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Nesta monografia, fernando távora explora a arquitetura como arte do espaço, abordando as definições históricas e teóricas, as relações entre espaço físico e espaço artístico, e as características específicas da arquitetura que a distinguem de outras artes. O autor, com interesse prévio nas artes visuais, apresenta um estudo especializado que busca entender a essência de arquitetura como arte.
O que você vai aprender
Tipologia: Exercícios
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SOB ORIENTAÇÃO DA PROFESSORA DOUTORA MARIA TERESA PIRES DA FONSECA
Na presente Dissertação de Mestrado, A Arquitetura entre as Artes: Reflexões sobre a Beleza Arquitetónica , propõe-se uma reflexão sobre a definição de Arquitetura enquanto arte e as relações que estabelece com outras artes, em particular com a Escultura e a Pintura. Numa época em que surgem em massa edifícios de exagerada expressão escultórica e es- culturas que conquistam a experiência do espaço, outrora reservada à Arquitetura, qual a verdadeira essência destas artes? O que têm em comum e o que as distingue? Pode a Arqui- tetura tornar-se escultura? Que lições tiramos das esculturas que se exprimem através da caracterização do espaço? Em resposta a estas questões, o conceito de beleza torna-se fulcral na nossa abordagem, reve- lando-se o justo meio de apreciar e criar arquitetura. Assim, é necessário entender a beleza da Arquitetura e a respetiva fenomenologia sobre a qual se exprime.
This master thesis, A Arquitetura entre as Artes: Reflexões sobre a Beleza Arquitetónica^1 , reflects on the concept of Architecture as an art and the kind of relations it establishes with other arts, particularly with Sculpture and Painting. As nowadays there has been emerging a massive quantity buildings with exaggerated sculp- tural expression and, then, sculptures exploring the experience of space and the human body movement, what are the essences of these arts? What do they have in common and what distinguishes them? Can Architecture become true Scultpture? Which lessons can we take from these kind of sculptures? In response to these questions, the concept of beauty becomes central to our approach, being the fairest way in the interpretation and creation of Architecture. This way, it is necessary to understand the architectural beauty and its phenomenology. (^1) Architecture among the Arts: Reflections on the Architectural Beauty
Introdução Parte I - A Arquitetura enquanto Arte
Mosaico 1: Do Século XX à Contemporaneidade - Uma (Con)fusão das Artes?
Motivações «Com a criação da nova Faculdade encerrar-se-á o Curso de Arquitectura da Escola Superior de Belas Artes do Porto. É certamente com saudade que abandonaremos uma Escola que, durante uma longa vida, sempre soube compatibilizar com qualidade o universal e o circunstancial, arte difícil de ser do seu tempo em cada tempo. (…) A “barbárie do especialismo”, cujo pecado, creio, todos reconhecemos, e que já no nosso portuense século XIX separou as artes das ciências – a Academia e a Politécnica – continua a fustigar-nos dividindo agora a “família das belas artes”. (...) Mas, se abandonamos com saudade e com tristeza a antiga e sempre jovem Escola de S. Lázaro, é certamente com grande honra que entramos na insigne Universidade do Porto, da qual V. Ex.ª é magnífico Reitor, reencontrando outros irmãos – os das ciências e os das letras – também de nós até agora separados.»^2 Embora descendente da antiga escola a que Fernando Távora se refere na citação aci- ma apresentada, a minha formação em Arquitetura aconteceu já na FAUP, separada das Belas Artes. Mostrando especial interesse, desde sempre, pelas artes e de anterior percurso académico nas Artes Visuais, ao longo deste curso especializado na arte do espaço, identifi- (^2) Fernando Távora in Universidade do Porto, Faculdade de Arquitectura. (2008). Guia de Estudante da Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto Ano lectivo de 2007-2008. 9-10. Introdução
