relativamente a esta questão
  5. A sua profissão permite-lhe um contacto muito próximo com a realidade psiquiátrica. Ao longo da sua carreira qual foi o caso que mais o marcou?
  6. Na sua opinião, o que acha que deveria ser feito para além das respostas existentes para ajudar o doente mental no processo de reintegração social? -Pretende-se obter a opinião dos diferentes membros da equipa.
  7. A sua experiência no que diz respeito ao apoio prestado pela família do doente, revela que a maioria é apoiante ou não? Na sua opinião, qual o papel da família no processo de reabilitação e integração do doente e qual a sua importância?
  8. Concorda com a afirmação de que os cuidados aos doentes mentais têm de respeitar os direitos humanos? Na sua opinião, em que situações se coloca o problema do respeito pelos direitos humanos? -Tentar perceber até que ponto o profissional inclui a questão dos direitos humanos

A.4. Guião Enfermeiro(a)

  1. Boa Tarde, para começar, gostaria que me falasse um pouco sobre o que é para si a doença mental. -Tentar que o entrevistado fale o mais abertamente possível, falando dos contornos que a doença mental pode assumir.
  2. Qual é o papel do enfermeiro no processo de reabilitação e tratamento do doente mental? -Tentar perceber qual é a visão do(a) enfermeiro(a), ou seja se é uma perspectiva meramente a nível de cuidados médicos.
  3. Para si, no que consiste o processo de desinstitucionalização psiquiátrica? -Deixar que o entrevistado fale sobre aquilo que pensa, de forma a perceber a posição do entrevistado relativamente a esta questão.
  4. A sua experiência no que diz respeito ao apoio prestado pela família do doente, revela que a maioria é apoiante ou não? Na sua opinião, qual o papel da família no processo de reabilitação e integração do doente e qual a sua importância?
  5. Na sua opinião, o que acha que deveria ser feito para além das respostas existentes para ajudar o doente mental no processo de reintegração social?

-Obter a opinião dos diferentes membros da equipa.

  1. Concorda com a afirmação de que os cuidados aos doentes mentais têm de respeitar os direitos humanos? Na sua opinião, em que situações se coloca o problema do respeito pelos direitos humanos? -Tentar perceber até que ponto o profissional inclui a questão dos direitos humanos
  2. Como é sabido, o doente mental quando sai da instituição onde esteve internado é confrontado com diferentes obstáculos. A seu ver, quais pensa que são as dificuldades que o doente mental passa? -Tentar com esta pergunta chegar ao conceito de rotulação;

-Verificar os estereótipos existentes em torno do doente mental.

  1. Nesta instituição existe uma preocupação das diferentes profissões que aqui cooperam, isto é existe uma multidisciplinaridade. O que pensa sobre esta questão?

Muito obrigada pela colaboração.

34 entre o hospital, entre o doente e a comunidade e portanto o nosso trabalho prende- 35 se exactamente aqui: conseguirmos ter esta visão da saúde mental dentro do hospital e 36 fora do hospital. Não podemos pensar que é só lá fora que tem que haver saúde 37 mental, cá dentro também tem que haver saúde mental, os técnicos também têm que 38 ter saúde mental, os profissionais têm que ser bem preparados e eu dou a tónica aqui: 39 sabermos sobre a doença … nós somos assistentes sociais e parece: “ah nós não 40 temos que saber as características da doença” Não! Temos que saber! É 41 importantíssimo saber as questões relacionadas e as características da doença para 42 compreendermos e depois poder levar a cabo outras tarefas inerentes ao tratamento, 43 porque... e tu viste… não se integra uma pessoa com esquizofrenia igualmente a uma 44 pessoa com uma demência… portanto aqui faz toda a diferença! A integração é 45 diferente, as etapas que tu vais desenvolver desde trabalho com o utente sinalizado 46 com uma demência ou uma esquizofrenia, os passos que vais dar são diferentes … é 47 evidente que vais fazer o acolhimento que é igual para os dois, mas depois o processo 48 em si, de integração é diferente. Isto é um exemplo … Eu volto a dar a tónica: eu 49 quando penso em doença e em saúde mental penso nestes factores que estão aqui 50 dentro e que estão ao nosso alcance, melhorarmos nós enquanto técnicos e 51 profissionais, temos que estar dotados de conhecimento para podermos depois de 52 facto intervir com seriedade. 53 E: Relativamente à questão do processo de desinstitucionalização psiquiátrica, gostaria 54 que me falasse o que é para si esta questão, em que consiste? 55 e: O processo de desinstitucionalização… é um processo que para nós do ponto de 56 vista do serviço social sempre existiu, não é um processo novo… sempre existiu… 57 está-se a dar agora de facto uma grande ênfase devido às directivas da comissão, a tal 58 reestruturação dos serviços de saúde mental em Portugal, mas foi nossa preocupação 59 desde que estamos na psiquiatria a trabalhar e eu já estou há vintes anos e ela já existia 60 (risos) portanto é assim, desinstitucionalização é o que nós fazemos, é o que nós 61 fazemos desde sempre que estamos na psiquiatria. Foi para isso que quando… quando 62 as políticas na altura, anos muito recuados, para a integração dos doentes, foram 63 chamadas as assistentes sociais da segurança na altura, para acudir a tanto utente e a 64 tanto hospital cheio. Quem foram os profissionais? As assistentes sociais! E para quê? 65 Para desinstitucionalizar os primeiros doentes. Foi quando de facto o Estado se 66 apercebeu que não podia ter hospitais cheios de doentes. Foi então aqui que as

67 assistentes sociais começam a integrar-se gradualmente… até que o hospital Sobral 68 Cid começa a ter um quadro de técnicos, os quais trabalharam sempre com esse fim. 69 Há vinte e tal anos que cá estou, há vinte e tal anos que trabalho no processo de 70 desinstitucionalização. Pronto… integração dos agudos e desinstitucionalização dos 71 doentes que estão cá de facto há mais tempo. O que estamos a fazer hoje foi o que 72 sempre fizemos, porem é um processo difícil, moroso… complexo e que de facto não 73 está de facto o poder numa assistente social de reintegrar um doente residente, não 74 está! A assistente social pode ser o motor, mas tem que haver também políticas a 75 ajudar, tem que haver o meio a receber… a querer receber o utente e tem que haver 76 também uma vontade institucional de ajudar e pôr as técnicas suficientes a trabalhar 77 isto, porque não é uma assistente, não é uma pessoa, uma vez e não sei quê que se vai 78 conseguir… porque isto é um trabalho de força e porquê? Porque são muitos doentes, 79 com diferentes patologias e diferentes graus de dependência e com uma faixa etária 80 elevada e que resposta é que se vislumbra? São os lares de terceira idade … os 81 cuidados continuados não estão ainda regulamentados, portanto é escassa a 82 possibilidade… 83 E: No que diz respeito ao apoio que é prestado pela família do doente, acha que a 84 maioria revela ser uma família apoiante? 85 e: Ora bem… de uma forma geral… nós temos uma situação que se pode revelar de 86 diferentes formas… depende… depende da situação em que o utente se encontra, ou 87 seja depende da situação de sobrecarga que essa família teve ou não, mais ou menos e 88 depende de múltiplos factores dentro da própria família… temos que partir de um 89 princípio geral e é isto que eu penso que é a família apoia, vem … muitas vezes não 90 vem é bem… a família ou traz eventualmente uma situação de já algum desgaste e pelo 91 que tu já percebes-te é que a família vem tarde… poucas situações podemos dizer que 92 foram sinalizadas atempadamente … portanto … muitas vezes a situação de doença é 93 confundida como um comportamento e não é diagnosticada atempadamente, se 94 analisarmos isto do ponto de vista cultural, por exemplo nas regiões rurais as pessoas 95 vão à bruxa, as pessoas recorrem a curandeiros, vão tentar perceber porque é que 96 aquele seu elemento está com alterações de comportamento e pronto depois associa 97 isso a coisas místicas e muitas vezes não se vai ao médico atempadamente, ou seja não 98 é devidamente valorizado os sinais de doença mental, de algum desequilíbrio… ou se 99 desvaloriza… ou … ou se começam a fazer muitos estudos orgânicos… isso também