e Arquitetura, com maior incidência nas referências respeitantes à transição do século XIX para o XX, até à contemporaneidade. Sob a pretensão de definir os conceitos basilares à dis- sertação – de Arquitetura e de Arte – aprofundou-se a investigação sobre algumas referências filosóficas. Destas, destaca-se a obra A Beleza do filósofo contemporâneo Roger Scruton, que se mostrou fundamental na investigação, influenciando fortemente o seu rumo. Na pesquisa bibliográfica, inserem-se ainda as pesquisas feitas sobre cada um dos casos de estudo, que preparariam e complementariam as respetivas interpretações. A investigação prática baseou-se no estudo de doze casos de estudo, entre eles dois exemplos de esculturas e os restantes de arquiteturas, tendo sido todos eles visitados, e sobre os quais se desenvolveu uma análise através dos dados recolhidos sob forma gráfica – foto- grafias, desenhos técnicos e outros relevantes – e escritos – dando preferência às palavras dos autores das obras. Estrutura O trabalho divide-se em duas partes: a primeira, A Arquitetura enquanto Arte , consis- te na exploração teórica da Arquitetura como arte e subdivide-se em quatro capítulos: no primeiro explora-se a definição de arte ; no segundo, reúnem-se as várias categorizações e numerizações da Arquitetura entre as artes, numa tentativa de entender aquilo que tem em comum com as outras artes e, neste sentido, aproximarmo-nos de uma definição; no terceiro abordamos o conceito de arquitetura e, recorrendo unicamente ao livro Architectura in Nuce
- Uma Definição de Arquitectura , de Bruno Zevi, apresenta-se uma compilação de definições de Arquitetura de todos os tempos, cuja organização segue a do autor que, tendo-se baseado em testemunhos de referência de diferentes especialidades e de várias épocas, agrupou-as segundo os cunhos temáticos das diferentes visões; por fim, justificou-se com o desenvolver do trabalho criar um capítulo que abordasse a beleza arquitetónica e algumas das caracterís- ticas que a influenciam, num quarto capítulo. A segunda parte do trabalho, Um Roteiro Urbano: Considerações: Indagações sobre a Hi- bridez Arquitetónica , corresponde à abordagem sistematizada aos casos de estudo e posterior crítica, baseada no desenvolvimento teórico desenvolvido na primeira parte do trabalho. Di- vide-se em três capítulos, sendo, no primeiro, abordadas as doze obras, em que se pretende distinguir as obras híbridas das arquitetónicas puras ou das esculturas puras. No segundo capítulo, é aprofundado o estudo de quatro obras selecionadas do grupo anterior, em que, intercalado com fichas individuais onde sistematizamos as informações concretas sobre a cava traços semelhantes com as artes que havia estudado, em sentidos metodológico, criati- vo e compositivo. Por outro lado, constatava uma crescente referência às Artes Plásticas na expressividade arquitetónica e em conceitos de desenho, na Arquitetura emergente das últi- mas décadas, sendo ainda alguns exemplos criticados, pejorativamente, como sendo “mais Escultura do que Arquitetura”. Posto isto, as indagações eram várias: uma vez que «ocupar um espaço significa transformar a cidade» , sendo por isso qualquer obra de Arquitetura um «testemunho de urbanidade»^3 , que atitude deve ter o arquiteto, de técnico ou de artista? O ar- quiteto tem a mesma liberdade criativa que um artista plástico? Quando passa da liberdade criativa ao mau senso? Quando passa a Arquitetura a ser outra arte? A assistência a algumas conferências e eventos sobre Arquitetura e Arte, ou a visita a exposições de instalações fomentavam estas curiosidades. Mas o fator decisivo da escolha do tema e interesse específico em arquiteturas híbridas e instalações como casos de estudo, foi a minha participação no workshop teórico-prático Make me think Ludwig Wittgenstein , no E.A.S.A. ( European Architecture Students Assembly ) de 2013. Aqui, através da recriação da ins- talação Performance Corridor (1969) de Bruce Nauman, questionavam-se as diferenças entre as instalações praticáveis e a Arquitetura, enquanto artes do espaço. Posto isto, numa transição do mundo académico para o profissional, a elaboração do presente trabalho mostrou-se como uma oportunidade única para uma reflexão fundamen- tada sobre estas questões, onde pretendia maturar a minha visão crítica sobre a Arquitetura e, consequentemente, o meu modo de projetar. Objetivos Os objetivos do presente trabalho passam por: restituir o lugar da Arquitetura entre as artes, muitas vezes subjugada à técnica construtiva e ao domínio da ciência e da matemática, portanto, destituída da Arte; investigar as suas especificidades e aquilo que a define enquan- to arte; encontrar afinidades com outras artes, em particular a Pintura e a Escultura; indagar a legitimidade da referência às outras artes no desenho da Arquitetura. Metodologia Os métodos de trabalho incidiram na revisão de literatura e no estudo experimental de obras de Arquitetura e Escultura. As leituras teóricas basearam-se no estudo sobre Arte (^3) SIZA, Álvaro. (2009). 01 Textos. Porto: Civilização. 341.
Distinguimos para o conceito de arte três significados: o que diz respeito a toda e qual- quer habilidade, o que produz apetrechos e o que cria uma obra de Arte. Uma vez que explo- ramos a Arquitetura enquanto arte, cuja atividade produz objetos, interessa-nos identificá-la como a produção de um mero apetrecho ou de uma obra de Arte. O que distingue a obra de Arte do apetrecho é o facto de a primeira instalar um mundo através da obra – constituído pelo artista, pela sua arte, pela sua visão do mundo que culminam na criação do objeto – en- quanto a essência do segundo repousa na sua serventia. O estudo incidiu, num momento primário, sobre dicionários etimológicos, da Língua Portuguesa e específicos de Arte, Arquitetura e Filosofia, para além de livros de História da Arte e Enciclopédias. Procurando entender a essência da Arte, estudámos duas obras de estética de dois ilustres filósofos: do século XX, A Origem da Obra de Arte , de Martin Heideg- ger, e a Beleza do contemporâneo Roger Scruton. Do último autor, destacou-se ainda o artigo How Do We Know Real Art When We See It? que se tornou fundamental na nossa abordagem. Por fim, mostrou-se pertinente apresentarmos o testemunho de um dos autores dos casos de estudo do trabalho, fechando um ciclo de diferentes abordagens à questão: a linguística, a historiográfica, a filosófica e a artística. Os dicionários consultados apresentam já os três significados referidos e que serão reforçados na abordagem filosófica. Os dicionários etimológicos apresentam o conceito como originário do latim arte , significando «talento, saber, habilidade, arte (em sentidos geral e moral);
PARTE I - A Arquitetura enquanto Arte
para além de uma função directa, possuem uma intencionalidade que os leva a fruir esteticamente»^14. Acrescenta-se que supõem «uma ligação profunda com a Vida, quer individual, quer social, e defi- ne-se em perpectivas sobre essa Vida, conferindo-lhe valorações»^15. Os livros e enciclopédias de História da Arte referem-se exclusivamente ao terceiro significado de Arte e começam o seu discurso por admitir a dificuldade de distinguir o que é Arte do que não é, sendo uma das «poucas perguntas [que] provocarão polémica mais acesa e tão poucas respostas satisfatórias».^16 No entanto, Arte «pode definir-se como a capacidade que o Homem possui de produzir objectos ou realizar acções com as quais – cumprindo ou não finalidades úteis – ele possa expressar ideias, sentimentos ou emoções ‘estéticas’, isto é, susceptíveis de produzir prazer es- tético^17 » , aparecendo «como uma necessidade vital para o Homem, (…) não uma (…) do corpo, mas sim (…) do espírito.»^18 Acrescentam ainda, unanimemente, duas questões: primeiro, que as obras de arte são «mensagens ricas de significado(s)» , sendo o artista o emissor e o público o seu recetor. Independentemente do significado e da forma do objeto, ou da intenção do artista, uma vez materializada, «cada obra de arte adquire vida própria, vale por si mesma» e pode ser «interpretada e sentida diferentemente, de acordo com a personalidade, a formação e o contexto cultural e histórico de quem a aprecia»^19_._ Esta particularidade acentua o carácter subjetivo e relativo da atividade artística, sendo o juízo de valor e o gosto pessoal de cada um admitidos como o primeiro e último juiz do valor e significado da obra de arte. A segunda questão recorrente é a definição de critérios de avaliação da Arte, que passam, para além do domínio técnico e formal, pela imaginação, sensibilidade, criatividade, originalidade e autenticidade presentes na mesma. Martin Heidegger, em A Origem da Obra de Arte , na procura da essência da obra de arte, começa por distingui-la do apetrecho. Assim, a essência do apetrecho, que revela alguma afi- nidade com a obra de arte, na medida em que é algo fabricado pela mão do homem, repousa, no entanto, na sua serventia. Por sua vez, o que distingue a obra de arte do apetrecho é o facto de esta instalar um mundo, sendo «a essência da arte, na qual repousam simultaneamente a (^14) TEIXEIRA, Luís Manuel. (1985). Dicionário Ilustrado de Belas-Artes. Lisboa: Presença. 