132 e: Exactamente… Esta utente concretamente, para além de ter deixado de trabalhar, 133 por causa da sua doença deixou também de fazer a sua própria higiene e de tomar a 134 medicação… muitas vezes a família questiona para que é que é precisa tanta 135 medicação, isto é outra luta que nós temos, porque se o doente já rejeita a medicação 136 a família por muitas vezes também reforça isso... outro problema... acabamos por ter o 137 doente descompensado. Muitas vezes sinalizamos também é que pode haver outro 138 elemento da família com patologia psiquiátrica isso também acontece o que agrava a 139 situação, pois passa a haver mais de um elemento com patologia psiquiátrica… as 140 redes começam a afastar-se. Quando se detecta uma doença mental, a primeira coisa 141 que as pessoas fazem é começar a afastar-se, mesmo os mais próximos … os mais 142 íntimos … a família começa a ficar lentamente mais sozinha, é isto que nós muitas 143 vezes observamos, mais limitada, o que acaba por cair tudo em cima do doente… isto 144 é quase em cadeia, as redes ao afastarem-se, ficam mais limitados e só olham para o 145 doente, o que não é nada bom, Estou sempre a dizer às famílias: “Vocês vão de férias! 146 Vocês procurem respostas, venham cá para ajudarmos o doente de outra, vocês vão 147 descansar agora!” e não… eles continuam a vir, continuam a telefonar. Eu costumo 148 dizer que há dois tipos de famílias, as ausentes que já chegaram a uma situação de 149 ruptura total e isso é muito mau, porque eles simplesmente não aparecem e se 150 aparecem mais tarde, perturbam o nosso trabalho, é a nossa experiencia, a família 151 ausente não dá a cara, desliga-nos o telefone… o sistema acabou por deixar que aquela 152 família acabasse também por adoecer derivado à saturação…estão cansados daquilo e 153 depois há aquela família que também não está bem, mas é asfixiante, que não sai dali, 154 que não sai do internamento, perturba os técnicos, perturba o doente, está sempre a 155 telefonar, está sempre a lembrar as coisas más dos doentes, o que fizeram de negativo 156 e esquece-se totalmente do lado saudável… e eu tenho que dizer isto Marta… todos 157 os doentes com uma patologia psiquiátrica tem uma parte saudável, nós não nos 158 podemos esquecer disto, temos que ir nós técnicos à procura dessa parte e ir sempre 159 lembrando à família essa parte saudável, porque a parte boa é rapidamente é 160 esquecida… os tratamentos hoje em dia tratam o doente, mas não tratam as 161 problemáticas sociais, as sequelas que ficam… as dificuldades que a família têm… cada 162 família reage à sua maneira… Não podemos esquecer que se a família não está bem e 163 se não a ajudarmos a evoluir é complicado… eu costumo dizer às famílias que sempre 164 que precisarem que venham ter comigo ou que me telefonem, porque a família precisa