30. (^15) RODRIGUES, (1990): 46. (^16) Fundação Calouste Gulbenkian. (2005). História da Arte. Lisboa. 9. (^17) Estético tem aqui um significado de belo e do prazer que produz naquele que o contempla. (^18) PINTO, Ana Lídia, MEIRELES, Fernanda, CAMBOTAS, Manuela Cernadas. (2006) História da Arte Ocidental e Portuguesa, Das Origens ao Final do Século XX. Porto: Porto Editora. 4-8. (^19) Idem: ibidem. aquilo em que se aplica talento; profissão, mister; arte, ciência; conhecimentos técnicos, teoria, corpo de doutrinas, sistema, arte»^4_._ Os da Língua Portuguesa apresentam essencialmente o significado originário da pa- lavra, raramente explicitando o relativo à obra de Arte que, quando presente, aparece asso- ciado a expressões como as artes ou Belas Artes. Este sentido é mais facilmente encontrado em palavras derivadas, como artista ou artístico. Por vezes, assiste-se a um significado intermé- dio, referente à produção manual de objetos. Assim, podemos admitir o primeiro significado como um conjunto de «conhecimentos mais ou menos rigorosos, destinados à aplicação prática, por oposição à ciência, enquanto conjunto de conhecimentos teóricos, puros; técnica geralmente aplicada com engenho, perícia, seguindo determinadas regras = TÉCNICA. A arte da versificação. A arte da gramática. A arte equestre»^5 ou «arte militar, por exemplo»^6 , resumindo-se arte , portanto, a um «ofício; profissão; modo; forma; habilidade; talento; dom; astúcia»^7. Um segundo significado dirá respeito a toda a « actividade que acrescenta algo à natureza (ponte: obra de arte)»^8 , correspon- dendo ao significado de artista o de «obreiro, artífice, operário»^9. Por último, Arte significa também « actividade de produção de coisas belas»^10 sendo o significado de artista aquele «que tem ou exprime sentimentos de arte; que ama ou cultiva a arte; (…) aquele que cultiva as belas-artes»^11. Os dicionários específicos de Arte, Arquitetura e Filosofia, partindo do significa- do original, considerado «antigo e em desuso»^12 , aprofundam o último. Assim, «no início da aplicação do termo, ‘ars’ reduz-se apenas ao conjunto de processos e, neste sentido, usam-se as expres- sões ‘artes mecânicas’ e ‘artes de engenharia’, formas de utilização envelhecidas»^13 , enquanto «no sentido actual, arte define o conjunto de objectos criados pelo ser humano com perfeita destreza e que, (^4) MACHADO, José Pedro. (1989). Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, com a mais antiga docu- mentação escrita e conhecida de muitos dos vocábulos estudados. Lisboa: Livros Horizonte. 323. (^5) Academia das Ciências de Lisboa. (2001). Dicionário da Língua Portuguesa Contemporânea da Academia das Ciências de Lisboa. Lisboa: Editorial Verbo. 366. (^6) COSTA, J. Almeida; MELO, A. Sampaio. (1992). Dicionário da Língua Portuguesa. Porto: Porto Editora. 160. (^7) Idem: ibidem. (^8) Idem: ibidem. (^9) SILVA, António de Morais. (1980). Novo Dicionário compacto da Língua Portuguesa. Lisboa: Horizon- te. 270. (^10) COSTA, MELO, (1992): 160. (^11) SILVA, (1980): 270. (^12) LEGRAND, Gérard. (2002). Dicionário de Filosofia. Lisboa: Edições 70. 48. (^13) RODRIGUES, Maria João Madeira; SOUSA, Pedro Fialho de; BONIFÁCIO, Horácio Manuel Perei- ra;. (1990). Vocabulário Técnico e Crítico de Arquitectura. Coimbra: Quimera. 46.
pletion and thereby restore the moral equilibrium. The tragic hero is completed through his fate. His death is a sacrifice, and this sacrifice renews the world.» Neste sentido, não é por acaso que as mais belas obras do modernismo, marcado pela descrença, pelo ceticismo e pela desilusão, sejam as que emergiram em reação ao ódio e à crueldade^43. Tais trabalhos acenderam uma luz na escuridão totalitarista e mostraram huma- nidade no meio da destruição. «Modernism arose because artists, writers and musicians held on to the vision of beauty as a redemptive presence in our lives. And that is the difference between the real work of art and the fake. Real art is a work of love. Fake art is a work of deception.» Por fim, numa conversa com Augusto Seabra e Eduardo Souto Moura, registada no livro Pedro Cabrita Reis – Colecções Privadas , o artista contemporâneo português relaciona o seu entendimento do mundo e o seu olhar sobre ele em relação à obra, enquanto artista, enquanto criador. Indo de encontro aos pontos abordados anteriormente, complementa-os, numa perspetiva própria, com a caracterização do ato criativo: «Um artista ante a sua obra é por um breve instante o mundo, o mundo todo tal como o entendemos e mais aquilo que desejaríamos poder acrescentar-lhe e assim atingir a perfeição. Tudo isso estará na obra de arte ‘per se’ e nela eu desapareço. Nesse aspecto, eu não posso fazer nem ser aquilo que não sou, isto é, eu só posso ser esta totalidade, este desejo de absoluto, e é isso que define a arte como actividade. Portanto a minha pose é a minha arte, a minha arte e a minha pose sou eu e nós os três somos o mundo. Não há nada fora disto.»^44 Sintetizando, dos três significados assumidos desde o início do capítulo, interessa-nos o terceiro, o relativo à Arte, que produz o belo. Não obstante, os três têm algo em comum: dizem respeito a uma forma do saber baseada na habilidade e intuição, e não estritamente na lei, na regra. O belo é o resplandecer disposto na obra, é o modo como o significado nela intrínseco é sentido pelo observador. Não é o objeto em si, mas o significado que dele brota e que pro- curamos intuitivamente. Arte é poesia, é alegoria, símbolo, e obriga a livrarmo-nos do nosso próprio sistema de hábitos para a entendermos. Distinguida da falsa arte – de tão superficial criação como de (^43) Ao contrário de obras puramente provocatórias, no seguimento d’ A Fonte de Marcel Duchamp. (^44) Palácio da Galeria, Museu de Tavira. (2008). Pedro Cabrita Reis - Coleções Privadas. Tavira. 24. senta como valor essencial a beleza : «Kitsh is a means to cheap emotion. Beauty is an end in itself. (…) We reach beauty through setting our interests aside and letting the world dawn us. There are many ways of doing this, but art is undeniably the most important, since it presents us with the image of human life – our own life and all that life means to us – and asks us to look on it directly, not for what we can take from it but for what we can give to it. Through beauty, art cleans the world of our self-obsession». Admitindo a beleza como indispensável nas nossas vidas^40 , é sugerido o segundo pon- to: a forma. A obra de arte não é bela no mesmo sentido que um animal, uma flor ou uma pai- sagem campestre são belos. É algo criado conscientemente, em que a necessidade humana pela forma triunfa sobre a aleatoriedade dos objetos. A obra de arte apresenta-se-nos como um refúgio dos sentidos, das emoções e da moral no nosso quotidiano: «Our lives are fragmented and distracted – things start up in our feelings without finding their completion. Very little is revealed to us in such a way that its significance can be fully understood. In art, however, we create a realm of the imagination, in which each beginning finds its end, and each fragment is part of a meaningful whole». No entanto, a verdadeira arte requer mestria formal, que só é alcançada com conheci- mento, disciplina e atenção ao detalhe.^41 Por fim, e no seguimento do alcance da perfeição formal, o último ponto é a redenção. Segundo Scruton, na arte, a beleza é uma qualidade alcançada com trabalho árduo, grande esforço de estudo e atenção ao detalhe, que se obser- vam nas obras de arte intemporais. É uma tarefa dura – tão mais quanto a ignorância à nossa volta – mas de valor e, por isso, de redenção.