165 de sentir que há este apoio por trás, que há esta retaguarda… nunca podemos 166 esquecer isto. 167 E: Relativamente à questão dos direitos humanos… concorda com a afirmação que 168 mesmo com os doentes mentais se deve ter sempre em conta o cuidado com os 169 direitos humanos? 170 e: Com certeza 171 E: E na sua opinião, em que situações é que acha que esse problema se pode colocar? 172 e: Penso que se tem evoluído bastante a nível de… e olhando para aquela reportagem 173 que tem passado bastante na televisão, a comissão avaliou o Júlio de Matos, o que 174 retrata um pouco… se olharmos para essa reportagem, ela retrata bem a questão dos 175 direitos dos doentes mentais … e eu penso que se evoluiu bastante nesse sentido… 176 embora ainda estejamos aquém do desejado e aquilo que é o mais dignificante, porque 177 a própria sociedade também tem que evoluir… não podemos criar legislação e depois 178 nós povo, nós profissionais, nós tudo não é, não andarmos… não andarmos ao mesmo 179 nível … portanto as legislações podem de facto ser criadas … os direitos humanos de 180 todos nós… das crianças… das mulheres, dos idosos… penso que se evoluiu nesta 181 área e a última foi … os cuidados continuados … foi um avanço enorme… tentamos 182 igualizar… isto é do terreno, de coisas com que trabalhamos no dia-a-dia… vou-te dar 183 este exemplo como um exemplo concreto: é não excluir novamente e não dar 184 oportunidades de integração e de apoio como fizemos à alguns anos atrás … em que 185 os pusemos de facto de uma forma asilar … o evoluir em termos de direitos é isto… é 186 percebermos que temos que trabalhar de outra forma não é… e darmos outro tipo de 187 apoio às pessoas. Depois tu perguntas-me assim: eu vou a uma comunidade qualquer e 188 o que é que faz a diferença entre uma pessoa que tem uma doença e outra que não 189 tem? É muito simples: se o utente estiver medicado e apoiado ele é igualzinho a outra 190 pessoa … tu não dás conta… o que é que faz a diferença? É falta de apoio… é a falta 191 de medicação, é isto só que provoca o estigma… Marta é isto só! A não ser não é em 192 casos de doença em que a situação já está muito avançada, em que já é visível algum 193 transtorno … Os direitos também é isto… é o direito ao apoio, é o direito à 194 igualdade, é direito a ter assistência como noutro hospital… 195 E: Agora entrando um pouco mais especificamente na função dos técnicos de serviço 196 social, quais são os processos desencadeados para apoiar o doente mental 197 especificamente…

231 uns problemas complicados”. Temos que ter uma capacidade de partilha dos utentes, 232 pois os utentes são de todos os profissionais. Bom… por isso o Serviço Social deve 233 estar desde o primeiro momento com o utente, convocar a família, começar a 234 diagnosticar e começar o tratamento social. Damos prioridade a quê? Se o utente já cá 235 anda manter sempre a relação estabelecida, ou seja, manter o técnico de referência , o 236 técnico que acompanha o utente desde o primeiro momento… sempre que possível 237 deve-se fazer isto. Outra coisa muito importante é a criatividade Marta… porque não 238 há respostas sociais para tudo, temos que ser criativos… temos que nos adaptar aquilo 239 que há, porque respostas perfeitas não existem. O real valor de um assistente social 240 em psiquiatria é isto, é conseguir criar a resposta adequada para aquele utente e para 241 aquela família. 242 E: Para além das respostas que existem, o que é que acha que poderia ser feito para 243 ajudar o doente no processo de reintegração? 244 e: Pois… isso é sempre a velha questão de que está muito para fazer… as carências 245 são bastantes para todas as pessoas que têm dificuldades a nível geral, quer tenha 246 patologia psiquiátrica ou não. O que podemos fazer é aquilo que já falamos um pouco 247 atrás, é pensar nos direitos de uma forma global e assegurá-los e isto… isto é uma luta 248 de cada um como profissional e como cidadão, é não vivermos ao lado e pensarmos: 249 oh isto é problema do Estado. Não! Tudo nos diz respeito. Porque este mesmo 250 problema pode-nos um dia bater à porta. Há que haver uma solidariedade, porque o 251 Estado de facto não pode suportar tudo. 252 E: Como é sabido o doente mental quando sai da instituição vê-se confrontado com 253 obstáculos no seu dia-a-dia. A seu ver, quais pensa que são as dificuldades pelas quais o 254 doente mental passa? 255 e: Bom… como já há cortes com alguns elos, eles já vêm com uma carga de estigma… 256 já foi excluído de alguns ambientes, já foi excluído ou da família ou do trabalho ou 257 daquela actividade ou daquele grupo, numa ou outra já esteve numa situação de 258 exclusão então quando o doente sai da instituição tudo isto tem que estar previsto 259 Marta… tudo tem que estar previsto. Quando eu planeio e se dá alta ao doente tem 260 que estar quase tudo em pormenor e pensado a nível das dificuldades que o doente vai 261 ter e temos que pensar antes de ele ter alta… é isto que estamos a fazer a toda a 262 hora, a visualizar esse regresso… tudo em conjunto. Nós temos que estar com eles e 263 ver com eles o que se pode passar, senão pode haver uma recusa. Nós quando