^42 Reforçando o seu ponto de vista, faz uma comparação ao sofrimento trágico: «In a way that will always be mysterious, they [tragedies] endow suffering with a formal com- (^40) «Our human need for beauty is not something that we could lack and still be fulfilled as people. It is a need arising from our moral nature.» (^41) «Gone are the days when you can make a stir by wrapping a building in polystyrene like Christo or sitting in silence at a piano for four minutes and 33 seconds like John Cage. To be really modern, you must create works of art that take modern life, in all its disconnectedness, and bring it to fullness and resolution (…). It is fine for a composer to lard his pieces with dissonant sounds and cluster chords (…) but if he knows nothing of harmony and counterpoint the result will be random noise, not music. It is fine for a painter to splash paint around (…) but the real knowledge of colour comes through studying the natural world, and finding our own emotions mirrored in the secret tints of things (…)». (^42) «Suffering is not the pointless thing that it so often appears to be, but the necessary part of a larger and redeeming whole.»
perceção – a verdadeira arte é resultante da redenção que combina todo o conhecimento e a preciosidade investidos no objeto artístico com a beleza do significado que brota. É resultado de grande mestria, sendo, aliás, tida desde a Antiguidade Clássica como um modo do saber. É resultado de genuinidade, sinceridade, amor, de valores morais. Implica ainda um criador e um recetor e, por isso, a obra de arte pode ser entendida como um contentor de significados. É, no entanto, necessário fazer-se uma ressalva a esta ideia: o objetivo da obra de arte não é transmitir uma mensagem^45. Apesar de tentarmos ex- plicar o significado que lhe é intrínseco, nada o faz com a mesma intensidade que a própria obra, que é «o veículo insubstituível do seu conteúdo»^46. A leitura da obra de arte é sensorial e, por isso, subjetiva. E o seu objetivo último, o belo. (^45) «Uma obra de arte que se preocupa mais em transmitir uma mensagem do que em comprazer o seu auditório é certamente defeituosa.» (SCRUTON, 2009: 119) (^46) SCRUTON, (2009): 105.
imagem); décima, os Videojogos (sendo que alguns jogos integram elementos de todas as ar- tes mencionadas na lista); décima-primeira, a Arte Digital (artes gráficas computadorizadas 2D, 3D e programação).^51 Este método de numeração através das formas de linguagem não se mostra totalmente eficaz, uma vez que estas aparecem repetidas com o surgir de novas artes que combinam diferentes meios. Aliás, adivinha-se uma tendência para a divisão das artes por categorias (a partir das formas de linguagem, neste caso), uma vez que há artes colocadas paralelamente na mesma posição. Neste sentido, demonstra-se mais razoável admitir uma categorização. Com o desenvolvimento de novas técnicas, meios de expressão e o consequente sur- gimento de variadas novas formas de arte, justificou-se aumentar o leque de categorias para localizar todas as Artes. Cada categoria dirá respeito a um conjunto de Artes que partilham determinadas características entre si, como o tipo de suporte em que se exprimem, os meios e materiais utilizados e os principais sentidos com que são percecionadas. Não há, no entanto, uma categorização determinante e universal, verificando-se variações consoante diferentes fontes, cujos fatores utilizados para distinguir cada grupo geram ainda discussão. Salvaguardando a possibilidade de não apresentarmos todas as categorias existentes, expõe-se um conjunto que tenta abranger a maior variedade possível de formas de arte, nas categorias mais recorrentes. Assim, de um modo geral, as várias artes podem ser distribuí- das pelas Belas Artes , Artes Visuais , Artes Plásticas , Artes Decorativas , Artes Performativas , Artes Literárias , Artes Aplicadas e Gastronomia.^52 No contexto do presente trabalho, interessa-nos (^51) NUMERAÇÃO DAS ARTES. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Flórida: Wikimedia Founda- tion, 2015. Disponível em: <https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Numera%C3%A7%C3%A3o_ das_artes&oldid=42487118>. Acesso em: 29 jul. 2015. (^52) Com base nos conteúdos dos seguintes artigos: DEFINITION OF ART. In: ENCYCLOPEDIA OF ART. 2015. Disponível em <http://www.visual-arts- -cork.com/art-definition.htm#classification>. Acesso em: 29 jul. 2015. THE ARTS. In: WIKIPÉDIA, The Free Encyclopedia. Flórida: Wikimedia Foundation, 2015. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Arte&oldid=42870943. Acesso em: 29 jul. 2015. A categoria das Belas Artes inclui as obras de arte criadas puramente por motivos estéticos ( arte pela arte ), mais do que para fins comerciais ou funcionais. Marcadas pelas suas qualidades de inspiração e elevação da vida humana, coincidem com as tradicionais “Artes Maiores” ocidentais, como o Desenho, a Pintura, Gravura e Escultura. As Artes Visuais incluem todas as Belas Artes assim como os novos meios e formas de expressão con- temporâneos, como a Assemblage , a Collage , a Arte Concetual, a Instalação e a Performance, assim como a Fotografia, Filmografia, ou qualquer combinação das formas mencionadas. A estas, acrescenta-se a Environmental Land Art , geralmente de escala monumental. As Artes Plásticas abrangem obras tridimensionais que empregam materiais modeláveis que, tirando Terpsichore, a Dança; Thalia, a Comédia; Urania, a Astronomia.^47 Na Idade Média, as Artes dividiam-se entre as Liberais e as Mecânicas. As Artes Li- berais repartiam-se ainda em dois grupos: o Trivium , que incluía a Gramática, a Retórica e a Dialética, e o Quadrivium , que atendia à Aritmética, Geometria, Astronomia e Música. As Ar- tes Liberais eram consideradas as disciplinas próprias para a formação de um homem livre, desligadas de qualquer preocupação profissional, mundana ou utilitária, contrapondo-se às Artes Mecânicas que seriam disciplinas que não incidiam diretamente em interesses imate- riais, metafísicos e filosóficos, mas estritamente técnicos, direcionados à produção de utili- dades que serviriam as necessidades do quotidiano. Eram as Artes Mecânicas a Arquitetura, a Escultura, a Pintura e a Joalharia. 48 No Renascimento, aproximando-se do pensamento intelectual, científico e filosófico, algumas destas artes foram elevadas a Belas Artes , como a Arquitetura, a Escultura, a Pintu- ra, a Gravura e o Desenho.^49 No século XVIII, Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831), no seu estudo de filoso- fia da arte, distinguiu seis artes na seguinte ordem: Arquitetura, Escultura, Pintura, Música, Dança e Poesia.^50 A Sétima Arte é uma expressão proposta em 1912, por Ricciotto Canudo (1877-1923) para se referir ao Cinema. Desde a segunda metade do século XX, foram ainda adicionadas à numeração das Artes a Fotografia e a Banda Desenhada e atualmente são ti- das em conta nesta lista habilidades como a criação de Videojogos, a Arte Digital e a Arte Culinária. A numeração das Artes não tem, no entanto, uma ordem universal, sendo a mais consensual a que, distinguindo os elementos básicos de linguagem de cada arte, toma como primeira arte a Música (som); as segundas, a Dança e a Coreografia (movimento); terceira, a Pintura (cor); quartas, a Escultura e a Arquitetura (volume); quinta, o Teatro (representação); sexta, a Literatura (palavra); sétima, o Cinema (integra os elementos das artes anteriores, da oitava e da nona); oitava, a Fotografia (imagem); nona, a Banda Desenhada (cor, palavra, (^47) MUSA. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Flórida: Wikimedia Foundation, 2015. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Musa&oldid=42316639. Acesso em: 29 jul. 2015. (^48) ARTES LIBERAIS. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Flórida: Wikimedia Foundation, 2015. Dis- ponível em: https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Artes_liberais&oldid=42407850. Acesso em: 29 jul. 2015. (^49) ARTE. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Flórida: Wikimedia Foundation, 2015. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Arte&oldid=42870943. Acesso em: 29 jul. 2015. (^50) Na sua Estética , estabelecia distinções essenciais segundo a cristalização da Ideia em grandes for- mas: a arte simbólica, clássica e romântica. A Arquitetura é a arte simbólica por excelência, a escultura a clássica, e a pintura, a música e a poesia são as artes românticas. (BAYER, Raymond. (1979). História da Estética. Lisboa: Editorial Estampa. 310.)