264 deixamos o utente temos que deixar pontes seguras de apoio, quem o vai ajudar a 265 fazer isto, isto e isto… essencialmente temos que auxiliar o utente e estar sempre ao 266 seu lado e dar-lhes sempre a esperança que as coisas vão melhorar. 267 E: Agora para terminar, durante o tempo que estive aqui a estagiar, verifiquei que há 268 uma preocupação das diferentes profissões que aqui cooperam, o tal trabalho 269 multidisciplinar. Gostaria de saber o que pensa sobre esta questão. 270 e: Pronto… eu continuo a dizer que sozinhos e quanto mais para a frente… às vezes 271 no primeiro ano, vou recordando quando fiz aqui a minha integração, foi dos sítios 272 onde eu fiquei mais fascinada, sobre essa questão que estás a falar… a tal forma como 273 todos articulavam… todos estavam em sintonia, como os saberes se complementavam 274 em prol da defesa dos direitos e do tratamento e de tudo do doente mental … era 275 espectacular, eu fiquei fascinada com a forma como se trabalhava aqui, porque eu 276 olhava para outros sítios onde estive e as coisas não eram assim. A grosso modo, 277 temos que dizer que trabalhamos em prol da causa do tratamento do doente mental, 278 trabalhamos bem, trabalhamos com este espírito que eu penso que é muito importante 279 e que eu verifico desde há vinte anos … isto não é novo. Eu via isto de uma forma 280 belíssima quando cá cheguei… no pavilhão 12 que agora é o IDT, onde havia o misto 281 de residentes de homens e mulheres, a organização era diferente, os residentes 282 estavam integrados com os agudos, lá está, havia uma mistura de todos e de facto… as 283 reuniões eram uma maravilha, todos discutiam as situações, ia tudo para a comunidade, 284 o que se foi perdendo um pouco. Eu quando cá cheguei já apanhei as equipas muito 285 treinadas nesta questão. Depois…porque e eu penso que este é um dos motivos 286 porque a comunidade ficou também muito mais preparada com este trabalho que foi 287 feito deixou-se de ir para fora, no entanto… continua haver multidisciplinaridade… 288 porque antigamente ia toda equipa, a casa do doente… ao centro de saúde… 289 Posteriormente… isso não se faz sentir de uma forma tão acentuada… mas entre 290 muros eu penso que continua a haver esta forma de estar e tu podes-te constatar… e 291 de facto só assim se pode trabalhar em saúde mental… não podemos ter ilusões de 292 que podemos estar nos gabinetes em regime de chamada… não podemos estar numa 293 postura meramente assistencialista… nós temos que olha o doente, que fazer reuniões 294 conjuntas para trocar opiniões, porque cada um teve uma visão sobre a coisa… há que 295 conjugar esforços e definir estratégias, porque se não for assim… não vale a pena 296 trabalhar em saúde mental.