que explora a expressividade bidimensional, a Escultura a tridimensional envolvendo, por vezes, a dimensão do tempo e do movimento do corpo no espaço, aproximando-se, assim, da Arquitetura que, sendo a arte de organizar o espaço, trabalha também com as mesmas quatro dimensões. Numa categorização mais recente, a Arquitetura terá sido inserida nas Artes Aplica- das ou Funcionais , entre várias vertentes do Design, afastando-se das Belas Artes. Isto acon- tece porque, como o próprio nome indica, estas artes respondem a determinadas funções do quotidiano, que as afasta da arte pela arte , inútil, como associamos às Belas Artes. A Arquitetura, quando considerada arte mecânica, juntamente com a Escultura, a Pin- tura e a Joalharia, é associada à produção de objetos, algo acrescentado à Natureza, iden- tificando-se com o segundo significado apresentado no capítulo anterior. Quando tomada como bela arte, é-lhe associado o pensamento intelectual, passando de um mero objeto a algo a que se associa significado. Foi neste sentido que Hegel a colocou em primeiro lugar da sua lista, sendo, por excelência, a arte simbólica. Com o desenvolver de novas expressões artísti- cas e de, consequentemente, novas categorias artísticas, terá sido colocada nas Artes Plásticas e nas Artes Visuais, devido a razões físicas, sendo elas os meios de expressão e de perceção que utiliza. Por fim, terá sido considerada como Arte Aplicada ou Funcional, pela utilidade que, enquanto serviço, lhe é inerente. Quando fazemos a distinção entre as Belas Artes e as Artes Funcionais, corremos o ris- co de afirmar que as últimas «criam objetos úteis usando princípios estéticos no seu desenho» , em contrapartida às Belas Artes, que «providenciam a estimulação intelectual do observador»^54. No entanto, a primeira consideração não anula a segunda: a Arquitetura, sendo funcional por especificidade, providencia utilidade e usa princípios estéticos no seu desenho, mas também por ser arte, oferece estimulação intelectual e emocional ao observador. Ser funcional não significa que a função seja o fim único, ou o principal. Aliás, constataremos que Arquitetura só é Arquitetura quando, correspondendo à sua função, é poética e dá significado ao espaço que organiza e que será habitado. Veremos que, mais do que cumprir uma função, a Arqui- tetura tem como fim principal ser bela. por trabalhar também com a plasticidade dos materiais e, apesar de admitirmos que a sua aplicação é bidimensional, a superfície em que é aplicada é sempre tridimensional (todo e qualquer suporte da Pintura tem altura, largura e espessura), assim como os materiais sobre ela aplicados – podendo o ar- tista salientar esse aspeto ou não. (^54) DEFINITION OF ART. In: ENCYCLOPEDIA OF ART. 2015. Disponível em: <http://www.visual- -arts-cork.com/art-definition.htm#classification>. Acesso em: 29 jul. 2015. destacar as Belas Artes, as Artes Visuais, as Artes Plásticas e as Artes Aplicadas, categorias nas quais a arquitetura é inserida, segundo diferentes fontes. Como constatado, após ter sido considerada uma das Artes Mecânicas, que se limita- vam à criação técnica de objetos utilitários para as necessidades do quotidiano, a Arquitetu- ra, em conjunto com a Escultura, a Pintura e a Gravura, passaria a agrupar-se nas Belas Artes