298 Entrevista Nº 2 299 Profissão: Médico Psiquiatra 300 E: Bom dia, vamos então começar a entrevista. Antes de mais gostaria de saber Dr. 301 Enquanto profissional ligado ao ramo da saúde mental, gostaria que me falasse um 302 pouco sobre o que é mesmo o conceito de doença mental? 303 e: hmm, ora bem, não estava à espera, é uma pergunta difícil … é uma pergunta difícil 304 porque não é um conceito simples nem uniforme, isto é, envolve , envolve questões de 305 alguma complexidade, porque se em alguns casos a situação facilmente, hmm se faz 306 facilmente o pleno em termos dos observadores, por exemplo em algumas 307 perturbações, noutros casos a situação é muito discutível. Como estão presentes 308 características, como por exemplo falar sozinho, como por exemplo apresentar, o 309 paciente apresentar uma gravíssima perturbação de análise e observação do real, 310 falando de coisas ou com pessoas que não estejam presentes, isto é, mostrando que 311 está de facto isolado e que a percepção que tem das coisas não é acompanhada pelos 312 restantes seres humanos, conhecidos e amigos… é mais difícil, hmm é mais fácil que 313 haja uma concordância de que se está doente, que se está perturbado. Quando isso 314 não se passa, porque às vezes isso não se passa, a situação é mais difícil, porque são 315 situações que confinam com a normalidade, o estar triste ou estar nervoso ou estar 316 desconfiado ou estar desesperado, digamos são sentimentos, são estados de ânimo 317 normais e que só podem ter um significado ou devem ter o significado de doença 318 quando atingem um grau de intensidade e uma persistência que de facto, que de facto 319 tem relevância clínica e tem relevância social e envolve preocupação dos próprios, dos 320 próprios, da própria família e dos próprios amigos e portanto aí o conceito é mais 321 discutível. E depois ainda há situações de discutível consideração da doença, quando se 322 trata de uma personalidade com, digamos de uma personalidade difícil ou mal 323 estruturada ou digamos que tem traços, digamos um bocadinho desviados do que é 324 suposto ser normal, o conceito é muito discutível, porque estamos a falar de um 325 comportamento, estamos a falar de uma atitude em relação aos outros da nossa 326 sociedade, de que… cuja conceptualização como doença é discutível, portanto essas 327 situações são as mais difíceis de… e há casos onde… é aceitável a sua definição mas 328 também é aceitável a sua discussão e o seu questionamento. 329 E: Exacto, há várias formas, várias razões para discutir…

330 e: Há varias maneiras… o conceito de normalidade, o conceito de equilíbrio, o 331 conceito de norma e tudo isso, são coisas que entram nesta definição e que são às 332 vezes de difícil avaliação, tanto que não há, pode não haver concordância mesmo entre 333 dois clínicos, o que mostra a dificuldade … depois há também questões muito 334 importantes de natureza cultural e há interpretações do mau estar e interpretações do 335 … do que é que é doença, do que é que é mau estar, que variam pela cultura, que são 336 mediados pela cultura e que têm formas de ser pensadas completamente distintas e aí 337 temos depois todo o terreno da denominada etnopsiquiatria, se quiserem … 338 etnopsicologia, que reflecte isso… e há…em muitos países hoje em dia com as 339 emigrações maciças pela Europa há inclusivamente técnicos que se especializam nessa 340 área, porque alguém que vem do Norte de África ou alguém que vem… como agora 341 há tantos casos e de outras regiões do mundo, digamos que a interpretação de 342 determinados fenómenos varia de acordo, com essa… com a sociedade, com a 343 religião, com o sistema de crenças e portanto é preciso cuidado, porque pode-se estar 344 de doença aquilo que é uma … interpretações que são mediados pela culturas, pelos 345 hábitos, pela religião e pelas interpretações da doença. 346 E: Hmm, quanto ao seu papel enquanto médico psiquiatra, qual é especificamente o seu 347 papel no tratamento do doente mental? Queria que me explicasse qual é mesmo o 348 papel do médico psiquiatra no tratamento… 349 e: Eu acho que o papel é compreender em primeiro lugar, compreender… 350 compreender o que é que se passa com o paciente e… e depois tentar ajudá-lo, 351 tentar… tentar de facto tratá-lo… seja … seja por meios farmacológicos quando isso 352 necessite, seja por meios psicológicos e psicoterap êuticos, que em certos casos é 353 indispensável… mas seja ou não seja indispensável, uma atitude psicoterapêutica tem 354 que haver, que é o acolhimento, a atmosfera, a atitude compreensiva… pronto querer 355 compreender o que se passa com o paciente… e isso… essa questão do compreender 356 e do tratar para mim… isto é não é possível tratar sem primeiro tentar compreender 357 o que se passa …contextualizar… e tudo isso. 358 E: Eu agora gostaria de lhe fazer uma pergunta mais por curiosidade, porque ao longo 359 do tempo em que estive aqui estagiar, apercebi-me que devem haver casos que devem 360 marcar muito uma pessoa e gostaria de perguntar ao Dr., que enquanto médico 361 psiquiatra que tem um contacto muito… muito próximo com esta realidade, qual foi 362 por assim dizer o caso que mais o marcou?